O país sem exportação de armas, atire a primeira pedra!



Nova York - Um tratado da Organização das Nações Unidas (ONU) para regular o multibilionário comércio mundial de armas terá que esperar depois que os Estados membros não conseguiram chegar a um acordo. Na sexta-feira, os Estados Unidos anunciaram que precisariam de mais tempo para avaliar o acordo proposto. Posteriormente, Rússia e China também pediram um prazo maior.
"Isso foi uma covardia impressionante do governo de Obama, que no último minuto deu uma reviravolta e vetou o progresso em direção a um tratado global de armas, logo quando estava na reta final", declarou Suzanne Nossel, diretora-executiva da Amnesty International USA. "É uma incrível abdicação de liderança pelo maior exportador de armas convencionais do mundo para encerrar as negociações logo quando estavam perto de um avanço histórico."
Falando na condição de anonimato devido à sensibilidade do assunto, um diplomata ocidental também culpou os Estados Unidos, alegando que "arruinaram o processo." De acordo com a fonte, é pouco provável que as negociações sejam retomadas até as eleições presidenciais de novembro. O negociador-chefe dos EUA, Thomas Countryman, se recusou a falar com várias dezenas de repórteres sobre a questão. A porta-voz do Departamento de Estado, Victoria Nuland, disse em um comunicado divulgado na noite de ontem que o país apoia uma segunda rodada de negociações no próximo ano. As informações são da Associated Press. (Equipe AE)
Dado que os países com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas (EUA, China, Rússia, Reino Unido, França) são precisamente os maiores exportadores de armamento, não surpreende que os maiores movimentos de oposição a um tratado se desenvolvam dentro dessas nações, apesar dos respectivos governos apoiarem a convenção.

Nos EUA, e com o apoio do poderoso lóbi das armas, um grupo de 51 senadores republicanos e democratas enviou na quinta-feira uma carta ao Presidente Barack Obama e à secretária de Estado Hillary Clinton a sublinhar a sua oposição a um tratado internacional que ponha em causa a constituição federal. Em causa está a segunda emenda constitucional, que consagra o direito à posse e uso de armas e que tem sido utilizada como base legal para o livre comércio de armas nos EUA.
A missiva visa sobretudo mobilizar o eleitorado norte-americano contra o tratado, já que não existe qualquer ameaça à constituição – nenhum tratado internacional se sobrepõe à lei dos Estados Unidos.
A polémica da posse de armas voltou ao debate público norte-americano após a tragédia de Aurora, no Colorado, onde um homem armado matou 12 pessoas que assistiam num cinema à estreia do novo filme da saga Batman.
Os EUA são o país do mundo industrializado onde é mais fácil adquirir uma arma. É ainda o país com o maior número de armas por habitante em todo o mundo (88 por cada 100 habitantes), à frente de nações fortemente militarizadas ou com historial de conflitos armados como a Sérvia e o Iémen.
A três meses das eleições presidenciais de Novembro, o recandidato democrata Obama e o rival republicano Mitt Romney evitam o tema do comércio e posse de armas, considerado um assunto tóxico perante a oposição de uma fatia significativa do eleitorado e de importantes financiadores das respectivas campanhas.
Há quatro anos, durante a corrida à Casa Branca, Obama prometeu reinstituir uma moratória sobre o comércio de armas semi-automáticas, expirada em 2004. Nada foi feito nesse sentido e a promessa está ausente da campanha de 2012.

Comércio bilionário

Segundo a Amnistia Internacional, os Estados Unidos produzem 34% das armas comercializadas em todo o mundo e são os seus maiores exportadores, seguidos da Rússia, Alemanha, Reino Unido, China e França.
Entre 1989 e 2010, entre 886.000 e 1.253.000 pessoas morreram em 523 conflitos armados. No mesmo período, até 1.200.000 pessoas morreram vítimas de repressão por parte dos seus estados e forças armadas. Mais de 40 milhões de civis tiveram de deixar as suas casas devido a conflitos armados.
Sobre Portugal, a AI indica a existência de 2,6 milhões de armas de fogo, das quais apenas 54% são legais. 87% dos roubos cometidos nos anos de 2006 e 2007 foram perpetrados com recurso a revólveres ou caçadeiras. As armas de fogo são utilizadas em cerca de um terço dos homicídios registados anualmente.
[pedro.guerreiro@sol.pt]

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