Simpósio de Missiologia debate monopólio da revelação de Deus



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Por Jaime C. Patias   
27 / Fev / 2014 15:27
“A revelação é um mistério de Deus mal explicado”, afirma Paulo Suess ao debater sobre os perigos do monopólio sobre a revelação por certos grupos, igrejas e elites. A discussão fez parte dos debates na manhã desta quinta-feira, 27, durante o 3º Simpósio de Missiologia, que acontece em Brasília (DF) desde o último dia 24.
Paulo Suess é doutor em teologia, professor de pós-graduação no Instituto São Paulo de Estudos Superiores (Itesp). O teólogo que é também assessor do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), avalia que, “a Igreja católica, em suas definições tradicionais, tem certa dificuldade com oreconhecimento da revelação em religiões não cristãs. Ela reserva o conceito de revelação para o conteúdo de seu livro sagrado, a Bíblia”. Suess argumenta que, para os que vivem às margens socioculturais das nossas sociedades, a palavra de Deus pode ser um instrumento de defesa de seu projeto de vida. O missiólogo evidencia o projeto de vida dos pobres-outros em dois eixos: “a redistribuição dos bens e o reconhecimento da alteridade”.
Em sua opinião, pobreza e alteridade nem sempre coincidem. “Os judeus, no regime nazista da Alemanha, os povos Yanomami de Roraima, os ciganos do Paraná e os homossexuais de Uganda não são nem eram necessariamente pobres. Mesmo assim, a ética cristã os defende aquém e além do projeto de vida dos pobres. Também em seus projetos de vida Deus se revela, em palavras e sinais”, explica e argumenta que, para os cristãos seria difícil defender pessoas que são sujeitos desses projetos de vida sem considerar o “projeto de Deus”.
Seguindo esse fio condutor, Suess questiona o monopólio salvífico da revelação por parte da Igreja católica. Precisamos “reconhecer a voz de Deus nas tradições orais ou escritas da humanidade. A doutrina da revelação integralmente contida na Bíblia reduz a universalidade da palavra de Deus à tradição judeu-cristã e nega a possibilidade da revelação partilhada com todos os povos”, destacou para, em seguida, perguntar: “como podemos nos livrar dessa redução com inspirações da própria Bíblia e da reflexão pós-conciliar?”
Ao ponderar sobre essa questão, Suess observou que, “os pobres-outros e com eles a humanidade toda não são somente destinatários da salvação universal em Jesus Cristo, mas são também portadores universais da revelação de Deus. Esse reconhecimento não é algo exterior à normatividade do cristianismo, mas é inerente à dinâmica do Evangelho”.
O assessor observou ainda que, as diferentes revelações e sistematizações têm na Igreja um lugar de discernimento e de objetivação consensual. “Essa postura se pronuncia sobre o valor salvífico ou não de outros caminhos e, necessariamente, se abre para o horizonte escatológico onde as múltiplas experiências de Deus se concentrarão numa definitiva revelação de Deus, sem mediações institucionais de religiões, crenças ou igrejas”.
As intervenções dos participantes no Simpósio evidenciaram várias dificuldades na tarefa de desconstruir um modelo exclusivista de entender a revelação de Deus. O sentimento geral é de criar coragem para avançar. Ao contribuir com o debate, Suess recordou que, “para Jesus de Nazaré, a revelação está na inusitada compreensão da loucura de Deus como verdadeira sabedoria. Toda a sabedoria de Deus, porém, e sua revelação como Reino de Deus no meio de nós tem um horizonte escatológico”. Além disso, “os destinatários da palavra de Deus e a escolha dos protagonistas de seu projeto revelam a finalidade e mostram a mediação desse projeto. Jesus escolheu os pequenos-outros como protagonistas de seu projeto, todos aqueles que vêm da grande tribulação. Sua dor é real e nunca simulação ideológica. Seu mundo, por não ser ideológico é pata todos”, arrematou.
Na sequência, o pastor metodista boliviano, Carlos Intipampa, professor no Instituto Superior Ecumênico Andino de Teologia (ISEAT), em La Paz, apresentou a perspectiva indígena de fazer teologia. O mexicano Juan Manuel Quintanar, coordenador do Centro Nacional de Missões Indígenas (CENAMI), na cidade do México, falou sobre a Palavra de Deus e a Palavra dos "outros" (alteridade).
Leia também:

Do monopólio da revelação




Para o que vivem nas margens socioculturais das nossas sociedades, a palavra de Deus pode ser um instrumento de defesa de seu projeto de vida. A Igreja católica, em suas definições tradicionais, tem certa dificuldade com o reconhecimento da revelação em religiões não cristãs. Ela reserva o conceito de “revelação” para o conteúdo de seu livro sagrado, a Bíblia. 
O projeto de vida dos pobres-outros tem dois eixos: a redistribuição dos bens e o reconhecimento da alteridade. Pobreza e alteridade nem sempre coincidem. Os judeus, no regime nazista da Alemanha, os Yanomami de Roraima, os ciganos do Paraná e os homossexuais de Uganda não são nem eram necessariamente pobres. Mesmo assim, a ética cristã os defende aquém e além do projeto de vida dos pobres. Também em seus projetos de vida Deus se revela, em palavras e sinais. Para os cristãos seria difícil defender as pessoas, que são sujeitos desses projetos de vida, na base de uma mera tolerância civil, sem esse pano de fundo de um “projeto de Deus”, ou na contramão desse projeto ou simplesmente sem poder positivamente assumir esse projeto.
Seguindo esse fio condutor 

chegamos ao questionamento do monopólio salvífico e à pergunta: Como caminhar do monopólio da revelação na Igreja católica ao reconhecimento da voz de Deus nas tradições orais ou escritas da humanidade. A doutrina da revelação integralmente contida na “Bíblia” reduz a universalidade da palavra de Deus à tradição judeu-cristã e nega a possibilidade da revelação partilhada com todos os povos.

Como podemo-nos livrar dessa redução com inspirações da própria Bíblia e da reflexão pós-conciliar?

A resposta aponta para a seguinte afirmação:
Os pobres-outros e com eles a humanidade toda não são somente destinatários da salvação universal em Jesus Cristo, mas são também portadores universais da revelação de Deus. Esse reconhecimento não é algo exterior à normatividade do cristianismo, portanto, uma medida estratégica ou tática para defender a causa dos pobres-outros, mas é inerente à dinâmica do Evangelho.

No cristianismo, a questão sociocultural está estreitamente vinculada à questão da ortodoxia, e pecado significa indiferença diante da exploração e do desprezo do pobre-outro.

Para melhor configurar essa articulação entre os crucificados na história, “tocando a carne sofredora de Cristo no povo” (EG 24), e os imperativos éticos do Evangelho que visam contextualizar redenção universal, paz, misericórdia e justiça como eixos fundantes, o rumo desse texto aponta para um processo histórico que vai das revelações à revelação (e vice-versa), que para os cristãos encontra seu reflexo sistematizado nos escritos do Novo Testamento. Essa revelação no plural dos escritos bíblicos foi novamente sistematizada nos tratados da Teologia Fundamental que se confrontam com múltiplas revelações historicamente em curso, codificadas em outras chaves culturais e religiosas em livros sagrados ou tradições orais.

As diferentes revelações e sistematizações têm na Igreja um lugar de discernimento e de objetivação consensual que se pronuncia sobre o valor salvífico ou não de outros caminhos e, necessariamente, se abre para o horizonte escatológico onde as múltiplas experiências de Deus se concentrarão numa definitiva revelação de Deus, sem mediações institucionais de religiões, crenças ou igrejas.


[Introdução da palestra de Paulo Suess proferida no 3º Simpósio de Missiologia, Brasília, 27.02.2014]

Simpósio de Missiologia debate leitura da Bíblia na prática da Missão



Por Jaime C. Patias

“A leitura bíblica deve começar do chão das maiorias oprimidas”, afirmou a pastora metodista, Nancy Cardoso Pereira, ao abrir as reflexões no 3º Simpósio de Missiologia, que acontece ao longo desta semana em Brasília (DF). Promovido pelo Centro Cultural Missionário (CCM) e a Rede Ecumênica Latino Americana de Missiólogos e Missiólogas (RELAMI), o evento reúne 50 pessoas entre, docentes, teólogos, pesquisadores, representantes de instituições missionárias, agentes de pastoral e animadores missionários, de todo o Brasil e convidados da Bolívia e do México. Os estudos se concentram no tema: “Palavra de Deus e Missão: identidade, alteridade e universalidade na Bíblia”.

Nancy Cardoso é doutora em Ciências da Religião e membro da equipe de reflexão do Centro de Estudos Bíblicos (CEBI), grupo que em suas investigações toma como base a realidade, a bíblia e a comunidade. “O biblista popular deve começar sua reflexão, a partir das desconfianças do povo. A missão deve ser alimentada pela leitura e pela crítica popular. Desta crítica e autocrítica, nasce a espiritualidade, as ações políticas e a missão”, destacou a pastora. “Quem estuda Bíblia deve se expor às contradições da realidade, ler a Palavra e ter uma vivência na comunidade”, completou. A questão em debate é como utilizar a Bíblia na prática da Missão.

Recorrendo textos bíblicos, Nancy procurou demonstrar como ler a Bíblia na missão. “É uma leitura de espiritualidade e produção de projetos”, disse. [...] Nos estudos, “não dá para começar da Bíblia em si ou da história da Igreja, mas da realidade que pisamos na missão”, alertou a biblista que é agente da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e há anos circula em acampamentos de Sem Terras.

Em sua opinião, os comentários oficiais alemães “escondem os pés, pois agindo com imparcialidade não dizem de onde partem. A universalidade não pode o ser ponto de partida, mas sim o chão da comunidade onde vivemos, as perguntas dos camponeses, o movimento das mulheres, os oprimidos que também pensam e fazem teologia”, finalizou.

Pastora Nancy atua também, no Programa de Acompanhamento Ecumênico na Palestina e em Israel (EAPPI) que leva pessoas do mundo todo à Cisjordânia para experimentar a vida sob a ocupação. Os acompanhantes ecumênicos fornecem proteção para as comunidades vulneráveis, monitoram abusos dos direitos humanos e incentivam palestinos e israelenses a trabalharem juntos pela paz.

A esperança profética

Numa segunda reflexão sobre Israel, o povo eleito e os outros povos, Irmã Tea Frigério, que também é membro da Equipe de reflexão do CEBI, analisou o Segundo Isaias. A religiosa explicou que, da sua visão não nasce uma proposta missionária. A ler o profeta, podemos descobrir a quem ele quer dar voz. “Essa atitude nos leva a perguntar: na escuta de quem nós queremos estar e quais rostos aparecem”, sublinhou.

O profeta não está sozinho, mas é uma expressão da comunidade profética. Isaias quer convidar para olhar um determinado grupo de pessoas identificado pela seguinte versículo: “Os infelizes que buscam água e não a encontram e cuja língua está ressequida pela sede, eu, o Senhor, os atenderei, eu, o Deus de Israel, não os abandonarei” (Is 41,17). Para irmã Tea, o profeta quer que coloquemos nosso olhar sobre esse grupo de pessoas no mundo atual. “Pessoas que tropeçam e caem pela fadiga, a serviço dos tiranos e desprezado, despojados, saqueados” (Is 52, 3).

Para entender a mensagem de Isaías precisamos partir da realidade dos oprimidos que têm um sonho utópico. O profeta não tem uma proposta missionária, universal, mas tem uma esperança a oferecer para estas pessoas.

Irmã Tea recordou ainda que, “no tempo bíblico de Segundo Isaias, o Império babilônico investia na militarização e na construção de templos e palácios em detrimento das necessidades dos pobres. Enquanto hoje, os maiores investimentos vão para a contração de estádios, grandes obras, para a defesa e palácios, o povo mais pobre fica sem hospitais, escolas e moradia”.

Para reconstruir a identidade é preciso acordar da apatia, ter a capacidade de sonhar e resgatar a memória histórica. “É isso que o profeta está tentando fazer. No texto ele destaca cinco ações de Javé em favor de Israel-Jacó: “eu te escolhi, te agarrei com força, te chamei, não te rejeitei, te ajudei, por isso sê forte e não temas”. (Is 41, 9 ss).

A partir disso, o profeta começa a reconstruir a identidade do povo. Ao longo da história, Deus assume os rostos das necessidades que as pessoas têm. “Aos filhos ilegítimos ele diz: eu sou Pai; aos escravos, ele diz: eu te resgato; a quem faz uma experiência de rejeição, ele diz: eu sou como uma mãe que te acolhe; ao sedento ele diz: eu sou a chuva... Falamos de Deus através de nossas experiências”, recordou. Com isso, “somos convidados a escutar essas vozes que também fazem teologia e têm um jeito próprio de falar de Deus. Aqui nasce a missão”.


A programação do Simpósio se estende até sexta-feira, 28, e conta com a participação de renomados teólogos e biblistas, tais como, Frei Carlos Mesters, Francisco Orofino, Paulo Suess, Estêvão Raschietti, Carlos Intipampa, pastor metodista boliviano.

O 1º Simpósio de Missiologia aconteceu em 1999, em de São Paulo. Já a 2ª edição foi realizada no CCM, em Brasília, em 2013.

25 / Fev / 2014

A Verdade Sem Medo



A memoria e a verdade mais do que resultados, produtos, relatórios, são processos coletivos e individuais, de  lutas  por direitos históricos,  por reparação  e justiça.  Com essa percepção e dentro de um momento conjuntural   propícia a iniciativas nesta perspectiva, que foi criada, em agosto de 2013 a Comissão Indígena da Verdade e Justiça.
E tempo favorável à emergência de verdades ocultadas por décadas e séculos.  É a insurgente memória perigosa, que  aflora e  busca seu espaço nos processos de mudanças e transformações sociais, na construção de novas sociedades.


A Comissão Nacional da Verdade, criada por pressão da sociedade civil, em 2012, ensejou a criação de inúmeras comissões país afora, à semelhança do que ocorreu em outros países da América do Sul, como Argentina e Chile. Foi nesse bojo que se constituiu a Comissão Indígena da Verdade e Justiça, criada pelo movimento indígena e aliados. São ferramentas para dar vazão a urgente necessidade de passar a história colonialista a limpo e dar a voz e a vez às vítimas, aos oprimidos, em especial os que sempre foram preteridos e relegados a segundo plano e discriminados, como no caso dos povos indígenas.

A Comissão Indígena da Verdade e Justiça esteve reunida em Brasília para avaliar o andamento dos trabalhos e traçar rumos e definir   estratégias. Participaram lideranças indígenas, pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, Coiab, Apoime, Atyguasu, Arpinsul e  entidades  aliadas, dentre as quais o Cimi, Armazém da Memória, Universidade Federal da Grande Dourados dentre outros.
Num rápido relance da caminhada foram levantados principais desafios e perspectivas. Todos  manifestaram seu desejo de contribuir para que esse instrumento de luta pelos direitos indígenas se consolide e desperte a consciência nacional quanto às violências e genocídio a que foram submetidas as populações indígenas, especialmente pela ditadura militar. Mais do que um bom relatório a Comissão Indígena alimenta a esperança de que se dê visibilidade a fatos marcantes que causaram a morte de aproximadamente 10 mil indígenas durante os 20 anos de ditadura militar. Em consequência de chacinas, transferências forçadas,  epidemias,  pacificações apressadas, torturas, assassinatos, milhares de indígenas, centenas de aldeias foram destruídas.

Um dos objetivos da Comissão Indígena da Verdade e Justiça é dar visibilidade a esses fatos, através de depoimentos e revelação de documentação histórica. Dessa forma também esperam  contribuir com o relatório da Comissão Nacional da Verdade, previsto para ser concluído até o final deste ano. Porém o mais importante é que a revelação desse processo de negação de direitos, violências e genocídio não se repita e perpetue em nosso país.

Otoniel  Kaiowá observou que é importante trazer os velhos pra falar porque eles conhecem toda história. Diz que devemos demonstrar que não existem fronteiras e essas pesquisas vão ajudar a fortalecer a dimensão territorial. Foi dado muita ênfase aos cuidados indispensáveis para a realização dos relatos e depoimentos nas aldeias, sendo isso fundamentalmente uma atividade dos próprios acadêmicos e professores indígenas. Com isso se estará respeitando o espaço, o tempo e a cultura de cada povo, a situação concreta de cada comunidade e a compreensão de cada depoente. Já existem atividades em curso, dentro desses princípios, conforme relatou o professor Neimar, da UFGD. Dia 21 foi realizado um passo importante com audiência-depoimentos de representantes de 5 aldeias/tekohá, em Dourados.

Outra dimensão importante do trabalho é que se chegue a fazer reparação coletiva aos povos indígenas, dentro das perspectivas que está trabalhando o Ministério Publico Federal. Uma das ações que está sendo movida é pelo MPF do Amazonas, com relação aos Tenharim.

Foram elencados quase duas dezenas de povos que tiveram inúmeras mortes diretamente cometidas por agentes do Estado brasileiro ou em decorrências de suas políticas desenvolvimentistas, para que esses fatos sejam levantados em depoimentos e documentos para serem revelados à opinião pública. 

Também foi visto e discutida uma proposta de publicação em mais de uma dezena de tomos, relatando extensamente todo esse processo de violência e mortandade sofridas pelos povos indígenas em nosso país.

Com muita determinação e realismo, sem ilusões quanto as dificuldades a serem enfrentadas, os membros da Comissão Indígena da Verdade e Justiça estará se empenhando cada vez mais para que mais pessoas, aliados e voluntários da causa se empenhem na luta pela verdade, sem medo e justiça sem subterfúgios.

Egon Heck
 Brasilia, 22 de fevereiro de 2014

PALAVRA DE DEUS E MISSÃO É TEMA DE SIMPÓSIO DE MISSIOLOGIA






O 3º Simpósio de Missiologia, que acontece em Brasília (DF), nos dias 24 a 28 de fevereiro irá discutir
 
 
 
"Palavra de Deus e Missão:
identidade, alteridade e universalidade na Bíblia".
 
 
 
Promovido pelo Centro Cultural Missionário (CCM) e a Rede Ecumênica Latino Americana de Missiólogos e Missiólogas (RELAMI), o evento reunirá 45 pessoas entre, docentes, teólogos, pesquisadores, representantes de instituições missionárias, agentes de pastoral e animadores missionários, de todo o Brasil.
 
 
 
As principais reflexões serão conduzidas por renomados teólogos, missiólogos e biblistas, tais como, Frei Carlos Mesters, doutor em Teologia Bíblica; Francisco Orofino, doutor em Teologia Bíblica e coordenador do Centro de Estudos Bíblicos (CEBI); Nancy Cardoso Pereira, pastora metodista, doutora em Ciências da Religião; Irmã Tea Frigério, membro da equipe de Formação do CEBI; padre Paulo Suess, doutor em Teologia, professor no Instituto São Paulo de Estudos Superiores (Itesp) e padre Estêvão Raschietti, mestre em Missiologia e diretor do CCM.
 
 
 
 
"O objetivo é redescobrir os fundamentos bíblicos da missão para resignificar a ação missionária das igrejas cristã", explica padre Estêvão. O missiólogo adianta algumas questões em debate: "É legítimo proclamar o Evangelho aos outros com intenção de convertê-los ao cristianismo? A missão deve ser exclusivamente voltada à promoção da justiça e paz, da dignidade humana e do diálogo com as religiões? A Palavra de Deus tem um valor universal, vinculante e definitivo para a humanidade ou tem relevância somente para quem adere a ela?" Segundo os organizadores do evento, estas são perguntas fundamentais para a ação evangelizadora da Igreja.
 





O 1º Simpósio de Missiologia aconteceu em de São Paulo, em 1999, convocado pelo Curso de Pós-graduação em Missiologia da Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, e refletiu sobre "Os confins do mundo no meio de nós". A 2ª edição foi realizada no CCM, em Brasília, nos dias 25 de fevereiro a 1º de março de 2013. O evento reuniu cerca de 50 pessoas e abordou o tema "Teologia para uma missão a partir da América Latina hoje". Na ocasião foi criada a Associação de Missiólogos e Missiólogas no Brasil. A entidade reúne pesquisadores e acadêmicos na área de especialização, mestrado, doutorado em missiologia e está aberto também a especialistas afins, numa visão de interdisciplinariedade.
 
 
A elaboração e divulgação de produção acadêmica, promoção de eventos científicos, intercâmbios entre agentes e entidades comprometidos com a ação missionária e interação com grupos pastorais, são algumas das áreas de atuação da Associação. O Simpósio faz parte destas atividades.

Fonte: POM, Jaime Patias. - www.missiologia.org.br
 
 

Encontro de guerreiros: Egon Heck visitou Antônio Iasi S.J.


O Belo Horizonte de Iasi, um dos fundadores do Cimi


Amanhece em Belo Horizonte. Para Iasi já não é como os demais. Normalmente, o dia nem dava os ares de sua graça e o incansável guerreiro se punha de pé, fazia sua reza e dava início a mais uma jornada. Agora, acamado, quando comentei sobre seus 94 anos a serem completados no próximo dia 05 de abril, ele brinca: “se vivo estiver”.

Com a mesma lucidez e perspicácia, sente a vida passar como um filme. “Quando a gente chega com lucidez nessa idade, a vida vai passando na memória da gente como um filme. Lembro-me desde os quatro anos”. Brinquei com ele: “Imagina que longa metragem de 90 anos!”. Ele sorri. Começou a falar da família, da revolução na década de trinta, da casa de comercio de seu pai, da falência, em função da crise financeira, e de sua primeira matricula num colégio público em São Paulo, aos sete anos de idade.
Passo mais de hora e meia com o sereno lutador, que mesmo com algumas dores não se furta a puxar do fundo do baú de sua existência, fatos e retratos marcantes de quem enfrentou, com ousadia destemida, os inimigos dos povos indígenas, especialmente durante a ditadura militar. Como primeiro secretário executivo do Cimi, eleito em Assembleia (1975), fez, com Egydio Schwade, uma dupla temida pelos militares e poderosos da ditadura.
Por ocasião dos assassinatos dos missionários do Cimi, Pe. Rodolfo e Simão Bororo (1976), Pe. João Bosco Burnier (outubro de 1976), ele fez duras críticas aos mandantes de tais crimes,”dando nome aos bois” – senadores, deputados, prefeitos, vereadores e fazendeiros. Inclusive o governador do Mato Grosso. [...] Diante desse quadro de insanidade e violência Iasi insiste em atitudes enérgicas e decisivas: “Volto a insistir que somente uma intervenção federal pode resolver o estado de violência no Mato Grosso... Só assim poderemos ver prestando contas à Justiça aqueles que matam, mandam matar e ainda permanecem em liberdade” ( FSP 21/10/76).
No final do texto “Y Juca Pirama - o índio aquele que deve morrer”, do qual foi um dos principais redatores, consta:“O missionário jesuíta Antonio Iasi Junior comentava: ‘os índios estão sempre levando a pior nessa luta em defesa de seus interesses, chega assumir características de quando em quando de tarefa insuportável. Sinceramente não sei por que existe tanta insensibilidade, tanto egoísmo e tanta podridão entre os que se dizem, em alto e bom som, como defensores dos índios” (Voz do Paraná 14/01/1974).
Iasi se deslocou do Norte ao Sul do país identificando e denunciando as graves violações dos direitos dos povos indígenas, especialmente na década de 70, “do milagre brasileiro” e genocídio indígena. Seus relatórios são referências importantes e contundentes até hoje.
 Despedida e gratidão
“Leve meu abraço de gratidão a todos os companheiros do Cimi e a todos os amigos”, disse-me ele, na despedida. Isso dito de coração e com serenidade, deixa a gente emocionado e comprometido com o belo gesto.
“Sente dores, vislumbra a morte e com ela brinca. Está sereno. Celebra. Reza. Entrega-se por inteiro nas mãos d’Aquele que foi a razão de seu viver e lutar. Na solidão de um quarto, escondido dos holofotes, vive um dos grandes responsáveis pelo CIMI, pela CPT e pelo sucesso na demarcação de muitas áreas indígenas. As coisas de Deus apreciam o silêncio. Falam por si! Que a paixão do Iasi contribua para a ressurreição dos povos indígenas!”. Assim se refere ao Iasi um de seus grandes amigos, Waldemar Bettio, ao compartilhar no meio indigenista notícias sobre esse baluarte da causa indígena.
Nós, do Cimi, somos muito gratos a esse missionário indigenista, testemunha e batalhador destemido pela vida e direitos dos povos indígenas do Brasil.
Egon Heck
Cimi – secretariado

Centro de Formação Vicente Cañas, 17 de fevereiro de 2014.

Já pensou, o Papa queria saber o que os católicos pensam...


 
É bom saber o que pensam os católicos sobre o aborto, mulheres no sacerdócio e uniões gay
 
 
Uma reveladora pesquisa realizada por Univisión, a maior cadeia de televisão dos Estados Unidos, concluiu que a maioria dos católicos do mundo não está de acordo com algumas das principais doutrinas da Igreja como o aborto, o uso de anticoncepcionais e a proibição da comunhão para os divorciados.
 
A reportagem é publicada pelo jornal colombiano El Tiempo, 09-02-2014. A tradução é do Cepat. Fonte: Unisinos, 11.02.2014.
 
A pesquisa, realizada entre dezembro de 2013 e janeiro de 2014, com 12.038 fiéis de 12 países majoritariamente católicos, dos cinco continentes – entre eles a Colômbia -, e com uma margem de erro de 0,9%, adiantou-se em relação ao papa Francisco.

 
 
Em novembro do ano passado, o Pontífice argentino enviou um questionário a todos os bispos do mundo, para que perguntassem aos seus fiéis o que pensam sobre as uniões entre casais do mesmo sexo e sobre o ensino da Bíblia, entre outros temas pastorais. Os resultados desta consulta, também realizada na Colômbia – onde não foi divulgada – serão discutidos no próximo mês de outubro, por ocasião do Sínodo dos Bispos, onde serão debatidos diferentes aspectos sobre o futuro do catolicismo.
 
O documento demonstrou que 58% de consultados estão em discordância com a norma que estabelece que a pessoa que se divorciou e se casou novamente, fora da Igreja, vive em pecado e que, portanto, não pode receber a comunhão. A Europa é o local onde mais desaprovam esta medida (75%), seguida pela América Latina (67%).
 
Também se perguntou sobre o aborto, um tema inegociável para a Igreja católica. Nesse quesito, 57% responderam que deveria se permitir apenas em alguns casos, como quando a vida da mãe ou do ente esteja em perigo; 8% acreditam que se deve permitir sempre e 33% expressaram que não deve nunca ser permitido.

 
 
 
A França é o país onde mais se concorda com o aborto – sempre e em alguns casos – (93%), seguida de Espanha (88%), Itália (83%) e Polônia (82%). Na América Latina, os que mais aprovam esta forma de interrupção da gravidez – sempre e alguns casos – são os brasileiros (81%); seguidos pelos argentinos (79%), mexicanos (73%) e colombianos (61%). Na Colômbia, 38% responderam que o aborto não deve ser permitido sob nenhuma circunstância.
 
Sobre o uso dos anticonceptivos, outro tema vetado pela Igreja católica, a imensa maioria (78%) expressou concordar com o uso. Apenas 19% disseram ser contra esses métodos de planejamento. Inclusive, entre aqueles que participam com freqüência da Igreja, a porcentagem dos que concordam é majoritária (72%). E nove em cada dez daqueles que participam com pouca frequência da Igreja também aprovam.
 
Também foi perguntado aos fiéis se acreditavam que os sacerdotes católicos deveriam se casar. E cinco em cada dez – o maior porcentagem nesta resposta – respondeu que sim. Sendo que 47% discordaram e 3% não responderam. É na Europa onde estão os que mais concordam que os sacerdotes tenham família (70%); na América Latina são 53%.
 
Casamento gay e mulheres com batina
 
 
A pesquisa também perguntou sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Neste ponto, os fiéis católicos foram majoritariamente contra (66%). Apenas 30% foram a favor das uniões gays. Os africanos são os que mais se opõem (99%), seguidos pelos asiáticos (84%). No caso dos latino-americanos, 57% rejeitaram o chamado ‘casamento gay’. Os Estados Unidos são o local onde mais aprovam (54%) esse tipo de casamento. Os consultados de estratos mais baixos (7 em cada 10) são os que mais rejeitam essas uniões.
 
No que diz respeito à eterna discussão sobre o sacerdócio para as mulheres, 51% responderam que elas também deveriam ser ordenadas. Já 45% rejeitaram a figura das mulheres nos altares do catolicismo e 4% não responderam.
 
A Europa é o continente onde mais querem ver as mulheres com batina (64%), seguida pela América do Norte (59%) e América Latina (49%).
 
Todos querem o papa Francisco

 
 
Outra das perguntas desta pesquisa foi sobre a gestão do papa Francisco, durante os primeiros dez meses de seu pontificado. Foram 41% os que a consideraram como ‘excelente’, ao passo que 46% disseram que era ‘boa’. Por fim, 5% disseram que era ‘medíocre’, e 1% que era ruim.
 
A popularidade do Papa argentino é parecida em todo o mundo, sendo majoritária na Europa (90%), seguida pela América do Norte (89%), América Latina (88%), África (85%) e Ásia-Pacífico (82%).

Um ponto de equilíbrio dentro da Teologia da Libertação



[19.02.1932 - 30.01.2014]




Memória e homenagem ao jesuíta João Batista Libânio que faleceu na manhã de quinta-feira, 30.01.2014, em Curitiba (PR)

 



Para o teólogo e escritor Leonardo Boff, com suas obras Libânio cobriu praticamente os principais tratados da teologia. “Sempre conferiu ao seu discurso uma aura de espiritualidade. Sua fala é brilhante, comunicativa, com pitadas de fino humor”
 
Por: Graziela Wolfart e Luis Carlos Dalla Rosa
 
Na visão de Leonardo Boff, que tem em João Batista Libânio um “amigo-irmão”, ele será contado como um dos “mais fecundos teólogos da Igreja pós-conciliar, com vasta obra teológica, pastoral, espiritual e intelectual. Será visto como um teólogo do equilíbrio dinâmico, do bom senso pastoral e sempre fiel a seu lar espiritual, a Ordem Jesuíta, ao sentir da Igreja latino-americana e brasileira e às buscas humanas por sentido e vida. Sua reflexão atinge o nível estrutural das questões e por isso guardará atualidade. Sempre se aprenderá com a visitação de seus escritos”. Na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line, Boff percebe que Libânio cultivou e viveu duas grandes fidelidades: “à Igreja e ao Papa, para além de fatos lamentáveis que ocorreram. Nunca dissociou a teologia da pastoral. Por isso é um dos mais queridos assessores e assistentes eclesiais e eclesiásticos. E a outra fidelidade: sempre foi fiel à dimensão de libertação dos oprimidos, inscrevendo-se como um dos mais representativos teólogos da libertação em nível mundial”.
Confira a entrevista.
 
IHU On-Line – Poderia falar um pouco sobre sua relação com Libânio na qualidade de companheiro de vida e de caminhada?
 Leonardo Boff – Libânio é um amigo-irmão. Começamos juntos nossa atividade teológica que já tem mais de 40 anos. Seja na Conferência dos Religiosos do Brasil, seja na Conferência dos Bispos e em incontáveis cursos e encontros no Brasil e no exterior. Tivemos a mesma formação de base, da universidade alemã e fomos inspirados por mestres comuns como Karl Rahner, Yves Congar e outros. Sempre admirei sua vasta cultura humanística e especificamente teológica. Com suas obras cobriu praticamente os principais tratados da teologia. Sempre conferiu ao seu discurso uma aura de espiritualidade. Sua fala é brilhante, comunicativa, com pitadas de fino humor.
 
IHU On-Line – Quais são as principais marcas de Libânio, como pessoa e pensador?
 Leonardo Boff – Como pessoa, revela-se fraterno, jovial e sempre compreensivo. É um intelectual extremamente culto e sempre atualizado nas questões filosóficas e teológicas. Sabe resumir os mais intrincados pensamentos com simplicidade, captando imediatamente o nó problemático das questões. Por sua piedade e sentido espiritual da vida mostra sinais de santidade. É um amigo-irmão que eu nunca perdi e sempre esteve ao meu lado nas minhas tribulações.
 
IHU On-Line – De modo geral, como o senhor analisa a trajetória teológica e eclesial de Libânio?
 
Leonardo Boff – Ele cultivou e viveu duas grandes fidelidades: à Igreja e ao Papa, para além de fatos lamentáveis que ocorreram. Nunca dissociou a teologia da pastoral. Por isso é um dos mais queridos assessores e assistentes eclesiais e eclesiásticos. E a outra fidelidade: sempre foi fiel à dimensão de libertação dos oprimidos, inscrevendo-se como um dos mais representativos teólogos da libertação em nível mundial.
 
IHU On-Line – Qual é o lugar de João Batista Libânio na Teologia brasileira e latino-americana?
 Leonardo Boff – Cabe a Deus e à história a última palavra. Mas como antepenúltima e penúltima, cabe também uma palavra humana. Ele será contado como um dos mais fecundos teólogos da Igreja pós-conciliar, com vasta obra teológica, pastoral, espiritual e intelectual. Será visto como um teólogo do equilíbrio dinâmico, do bom senso pastoral e sempre fiel a seu lar espiritual, a Ordem Jesuíta, ao sentir da Igreja latino-americana e brasileira e às buscas humanas por sentido e vida. Sua reflexão atinge o nível estrutural das questões e por isso guardará atualidade. Sempre se aprenderá com a visitação de seus escritos.
 
IHU On-Line – Como a opção de Libânio pela Teologia da Libertação tem impactado na caminhada da Igreja?
 Leonardo Boff – Libânio representou um ponto de equilíbrio dentro da teologia da libertação. É a razão pela qual foi muito ouvido pelos bispos e acolhido por todo tipo de auditório. Firme nas opções de base deste tipo de teologia, sabe articulá-las com as doutrinas da tradição cristã, mas de forma criativa e nunca no modo de um conciliarismo fácil. Ajudou a muitos jovens, jornalistas e intelectuais que acabaram formando uma rica roda ao redor de seu pensamento e pessoa. Mas principalmente colaborou enormemente nos grandes encontros nacionais das Comunidades Eclesiais de Base – CEBs que, junto com Frei Betto, foi um de seus inspiradores. Ele se conta entre um dos mais preciosos patrimônios intelectuais de nossa Igreja brasileira. Alguém de quem todos nós nos podemos nos orgulhar.
 
IHU On-Line – Tendo presentes os atuais desafios que emergem do mundo plural (ecologia, diversidade religiosa...), de que modo o senhor analisa a contribuição de Libânio para o pensamento teológico contemporâneo?
 Leonardo Boff – Libânio se caracteriza particularmente por levar um diálogo erudito, aberto e criativo com as tendências atuais do pensamento e com as emergências novas da realidade, seja no campo da pós-modernidade, do fenômeno das religiões, da urbanização do mundo, da busca de sentido da intelectualidade acadêmica, da ecologia e outras. Nesse sentido, ajudou a socializar temáticas não muito abordadas pela teologia escolar e a ilustrar a consciência eclesial com conhecimentos novos, sempre numa perspectiva de fé e de sua incidência na pastoral. Nisso ele, além de teólogo foi um pastor. Melhor, entendeu o verdadeiro sentido de toda a teologia que é ser um momento da pastoral da Igreja.
 
IHU On-Line – Para finalizar, o que o senhor deseja acrescentar sobre Libânio, no momento em que ele celebra 80 anos de vida?
 
Leonardo Boff – Considero um privilégio e uma graça do Altíssimo ter podido caminhar a seu lado. Juntos tentamos dar o melhor de nosso pensamento em benefício dos outros, dos pobres e da Igreja. Que seus 80 anos continuem florescendo em obras de sabedoria, com a jovialidade e fraternidade que tanto admiramos nele.