Por Renato Santana, no sitio do Cimi
O cacique Potiguara Geusivan Silva de Lima, 30 anos, morreu no início
da noite deste domingo, 5, depois de permanecer seis dias internado em estado
grave no Hospital de Emergência e Trauma Senador Humberto Lucena, em João
Pessoa, na Paraíba. A liderança indígena foi vítima de um atentado ocorrido na
noite da última terça-feira, 31 de julho, na aldeia Brejinho, município de
Marcação, litoral norte paraibano. Geusivan levou ao menos três tiros, sendo
dois deles na cabeça. A lesão o fez perder massa encefálica dificultando ainda
mais a recuperação.
Na ocasião, os pistoleiros atiraram também contra Claudemir Ferreira
da Silva, mais conhecido como Cacau, não-indígena que fazia a segurança de
Geusivan que atirou-se contra os assassinos para proteger o cacique. Cacau
tinha 37 anos e morreu no local.
“Estamos de luto e tristes, mas esse luto é também dos povos indígenas
brasileiros que estão vendo suas lideranças sendo assassinadas”, afirma Capitão
Potiguara, da aldeia Forte, e integrante da Comissão Nacional de Política Indigenista
(CNPI).
Geusivan já tinha relatado à Polícia Federal que vinha sofrendo
ameaças de morte. Cacique Capitão diz que o povo Potiguara quer que o ministro
da Justiça José Eduardo Cardozo se sensibilize com a morte e tome providências
junto à Polícia Federal para identificar os assassinos, os possíveis mandantes
e garantir a segurança dos caciques ameaçados. A Polícia Federal abriu
inquérito na última quarta-feira, 1º, para apurar os assassinatos de Geusivan e
Claudemir. Questões fundiárias e um quadro de violência na região permeiam a
lista de lideranças Potiguara marcadas para morrer.
O atentado
Conforme uma
testemunha do ataque, que prestou depoimento para a Polícia Federal, dois
homens armados abordaram Geusivan e ordenaram que ele deitasse de bruços. Antes
de executá-lo, porém, os pistoleiros foram abalroados por Claudemir Ferreira da
Silva, o Cacau, jovem que estava com o cacique na hora do ataque e não era
indígena - os demais caciques o apontam como segurança de Geusivan. Cacau, no
entanto, foi atingido por vários disparos e morreu no local. No chão e ao lado
do companheiro morto tentando defendê-lo, Geusivan recebeu ao menos três tiros,
sendo dois deles na cabeça. Antes da fuga, de acordo com a testemunha, um dos
assassinos disse: “Agora só faltam dois”. Informações não oficiais dão conta de
que as armas utilizadas pelos pistoleiros eram revólveres calibre 38,
descarregados no local. Também que um dos assassinos, o indivíduo que pilotava
a moto, se manteve de capacete durante toda ação; já o acompanhante estava com
o rosto à mostra.
De acordo com o cacique geral do povo Potiguara, Sandro Gomes Barbosa,
o atentado não é um fato isolado e se soma a ameaças, agressões e tentativas de
homicídio sofridas por sete caciques Potiguara e relatadas para a Polícia
Federal e Ministério Público federal (MPF) entre 2011 e este ano.
Questão
fundiária
No último mês de abril a comunidade da aldeia Brejinho retomou 90
hectares de área ocupada por fazendeiro de cana de açúcar - localizada dentro
da terra indígena já demarcada, mas sem extrusão realizada pela Fundação
Nacional do Índio (Funai).
Cacique Geusivan liderou os indígenas, apesar das dificuldades
oriundas do fato de ter tido uma perna amputada depois de acidente
automobilístico. Tão logo se deu a reocupação da área, a comunidade colocou
abaixo toda a plantação de cana, iniciando a construção de moradias e abrindo
roçados.
Tais medidas e a retomada de abril fizeram com que Geusivan passasse a
sofrer ameaças. Nos últimos meses recebeu telefonemas dizendo que iriam
arrancar a outra perna dele, além de avisos dando conta de que sua vida seria
ceifada. Com os outros caciques não foi diferente, incluindo o cacique geral. No
mês de maio homens armados foram até a casa de Sandro, mas não o encontraram.
“Meu filho disse que eu não morava mais ali, que tinha mudado de endereço. Se
eu estivesse em casa teria sido morto. Em julho agora motoqueiros me
perseguiram. Não vamos abandonar a luta, mas só Tupã mesmo para nos proteger”,
afirma o cacique geral.
Situação das
terras indígenas
Os Potiguara do litoral norte da Paraíba se dividem em 32 aldeias
entre as três terras indígenas registradas e declaradas pelo governo: Jacaré do
São Domingos, Potiguara de Monte Mor e São Miguel. Juntas somam 35.328
hectares. A ocupação não indígena nelas é acentuada. Em São Domingos, posseiros
plantadores de cana conseguiram liminares na Justiça para continuarem na terra
já registrada.
Em São Miguel uma usina de cana ocupa área de 14 mil hectares e joga
no rio que corta o território vinhoto, inutilizando-o para a pesca do camarão e
peixe, prática tradicional dos Potiguara, durante seis meses no ano. Já nas
aldeias que compõem a terra Monte Mor, a presença não indígena ultrapassa 7 mil
indivíduos em 1.653 ocupações, além de mais usinas de cana de açúcar. “É muita
covardia: dentro de nossa terra, da qual somos filhos, andamos assombrados.
Porém, não tenho medo de bandido e se tiver que morrer defendendo meu povo, se
essa for a vontade de Tupã, que seja feita. Não vou abandonar a luta”, enfatiza
o cacique geral Sandro Potiguara.
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