"COMO LA CIGARRA" (Mercedes Sosa)

Nello Ruffaldi, missionário sobrevivente




 
Véspera da Festa de Todos os Santos. De madrugado, cheguei em Florença, cidade dos Medici e de Savonarola. Visitei Nello, missionário do Cimi, na casa de seu irmão e cunhada onde repousa das seis quimoterapias, debelando seu CA de pulmão. Quem já sobreviveu um acidente de avião em plena selva amazônica, não se abala por pouca coisa. Assim encontro Nello animado, esperando a cirurgia que será feita em Roma, na clínica Gemelli. Desencontros com Nello são de curta duração. Encontrá-lo é sempre uma festa. Ficamos um dia juntos, lembrando aventuras e desaventuras no Cimi, lamentando a falta de missionários no Cururu, ponderando problemas e perspectivas do projeto do Comire de Belém na África que Nello coordina. Conversa de missionários velhos sobre o tempo que resta. Nesta altura do campeonato, nem lampejos institucionais nem dúvidas existenciais causam abalos císmicos na vida da gente. De noite voltei para Munich. Trem superlotado. Os corredores, um mar de malas e gente prostrada. Parecia um campo de batalha. A imagem se mistura com a conversa do companheiro. Me lembro da canção de Mercedes Sosa:

"Tantas veces me mataron,
tantas veces me morí,
sin embargo estoy aquí
resucitando.
Gracias doy a la desgracia
y a la mano con puñal,
porque me mató tan mal,
y seguí cantando."


http://letras.terra.com.br/mercedes-sosa/63295/

Mudança pacífica na Libéria e «primavera árabe» recebem Nobel da Paz 2011

Mulheres proféticas e militantes pela paz: 
As liberianas Ellen Johnson Sirleaf e Leymah Gbowee e a iemenita Tawakkul Karman


O Comité Nobel Norueguês distinguiu as três mulheres "pela luta pacífica em defesa da segurança das mulheres e dos direitos das mulheres na participação total no trabalho de construção da paz".
Ellen Johnson-Sirleaf, economista, é a atual presidente da Libéria - primeira mulher a ter sido eleita democraticamente num país africano, em 2006 - e Leymah Gbowee é uma ativista com destacada participação no movimento "Women of Liberia Mass Action for Peace' [Ação em massa das mulheres da Libéria pela paz], durante a segunda guerra civil liberiana (1989-2003).
Para a agência católica Misna, especializada em assuntos africanos, Sirleaf é vista como o "símbolo de uma nova África", por ter conseguido colocar a Libéria no "caminho da paz, da reconciliação e da democracia", após décadas de conflito armado.
Já Tawakkul Karman, jornalista do Iémen, é um dos rostos mais conhecidos da oposição ao regime do presidente Ali Abdallah Saleh.
"Não podemos chegar à democracia e à paz duradoura no mundo a não ser que as mulheres tenham as mesmas oportunidades que os homens para influenciar os desenvolvimentos a todos os níveis da sociedade", disse o líder do Comité para o Nobel da Paz, Thorbjoern Jagland.
Tawakkul Karman disse-se "feliz e surpreendida" por ter sido distinguida e dedicou o prémio à "primavera árabe".
Karman é a primeira mulher árabe a ser distinguida com um Nobel da Paz nos 110 anos de existência do prémio, até agora entregue a 12 mulheres, a última das quais a ambientalista queniana Wangari Muta Maathai, falecida a 25 de setembro.
Segundo a agência católica AsiaNews, a jornalista e ativista iemenita distingue-se das "manifestações antigovernamentais" por promover a "não-violência".
Os responsáveis pela atribuição do Nobel da Paz deste ano tinham em mãos candidaturas de 241 organizações e pessoas para o prémio, uma lista recorde.
Em 2010, o prémio foi entregue ao chinês Liu Xiaobo, que ainda se encontra na prisão.

Sem defesa, de cabeça erguida - morreu como uma árvore

Líder comunitário de Miritituba (PA)
 João Chupel Primo assassinado



Sábado, dia 22 de outubro 2011, por volta das 14 horas, foi assassinado com um tiro na cabeça João Chupel Primo, com 55 anos. Ele trabalhava numa oficina mecânica onde o crime ocorreu, ao lado de seu escritório.
O Ministério Público Federal do Pará divulgou nesta segunda-feira (24) que o trabalhador rural João Chupel Primo, 55 anos, foi morto com um tiro horas depois de denunciar exploração madeireira ilegal na Resex Riozinho do Anfrísio e na Floresta Nacional Trairão, na região de Altamira (PA). O MPF pediu à Polícia Federal que garanta proteção para testemunhas que denunciaram a rota de retirada ilegal de madeira.
João Chupel Primo já havia registrado boletins de ocorrência na Polícia Civil de Itaituba e passado detalhes sobre os madeireiros que agem na região para a Polícia Federal em Santarém e para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela administração das Unidades de Conservação que estão sendo invadidas por madeireiros.
A responsabilidade de mais uma vida ceifada na Amazônia, recai sobre o atual governo, o IBAMA/ICMBIO, Policia Federal, que não deram continuidade a operação iniciada para coibir essas práticas criminosas que atingem a vida de pessoas humanas e da Floresta. A CPT – BR163 informa que desde 2005 até os dias atuais, já foram assassinadas mais de 20 pessoas nessa região.

Luto na Prelazia de Santarém (PA)

Nos escreve o bispo D. Wilmar Santin de Itaituba: “Conheci o João. Estive em sua comunidade onde realizei as primeiras crismas como bispo de Itaituba.
Eu o tinha encarregado de fundar uma nova comunidade. Justamente no dia da crisma em junho deste ano, ele deixou de ser o coordenador da Comunidade Nossa Senhora de Nazaré de Miritituba para poder se dedicar à fundação da nova comunidade.
Ele vinha fazendo denúncias sobre grilos de terras e extração ilegal de madeira. Por isso foi assassinado brutalmente com um tiro na testa, sábado passado. Quando os defensores da natureza e da legalidade vão deixar de serem mortos? Quando o Governo Federal colocará pra valer a Polícia Federal para agir no Pará?
Fraternalmente
Dom Frei Wilmar Santin, O.Carm.
Bispo da Prelazia de Itaituba, Pará – Brasil.”

COMPREENDER A MISSÃO PERMANENTE

Significado do Domingo da Missão



Vivemos num mundo fugaz. As relações humanas se tornam cada vez mais passageiras, os contratos de trabalho são “temporários” e as tomadas cinematográficas curtas. “Ficar” entre os jovens significa o contrário, significa não ficar ou ficar por uma noite. Nada mais. Quem fica realmente são as mães; ficam com os filhos aidéticos (até a morte), com os maridos alcoólatras, com os netos abandonados. Quem faz visita na prisão, domingo à tarde, são as mães. A missão permanente que está ligada a uma causa universal, está na contramão dessa fugacidade. Missão permanente significa solidariedade em longo prazo.
Aparecida nos advertiu, que a Missão Continental “procurará colocar a Igreja em estado permanente de missão” (DAp 551). A “Missão Continental” não é uma redução da missão universal para uma unidade menor. Pelo contrário, “Missão Continental” significa mobilização de um continente para a missão universal. E essa universalidade tem uma dimensão geográfica (confins do mundo) e uma dimensão temporal (confins do tempo, escatológica). A missão permanente é uma dimensão da missão universal e como tal, expressão de solidariedade e esperança.
Desde o Vaticano II assistimos não um relaxamento da missão, mas a sua radicalização. A kenose da missão está no seu despojamento colonial da territorialidade e da incorporação de números e territórios. O Vaticano II nos fez a proposta de passar da territorialidade da missão à essência missionária da Igreja, assumindo a sua dimensão trinitária que é envio por amor.
Na origem do Concílio Vaticano II (1962-1965) estão dúvidas sobre a missão da Igreja no mundo de hoje e perguntas sobre a maneira de anunciar a mensagem cristã e de vivê-la com relevância para a humanidade.
Como traduzir os artigos de fé, os sinais de justiça, as imagens de esperança e as práticas de solidariedade para os interlocutores “mundo” e “humanidade” que os consideram, em seu significado simbólico, incompreensíveis, em seu conteúdo, irrelevante, e, em sua aparência, folclóricos?
O Concílio iniciou processos que livraram a missão de fixações a territórios geográficos e fizeram a Igreja descobrir a sua natureza missionária. A partir dessa natureza, procurou reconstruir a sua identidade como povo de Deus, povo messiânico e peregrino. Nos processos que levaram à redefinição da missão, observa-se um deslocamento de uma Igreja que tem missões territoriais, pelas quais faz coletas e pede orações, para uma Igreja na qual a missionariedade representa a orientação fundamental de todas as suas atividades, visando gratuidade, solidariedade, esperança.
Paulo Suess

O perigo doce do açúcar: Da escravidão à diabetes

A amargura da cultura da cana
O açúcar vicia, escraviza e leva à morte prematura

Autor do livro “Açúcar: o perigo doce” (São Paulo: Ed. Alaúde, 2011), o historiador Fernando Carvalho começou a pesquisar o tema há dez anos quando descobriu que tinha diabetes. Desde então, vem percebendo como o açúcar é encarado na sociedade e qual a verdadeira face dessa substância. “Para mim, o açúcar responde pela atual era de doenças crônicas porque ele agride o organismo de diversas formas sistêmicas: ao fazer funcionar irregularmente a produção de insulina, agride o metabolismo que é o processo de construção e manutenção do nosso corpo. Levando isso em consideração, fazer uso de uma ração açucarada é o mesmo que tentar construir um edifício com cimento adulterado”, explicou ele durante a entrevista que se encontra integralmente em IHU On-Line.

Confira partes essenciais da entrevista.

Você afirma no livro que o açúcar mata. De que maneira a cultura do açúcar leva à morte?


Fernando Carvalho – A cultura do açúcar não leva apenas à morte: ela também vicia, escraviza, mutila e polui. Os cortadores de cana formam um grupo de risco no que diz respeito ao consumo de crack, por exemplo, porque este é um trabalho tão desumano que só mesmo à base desta droga é que se consegue aguentá-lo. O Brasil, apesar de ter abolido a escravidão, em 1888, recentemente deu notícias da existência de formas de trabalho escravo, que estava concentrado principalmente neste setor. O governo federal teve que criar uma força-tarefa para coibir esse tipo de prática. [...]


Aqui no Rio de Janeiro, o Hospital da Lagoa possui uma importante unidade de tratamento de diabéticos. O açúcar provoca a mutilação, todos os anos, segundo este hospital, de cerca de dois mil diabéticos.  É a nossa legião de mutilados do açúcar. Ele também provoca a mutilação dentária. No Brasil, em média, um jovem de 18 anos tem 18% de seus dentes cariados e 7% extraídos. Entre os adultos de 44 a 53 anos, o número de cáries diminui para 7%, mas não é porque os mais velhos comem menos açúcar. A razão é mais tétrica: eles já não possuem 48% dos dentes. E 50% do grupo com idade entre 50 e 59 anos são totalmente desdentados. No cômputo geral, mais de 30 milhões de brasileiros não têm dente algum na boca para contar essa triste história.
A perda dos dentes provocada por periodontites deve-se à colonização da boca por bactérias que se alimentam de açúcar e cujo habitat é o ambiente ácido que elas mesmas criam usando o açúcar como substrato. Recentemente, descobriu-se que bactérias da placa bucal através das gengivas, durante a mastigação, alcançam a corrente sanguínea e vão se alojar no coração causando endocardite bacteriana, doença do coração que mata. O diabete, doença sistêmica que compromete todo o sistema vascular, dos capilares aos grandes vasos coronarianos, faz com que 80% dos doentes sejam propensos a morrer de doenças cardiovasculares, e 50% dos homens e 30% das mulheres tenham mais chances de serem vítimas de morte súbita.


O risco de insuficiência cardíaca é duas a três vezes maior entre diabéticos, e derrames são duas vezes mais frequentes em diabéticos hipertensos. Estima-se que em 2025 o mundo terá 300 milhões de diabéticos. As mortes totais por doenças causadas, primária ou secundariamente, pelo consumo da ração açucarada moderna, tais quais as doenças derivadas dos danos ao metabolismo, à inflamação generalizada crônica, à depressão do sistema imunológico, constituem um verdadeiro holocausto, o holocausto sacarino. Apesar de terrível, ele tem um aspecto surrealista: é um holocausto que se desenvolve sob os nossos olhos e – o pior de tudo – suas vítimas “lambem os beiços” enquanto são sacrificadas.

Quando se interessou em pesquisar esse tema?

Fernando Carvalho – Há aproximadamente dez anos descobri que estava com diabetes. Aconteceu comigo aquele conjunto de sintomas que denunciam o esgotamento do pâncreas: poliúria [sintoma que corresponde ao aumento do volume urinário], polidipsia [sensação de sede em demasia], polifagia [significa fome excessiva e ingestão alta de sólidos pela boca]. Se existia um assunto completamente estranho para mim era essa doença.


A palavra diabetes trouxe-me à imaginação um programa de TV animado pelo próprio diabo, as dançarinas seriam as diabetes. Não estava nos meus planos ficar doente na casa dos 40 anos. Eu queria viver com saúde até os 90. Para tanto, procurava levar um estilo de vida e alimentação saudáveis. Nunca fumei. Nunca fui sedentário. Consumia alimentos integrais. Fiz ioga. Lutas marciais. Corria. Servi ao Exército numa fortaleza instalada num morro. Subia e descia ladeira várias vezes ao dia, muitas vezes carregando um fuzil de quase cinco quilos.
Para mim ter ficado doente foi um mistério. Diante disso, passei a estudar o assunto com o ânimo de um historiador – formei-me em História pela Universidade Federal Fluminense. Queria saber exatamente o que aconteceu comigo. Li tudo que encontrei pela frente: patologia, fisiologia, cariologia, medicina natural, e até alquimistas e boticários. [...]

Como o açúcar conseguiu conquistar o status que têm hoje no mundo?

Fernando Carvalho – O açúcar sempre foi um grande negócio. Do jeito que o petróleo já foi chamado de ouro negro, o açúcar já foi o ouro branco. A Holanda invadiu o Brasil no século XVII por causa do açúcar. "A maior migração forçada que a história registra", disse Werneck Sodré, ao analisar o tráfico de negros africanos para a América que também aconteceu por causa do açúcar.
Os interesses do açúcar estão entrelaçados com o de outras indústrias como a farmacêutica, a de alimentos e a de bebidas alcoólicas e refrigerantes. A relação comensalista entre essas indústrias – que conta ainda com a participação de médicos, profissionais de saúde, legisladores, da mídia, da literatura inclusive a científica e até do folclore – é o que chamamos "indústria da doença" que se sustenta mutuamente de alimentos e medicamentos.
Um negócio dessa envergadura sempre esteve no poder, de modo que o açúcar chegou onde hoje se encontra empurrado pelo poder econômico. Atualmente, dezenas de milhões de donas de casa aprendem novas receitas de doces. O açucaramento da dieta avança sob nossos olhos: pizzas e empadas doces são passos recentes do avanço da ditadura do açúcar.
A Food and Drug Administration – FDA, agência do governo estadunidense que regulamenta alimentos e medicamentos, considera o açúcar de consumo seguro. Aqui no Brasil a Anvisa nada pode. O açúcar é regulamentado e fiscalizado pelo Ministério da Agricultura. Ou seja, a “raposa” legisla e fiscaliza o “galinheiro”. Umas raposas legislam sobre cerveja, outras sobre o vinho. No Brasil, cerveja e vinho são adulterados com açúcar. Aqui no país, os livros de patologia têm um capítulo sobre o metabolismo do álcool, mas ignoram o metabolismo da sacarose. A luta contra o açúcar fica por conta de uns poucos médicos abnegados como o brasileiro descendente de asiáticos Yotaka Fukuda, que demonstrou o papel do consumo de açúcar na labirintite. [...]

Como o senhor relaciona o consumo do açúcar com as doenças modernas?

Fernando Carvalho – Da Idade Média para trás não existiam as doenças crônicas. O açúcar não existia e as doenças que afligiam o homem medieval eram infectocontagiosas. Tão logo o açúcar entrou em cena se aboletando na mesa, ele disse a que veio e começou destruindo os dentes dos nobres e burgueses europeus. A cárie é uma doença, ao mesmo tempo, crônica e aguda. Antes do advento do açúcar a incidência de cáries era de 1% para baixo. Hoje, a epidemia de cárie atinge 99% da raça humana. E esse 1% da humanidade livre de cáries são os poucos países situados no coração da África: Togo, Ruanda, Gana, Lesoto... onde a ração açucarada não chegou ainda.

Usina de açúcar e etanol da Cosan,
financiada pelo BNDES, recentemente
inaugurada em Caarapó/MS

Outra epidemia moderna que pode ser associada ao açúcar é a de obesidade. Açúcar é caloria pura e é transformado em gordura, o que não ocorre com carnes, por exemplo. Se gordura engordasse, a dieta Atkins [5] não funcionaria. Sendo calorias vazias, isto é, destituídas de qualquer nutriente, quando é adicionada a qualquer alimento o açúcar torna esse alimento hipercalórico e eleva seu índice glicêmico. O povo brasileiro já anda consumindo 60 quilos de açúcar por ano em média. 95% dos obesos o são por causa do que comem, de modo que a relação entre consumo de açúcar e a epidemia de obesidade é óbvia e ululante.
Para mim, o açúcar responde pela atual era de doenças crônicas porque ele agride o organismo de diversas formas sistêmicas: ao fazer funcionar irregularmente a produção de insulina, agride o metabolismo que é o processo de construção e manutenção do nosso corpo. Levando isso em consideração, fazer uso de uma ração açucarada é o mesmo que tentar construir um edifício com cimento adulterado.
Outro mecanismo pelo qual o açúcar agride todo o organismo de uma só vez é pelo processo de roubo de minerais. O açúcar causa um desequilíbrio mineralógico devido ao roubo de nutrientes que o metabolismo de calorias do açúcar provoca. Há também o problema da glicação não enzimática de proteínas. A primeira vítima da elevação do açúcar no sangue como consequência do consumo da ração açucarada é a proteína glicada – mais conhecida como hemoglobina "gllicosilada". A glicação da hemoglobina é uma reação simples de condensação que dispensa a intermediação de enzimas. Essa reação "aleija" a hemoglobina prejudicando sua função de oxigenar todo o organismo. Faltando oxigênio, o horizonte é a necrose.
A glicação de proteínas é um mecanismo intermediário de uma série de doenças. Por exemplo, a glicação do cristalino explica a catarata senil. As próprias células-beta pancreáticas, a insulina e seus receptores musculares, e até os nervos, está exposto ao fenômeno da glicação degenerativa. De modo que o diabetes, a resistência insulínica e a hipertensão encontram sua etiopatogenia no consumo de açúcar.
De conhecimento recente da ciência é a inflamação crônica generalizada clinicamente silenciosa (ou subclínica) que está se alastrando por toda a humanidade. Tal inflamação é apontada como sendo o mecanismo intermediário das doenças crônico-degenerativas. Essa inflamação crônica generalizada e subreptícia é comparada com as pestes históricas da Idade Média em virtude das milhões de vítimas que estão sendo ceifadas em todo o mundo. As doenças vasculares que tinham o colesterol como bode expiatório, na verdade são consequência de um processo inflamatório das paredes das artérias. Asma, síndrome do intestino irritável e uma infinidade de outras condições são intermediadas por processos inflamatórios e a ração açucarada moderna é a principal culpada disso.

Que verdades precisam ser ditas a respeito do açúcar?

Fernando Carvalho – São várias. Vamos por tópicos:
1) O açúcar não é um alimento, mas sim uma substância agressora do organismo.
2) O açúcar, ao impregnar a alimentação humana, transformou-a numa ração patogênica.
3) Médicos e nutricionistas estão enganados quando lidam com o açúcar como sendo um "carboidrato" como outro qualquer.
4) dentistas também estão enganados quando atribuem as cáries à "carboidratos fermentáveis".
5) A perda de um dente é uma humilhante forma de mutilação e que o desdentado é uma vítima da ração açucarada e não culpado de maus hábitos de higiene bucal.
6) Uma pessoa pode ser gorda e saudável dependendo de como ela se alimenta.
7) Obesos mórbidos são vítimas da ração açucarada e não culpados de maus hábitos alimentares.
8) A ração açucarada empurrou a raça humana para a era das doenças crônicas, metabólicas e degenerativas.
9) A expulsão do açúcar da mesa vai acabar com a era das doenças crônicas.

E como uma última verdade que poucos sabem é que a Organização Mundial de Saúde – OMS deseja que o consumo de açúcar do açucareiro não ultrapasse 10% das calorias totais ingeridas diariamente. Se dependesse da OMS, os governos do mundo inteiro fariam uma campanha semelhante àquela feita contra o cigarro para assegurar que o consumo de açúcar não ultrapasse esse número.
Em 2004, quando o comitê executivo da OMS se reuniu para aprovar tal estratégia, sua proposta foi derrotada pelo lobby da indústria da doença. Perto de 50 países votaram com a OMS; os vetos contaram com os votos dos Estados Unidos, Brasil, Suazilândia e Ilhas Maurício. Cuba, envergonhada, deu um apoio de bastidores. Com os vetos dos traficantes de açúcar, a OMS aprovou uma exortação às indústrias de alimentos e bebidas no sentido de que reduzam o uso de sal, gordura e açúcar. Recentemente, o Ministro da Saúde, num acordo de cavalheiros, obteve da indústria de alimentos o compromisso de usar "menos sal e gorduras", mas o açúcar ficou de fora da conversa.

Viver em cana?



Como funciona o movimento Açúcar Zero?


Fernando Carvalho – O Açúcar Zero é um movimento político-nutricional que defende a retirada do açúcar da alimentação humana visando acabar com seu caráter patogênico e, com isso, pôr fim à era das doenças crônicas, metabólicas e degenerativas. O movimento é muito incipiente ainda. Costumo dizer que somos um pequeno exército de Brancaleone.[...]
Um objetivo político arrojado de nosso movimento é ver se conseguimos fazer com que o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – Consea compre essa briga. Afinal, como falar em segurança alimentar quando estamos diante de uma ração patogênica? O Consea já usa o termo alimentação "saudável" que deve ser assegurada a todo o povo brasileiro. Precisa evoluir para entender o que é a ração patogênica e o que é preciso fazer para acabar com seu caráter patogênico. O grande dia para o povo brasileiro será o da aprovação da Lei Áurea Nutricional, a lei que proibirá a adição de açúcar aos alimentos.

Estado laico – nem tanto

Quem são os padrinhos das escolas públicas?

 
O Estado brasileiro é laico, mas os nomes mais comuns de escolas públicas no Brasil são, de longe, religiosos. Um levantamento feito pela Folha no cadastro do MEC de mais de 160 mil estabelecimentos revela que Nossa Senhora, Jesus Cristo, São Francisco e Santo Antônio são, entre os nomes pesquisados, os mais frequentes. A reportagem é de Antônio Gois e Marcelo Soares e publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, 16-10-2011.
Alunos pintam a fachada de sua escola
Em alguns casos, os nomes parecem lemas de igreja. É o caso da Escola Municipal Só Jesus Salva, em Monte Santo (BA), ou Jesus é o Caminho, em Igarapé-Miri (PA). Há ainda colégios com títulos idênticos ao de denominações religiosas do país. Assembleia de Deus, por exemplo, dá nome a 15 estabelecimentos públicos.
Depois das referências religiosas, aparecem figuras históricas como Ruy Barbosa, Tancredo Neves, Tiradentes, Castello Branco, Monteiro Lobato e Getúlio Vargas.
POLÍTICOS
Em alguns Estados, no entanto, o batismo de escolas parece ser estratégia de autopromoção de políticos. No Maranhão, por exemplo, o sobrenome Sarney está em 161 escolas (179 em todo o país). O ex-presidente José Sarney dá nome a 92. Sozinho, supera a soma de seus sucessores - Collor, Itamar, FHC e Lula -, presentes em 15 escolas do país.
Na Bahia, entre os nomes mais comuns estão Antônio Carlos Magalhães (1927-2007), em 119 escolas, e Luís Eduardo Magalhães (1955-1998), em 101. Somados, os dois superam o número de homenagens em todo o país para a Princesa Isabel, o Papa João Paulo II ou o escritor Machado de Assis.
A prática é utilizada também em municípios. É o caso da cidade fluminense de Magé, com 223 mil habitantes. Das 87 escolas municipais, 21 têm o nome Cozzolino, o mesmo da ex-prefeita afastada por denúncia de corrupção em 2009, Núbia Cozzolino. Como o MEC não divulga estatísticas sobre nomes mais comuns em escolas, foi preciso fazer uma pesquisa nome por nome, para descobrir quantas vezes ele se repetia.
Embora não seja um levantamento completo, a reportagem procurou incluir nomes de figuras históricas ou políticos locais para identificar os que possivelmente usam o batismo de escolas como estratégia de autopromoção.
A prática é comum, apesar de uma lei federal de 1977 que proíbe atribuir nomes de pessoas vivas a bens públicos da União e a estabelecimentos que recebam verbas federais, caso de escolas.
Para o professor da Faculdade de Educação da UFRJ e coordenador do Observatório da Laicidade do Estado, Luiz Antônio Cunha, os alunos acabam sendo influenciados pois é comum escolas ensinarem quem são as personalidades que dão nome a elas.
"É a utilização da fachada da escola como outdoor. Uma expressão clara do patrimonialismo político, do uso privado do espaço público e dos alunos como destinatários cativos da celebração de algumas figuras políticas."

Fim do casamento entre democracia e capitalismo. E agora José?

O movimento "Ocupar Wall Street"
denuncia idolatria do mercado

O filósofo e escritor esloveno Slavoj Zizek visitou a acampamento do movimento Ocupar Wall Street, no parque Zuccotti, em Nova York e falou aos manifestantes. “Estamos testemunhando como o sistema está se autodestruindo. "Quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou". O filósofo enviou a íntegra de seu discurso que foi originalmente publicado no blog da Boitempo, por Carta Maior e Unisionos.



Acorda América!

Zizek com os ocupantes da Wall Street

 Durante o crash financeiro de 2008, foi destruída mais propriedade privada, ganha com dificuldades, do que se todos nós aqui estivéssemos a destruí-la dia e noite durante semanas. Dizem que somos sonhadores, mas os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente da mesma forma.
Não somos sonhadores. Somos o despertar de um sonho que está se transformando num pesadelo. Não estamos destruindo coisa alguma. Estamos apenas testemunhando como o sistema está se autodestruindo.
Todos conhecemos a cena clássica do desenho animado: o coiote chega à beira do precipício, e continua a andar, ignorando o fato de que não há nada por baixo dele. Somente quando olha para baixo e toma consciência de que não há nada, cai. É isto que estamos fazendo aqui.
Estamos a dizer aos rapazes de Wall Street: “hey, olhem para baixo!”
Em abril de 2011, o governo chinês proibiu, na TV, nos filmes e em romances, todas as histórias que falassem em realidade alternativa ou viagens no tempo. É um bom sinal para a China. Significa que as pessoas ainda sonham com alternativas, e por isso é preciso proibir este sonho. Aqui, não pensamos em proibições. Porque o sistema dominante tem oprimido até a nossa capacidade de sonhar.
Vejam os filmes a que assistimos o tempo todo. É fácil imaginar o fim do mundo, um asteróide destruir toda a vida e assim por diante. Mas não se pode imaginar o fim do capitalismo. O que estamos, então, a fazer aqui?
Democracia agora!
Deixem-me contar uma piada maravilhosa dos velhos tempos comunistas. Um fulano da Alemanha Oriental foi mandado para trabalhar na Sibéria. Ele sabia que o seu correio seria lido pelos censores, por isso disse aos amigos: “Vamos estabelecer um código. Se receberem uma carta minha escrita em tinta azul, será verdade o que estiver escrito; se estiver escrita em tinta vermelha, será falso”. Passado um mês, os amigos recebem uma primeira carta toda escrita em tinta azul. Dizia: “Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha.”
É assim que vivemos – temos todas as liberdades que queremos, mas falta-nos a tinta vermelha, a linguagem para articular a nossa ausência de liberdade. A forma como nos ensinam a falar sobre a guerra, a liberdade, o terrorismo e assim por diante, falsifica a liberdade. E é isso que estamos a fazer aqui: dando tinta vermelha a todos nós.
Existe um perigo. Não nos apaixonemos por nós mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Haverá então novas oportunidades? Não quero que se lembrem destes dias assim: “Meu deus, como éramos jovens e foi lindo”.
Lembrem-se que a nossa mensagem principal é: temos de pensar em alternativas. A regra quebrou-se. Não vivemos no melhor mundo possível, mas há um longo caminho pela frente – estamos confrontados com questões realmente difíceis. Sabemos o que não queremos. Mas o que queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes queremos?
Acorda América!
Lembrem-se, o problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema. Tenham cuidado, não só com os inimigos, mas também com os falsos amigos que já estão trabalhando para diluir este processo, do mesmo modo que quando se toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, sorvete sem gordura.
Vão tentar transformar isso num protesto moral sem coração, um processo descafeinado. Mas o motivo de estarmos aqui é que já estamos fartos de um mundo onde se reciclam latas de coca-cola ou se toma um cappuccino italiano no Starbucks, para depois dar 1% às crianças que passam fome e fazer-nos sentir bem com isso. Depois de fazer outsourcing ao trabalho e à tortura, depois de as agências matrimoniais fazerem outsourcing da nossa vida amorosa, permitimos que até o nosso envolvimento político seja alvo de outsourcing. Queremos ele de volta.
Não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou.
A mudança é possível. O que é que consideramos possível hoje? Basta seguir os meios de comunicação. Por um lado, na tecnologia e na sexualidade tudo parece ser possível. É possível viajar para a lua, tornar-se imortal através da biogenética. Pode-se ter sexo com animais ou qualquer outra coisa. Mas olhem para os terrenos da sociedade e da economia. Nestes, quase tudo é considerado impossível. Querem aumentar um pouco os impostos aos ricos? Eles dizem que é impossível. Perdemos competitividade. Querem mais dinheiro para a saúde? Eles dizem que é impossível, isso significaria um Estado totalitário. Algo tem de estar errado num mundo onde vos prometem ser imortais, mas em que não se pode gastar um pouco mais com cuidados de saúde.
Talvez devêssemos definir as nossas prioridades nesta questão. Não queremos um padrão de vida mais alto – queremos um melhor padrão de vida. O único sentido em que somos comunistas é que nos preocupamos com os bens comuns. Os bens comuns da natureza, os bens comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual, os bens comuns da biogenética. Por isto e só por isto devemos lutar.
O comunismo falhou totalmente, mas o problema dos bens comuns permanece. Eles dizem-nos que não somos americanos, mas temos de lembrar uma coisa aos fundamentalistas conservadores, que afirmam que eles é que são realmente americanos. O que é o cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes que estão ligados pelo amor um pelo outro, e que só têm a sua própria liberdade e responsabilidade para este amor. Neste sentido, o Espírito Santo está aqui, agora, e lá em Wall Street estão os pagãos que adoram ídolos blasfemos.
Por isso, do que precisamos é de paciência. A única coisa que eu temo é que algum dia vamos todos voltar para casa, e vamos voltar a encontrar-nos uma vez por ano, para beber cerveja e recordar nostalgicamente como foi bom o tempo que passámos aqui. Prometam que não vai ser assim. Sabem que muitas vezes as pessoas desejam uma coisa, mas realmente não a querem. Não tenham medo de realmente querer o que desejam. Muito obrigado.

A quem interessa o assassinato de Lindomar Terena (MS) e Moacyr Grechi (RO)?

Crônica de mortes anunciadas




Lindomar Terena

Os participantes da XIX Assembleia Nacional do Cimi se emocionaram com muitos depoimentos de líderes indígenas sobre a violência que se abate sobre seus territórios. Lindomar Terena chorou diante dos delegados lágrimas de despedida: “Estou ameaçado de morte, mas eu quero viver junto com meu povo”!
A história de perseguição de Lindomar Terena e de seu povo o leitor encontra no blog da Articulação dos povos Indígenas do Brasil (Apib) e nas páginas de Brasil de Fato (http://www.brasildefato.com.br).

No dia 17 de maio 2010, cerca de 800 indígenas do Povo Terena de Mato Grosso do Sul foram violentamente expulsos de suas casas pela Polícia Federal. Os policiais, fortemente armados e munidos de cães, bombas e gás lacrimogênio, não fizeram distinção e agrediram, inclusive, idosos, mulheres e crianças durante a ação para reintegração de posse de parte da fazenda Petrópolis localizada no município de Miranda. O imóvel pertence ao ex-governador do estado Pedro Pedrossian.
A área já foi identificada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) como Terra Indígena, mas grandes proprietários rurais aliados ao governo estadual, têm usado manobras judiciais para impedir o processo de demarcação. Outro subterfúgio patrocinado por este grupo é o emprego da intimidação, discriminação e violência contra os indígenas que lutam legitimamente por seus direitos.
Organizações indígenas como a Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal (Arpipan) e a Aty Guassu (Grande Assembleia Guarani Kaiowá), além de entidades parceiras como o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), têm denunciado esse crimes às autoridades sem que nenhuma providências seja tomada pela polícia ou pela Justiça do Estado. “O povo já está de 28 para 29 anos brigando por essa terra. Quando a Funai tenta soltar suas portarias de identificação de terra, também o outro lado se mobiliza para impedir os trabalhos”, falou Lindomar Terena, líder indígena. Segundo o cacique Juarez, da aldeia Babaçu, o clima foi tenso. “Ficamos com mais medo quando a polícia começou a atirar com armas e bombas, e quem começou a confusão foi o Pedro Paulo, filho do ex-governador Pedrossian. Ele estava com uma pistola e atirou junto também”, denunciou o cacique. O cacique Paulino, da aldeia Moreira de Miranda também denunciou os fazendeiros. “Eles estavam juntos com os policiais e alguns estavam armados também” (fonte: Apib).

Incêndio criminoso

Na sexta-feira, 3 de junho de 2011, um ônibus com cerca de 30 estudantes indígenas do povo Terena foi atacado por pedras e coquetéis molotov quando retornava à aldeia na Terra Indígena Cachoeirinha, em Miranda (MS). O ataque ocorreu por volta das 23h30 e resultou em cinco gravemente feridos. O veículo faz o transporte escolar entre o município de Miranda e as aldeias indígenas da região.
De acordo com Flávio Vicente Machado, coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) de Campo Grande, o ônibus teve os vidros quebrados pelas pedras e os coquetéis molotov iniciaram incêndio que feriu aos estudantes, que têm entre 15 e 29 anos. “Os alunos  pularam com o ônibus ainda em movimento”, conta. Machado ainda alega que houve a tentativa por parte da polícia de incriminar os indígenas, sob a alegação de que o ataque foi motivado por briga interna na aldeia. No entanto, o líder indígena Lindomar Terena afirmou que todos sabem quem praticou o crime: “O ataque veio da parte dos fazendeiros por causa da disputa pela terra”.
Lindomar Terena relata que os indígenas estão reunindo provas para apresentar ao Ministério Público Federal (MPF), que acompanhará as investigações da Polícia Civil. “Em um caso como este, se não forem tomadas providências de punir os responsáveis, corremos o risco de acontecer novamente”, diz o indígena. “Eles [os fazendeiros] falam que vão matar as pessoas das comunidades indígenas como se matam formigas”, completa Lindomar.

Os fatos

A Terra Indígena Cachoeirinha foi reconhecida pelo Relatório de Identificação publicado no Diário Oficial da União (DOU), em 2003, e pelo Governo Federal, através da Portaria Declaratória 791, de 17 de abril de 2007, que firmou seus limites e determinou a demarcação. Em 2010, o processo de demarcação foi suspenso por decisão liminar proferida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, em favor de uma ação movida pelo ex-governador do Mato Grosso do Sul, Pedro Pedrossian, que possui uma fazenda na área. O caso permanece no STF aguardando julgamento do ministro Marco Aurélio.
Conforme Lindomar Terena, sem a conclusão da demarcação, os 7 mil indígenas da Terra Indígena Cachoeirinha vivem em uma área de 2.688 hectares, sendo que a área reconhecida é de 36 mil hectares. “A gente está lutando para que seja concluída a demarcação total desta terra”, explica o indígena. Por ocasião da visita da Equipe Técnica Federal do Programa de Proteção de Defensores dos Direitos Humanos (PPDDH), da Secretaria Especial de Direitos Humanos, os indígenas recomendaram a inclusão de lideranças Terena no programa de proteção (fonte: Brasil de Fato).
 

D. Moacyr Grechi
 Dom Moacyr Grechi, arcebispo de Porto Velho, Rondônia, sofreu ameaças depois de ter pedido a Ouvidoria Agrária intervir para evitar o despejo de 45 famílias de posseiros de Ariquemes . Dom Moacyr tinha pedido a intervenção da Ouvidoria Agrária e a Justiça Federal concedeu um prazo de mais 60 dias para as famílias. Segundo o INCRA, existe uma ação de retomada judicial da área, pois é terra da união. Dom Moacyr teria registrado queixa na Delegacia de Polícia Civil e o MPF aberto inquérito civil público para averiguar as ameaças recebidas. Segundo o Ministério Público Federal a instauração do Inquérito se justifica devido à "flagrante ausência de políticas públicas voltadas para a redução da violência no Estado de Rondônia, notadamente no que se refere à violência decorrente de movimentos sociais".


Documento Final da XIX Assembleia Geral do Cimi: “Com os povos indígenas construir o Bem Viver do planeta Terra”

"Pode falhar tudo. Menos a esperança"

Convocação
Entre os dias 04 e 08 de outubro de 2011, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), já na antevéspera dos 40 anos de sua existência, realizou sua XIX Assembleia Geral em Luziânia/GO. Participaram do evento uma representação significativa dos povos indígenas, missionários/as, bispos e convidados/as. A Assembleia elegeu sua nova diretoria para o próximo quadriênio. Foram eleitos D. Erwin Krautler, como presidente, em seu segundo mandato, Ir. Emília Altini, como vice-presidente e Cleber Cesar Buzatto, como secretário geral da entidade. Desde o começo, a advertência dos povos indígenas de que “a mãe terra clama pelo Bem Viver” permeava as celebrações e análises, como lema e pano de fundo desta Assembleia.
Escutamos esse clamor da mãe terra que nos impele a um compromisso sempre mais urgente e radical. Debruçamo-nos sobre o contexto político que envolve a existência dos povos indígenas em todo o Brasil, contexto esse que impossibilita a construção dos projetos de Bem Viver desses povos.

Oração

Para eles, como ficou explícito nos depoimentos das lideranças indígenas durante a Assembleia, o Bem Viver depende fundamentalmente da posse de seus territórios tradicionais, onde possam desenvolver sua cultura material e seus rituais religiosos, espaço de convivência comunitária e partilha solidária em harmonia com a natureza e com o sagrado.
No entanto, a realidade que os cerca, nos confrontou com assassinatos, suicídios de adolescentes, ódio racial explícito, destruição de sítios e rios sagrados, despejos decretados de terras ancestrais ou confinamento em minúsculos espaços. Os projetos governamentais desenvolvimentistas com base nos grandes empreendimentos são um atentado contra a natureza e os povos indígenas. Vivemos um período de duros embates políticos e jurídicos com o Governo Federal, especialmente nos temas vinculados aos direitos constitucionais. Firmamos novamente nossa posição contra o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC. Estimulado e financiado pelo governo brasileiro, este programa ataca de modo violento o meio ambiente e as terras indígenas em todo o país.
Constatamos, inspirados no relatório da Presidência do Cimi apresentado na Assembléia, graves falhas do Governo Federal em relação:
- à demarcação, fiscalização e proteção das terras. Sublinhamos as situações emblemáticas vividas pelo povo Xavante da Marãiwatsédé no Mato Grosso em luta pela desintrusão do seu território invadido por fazendeiros; pelos Guarani Kaiowá e Terena do Mato Grosso do Sul expropriados de suas terras pelo agronegócio, vivendo em situações extremas de sobrevivência, muitos em acampamentos ao longo das estradas; pelos Pataxó Hã-Hã-Hãe da Bahia que há trinta anos aguardam a decisão do STF para reassumirem a posse de suas terras tradicionais; pelos Awá–Guajá (isolados e/ou de recente contato) e demais povos indígenas do Maranhão que sofrem com a violência dos madeireiros que devastam as suas matas e que estão com suas terras invadidas; pelos povos Tupinambá (BA), Xakriabá (MG), Krenyê (MA) e numerosos outros povos que foram expulsos de suas terras tradicionais. Das 1.023 terras indígenas existentes, apenas 360 estão regularizadas, e 322 terras continuam sem nenhuma providência administrativa para serem reconhecidas pelo Estado Brasileiro;
Celebração
- aos grandes empreendimentos econômicos em terras indígenas que impactam além da vida humana, a natureza, suas águas, matas, plantas e animais. Os exemplos deste modo perverso de lidar com o meio ambiente são a transposição do Rio São Francisco, os complexos hidroelétricos do Rio Madeira e do Rio Tocantins e as demais hidrelétricas em construção ou previstas no Rio Xingu, Tapajós, Juruena, Teles Pires e Araguaia, bem como a construção e duplicação de rodovias. São aproximadamente 434 empreendimentos que atingem os territórios indígenas e geram impactos em 182 terras indígenas de pelo menos 108 povos;
- à política indigenista governamental executada: pela Funai que, sobretudo a partir de sua atual reestruturação, assume o papel de prestadora de serviços ao PAC, ou seja, uma agência para avalizar obras que afetam terras indígenas; pela Sesai, que envolta num processo de transição interminável com a Funasa, desacredita o Subsistema de Atenção à Saúde, para manter a política de assistência terceirizada. Essa precariedade da atenção à saúde indígena reflete-se em situações dramáticas como aquela reiteradamente denunciada pelos povos indígenas do Vale do Javari onde, segundo inquérito sorológico da Fundação de Medicina Tropical - AM, 87% da população sofre de hepatite provocando mortalidade sistemática; pelas Secretarias de Educação nos Estados e Municípios, no âmbito dos territórios etnoeducacionais do MEC, que continuam reproduzindo processos educacionais integracionistas;
- à proteção das terras dos Povos Indígenas Isolados que são vulnerabilizadas por projetos do PAC e continuam invadidas por madeireiros, grileiros, fazendeiros, narcotraficantes, sobretudo nas regiões de Rondônia, Norte do Mato Grosso, Sul do Amazonas, Acre e Maranhão.
Causam-nos espanto posicionamentos do Poder Judiciário, que em algumas decisões coloca em risco os preceitos constitucionais, uma vez que estes são analisados e interpretados a partir dos interesses políticos e econômicos e não à luz dos direitos dos povos indígenas. Muitos procedimentos administrativos de demarcação de terras indígenas estão paralisados devido a decisões judiciais de diferentes instâncias da Justiça Federal.
Repudiamos os sistemáticos atentados, no âmbito do Poder Legislativo, contra a Constituição Federal com a intenção de limitar, através de projetos de lei, o alcance do Artigo 231. Existem mais de 200 Projetos de Lei (PLs), Propostas de Emendas Constitucionais (PEC) e Projetos de Decretos Legislativos (PDLs) contra os povos indígenas, tramitando na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Por outro lado, os projetos de interesse dos povos indígenas, tais como o que trata do novo Estatuto dos Povos Indígenas e o que institui o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) estão engavetados.
Mais uma vez esse panorama de desrespeito e violação dos direitos indígenas nos leva a um posicionamento crítico e comprometido com a sorte desses povos, assim como com todos os povos originários de nossa Latino América.
A partir desse compromisso, solidarizamo-nos com os povos indígenas das terras baixas da Bolívia e apoiamos sua luta contra a imposição da estrada projetada pela IIRSA (Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul Americana), para atravessar o Território Indígena Parque Nacional Isiboro Sécure – TIPNIS, a ser construída pela empresa brasileira OAS com financiamento do BNDES. Manifestamos a nossa indignação pela violência da polícia contra os manifestantes da Marcha Indígena para La Paz. Juntamente com os indígenas solicitamos ao governo de Evo Morales o respeito ao Direito de Consulta, livre, previa e informada.
Assumimos as propostas dos representantes dos povos indígenas presentes na Assembléia:
1) Abraçar a Campanha pelo Bem Viver dos povos indígenas do Vale do Javari, como caso emblemático da luta pelo direito à saúde digna e de qualidade, e de luta contra a extinção dos nossos povos programada de modo indisfarçável pelo capitalismo, interessado nas nossas terras, territórios e riquezas;
2) Lutar para garantir o direito à terra, sem a qual não há Bem Viver e do qual dependem todos os outros aspectos da nossa vida: nossa cultura, tradições, costumes, culinária e rituais;
3) Aprimorar nossas formas de mobilização, como o Acampamento Terra Livre (ATL), para repercutir nossas lutas, mudar o quadro de mal viver e denunciar a criminalizacão das nossas lideranças;
4) Desenvolver ações de impacto para fazer valer as nossas reivindicações em prol de políticas públicas de qualidade conforme o nosso Bem Viver;
5) Fortalecer o Bem Viver nosso enquanto visão contrária ao capitalismo, considerando eixos comuns de luta, a Mãe Terra e a Vida Plena, em sintonia e somando com as experiências de outros povos, segmentos e movimentos sociais do país, da América Latina e do Mundo.
No final dessa Assembleia, assumimos nosso compromisso com a causa indígena com as palavras de D. Pedro Casaldáliga: “Nós família do Cimi estamos convencidos de que não serão os governos de baixa democracia que resolverão os desafios maiores da maioria do nosso povo. Sabemos por experiência, que a causa indígena é uma causa que atrapalha. Os povos indígenas são inimigos do sistema. Sentimos que mesmo aproveitando as brechas que os governos atuais nos dão, a nossa luta é maior. A política indigenista não é a favor dos povos indígenas. A política agrária não é a favor do povo camponês. Sejamos conscientes. Sejamos críticos e autocríticos. E mantenhamos a esperança. Pode falhar tudo. Menos a esperança”.
Saímos dessa Assembléia tendo bebido da espiritualidade presente na memória ancestral dos povos indígenas e do Evangelho e, por isso, fortalecidos na decisão de descolonizar a vida e a história. Juntamente com todos os povos indígenas, queremos caminhar na busca do Bem Viver colaborando, assim, com a construção do Reino de Deus, aqui e agora, na perspectiva do Reino Definitivo.
Luziânia, GO, 08 de outubro de 2011.

Missionárias no Cimi















(Fotos: Altevir)