Despejo de comunidade Terena

Egon Heck, nosso reporter do front do MS, nos relata o despejo da comunidade Terena "Futuro das Crianças", do dia 17 de maio 2010. Estávamos nós, o pessoal do Cimi do regional MS, em encontro regional. De repente Rogério, nosso assessor jurídico, recebe chamada da aldeia Terena "Futuro das Crianças", Terra Indígena Cachoeirinha. A polícia está indo para aí. Inquietação geral. Continuam os telefonemas. "Já chegaram. São muitos. Viaturas, ônibus, cães, armas, escudos... Estamos reunidos, não vamos sair", avisam os índios. A essa altura a reunião já tinha ido às cucuias. Os telefonemas da área foram se multiplicando. "Estamos dialogando. Começou o confronto. Estão atirando contra nossa gente. Estão atirando bombas, um cheiro horrível!" "Molhem as camisas e coloquem sobre a boca e o nariz", sugere nosso assessor, a essa altura mais que jurídico. "Tem gente ferida. Estão avançando sobre as casas". "Calma", sugeríamos aqui do outro lado. "Estamos recuando, não queremos mortes, feridos... Só nos resta recuar". Alívio tenso. Momentâneo. "O que poderá ainda acontecer? Estão derrubando as casas. Estão destruindo nossa plantação". A força bruta (e põem bruta nisso!) da prepotência das armas e do poder pucinelli, impuseram a desocupação. Muitas lágrimas foram derramadas. Mas o povo Terena não foi derrotado. No dia seguinte, reunidos na aldeia Mãe Terra, relembram o que parece ter sido apenas um pesadelo. Mais lágrimas. Desta vez também partilhadas pela dúzia de membros do Cimi que lá fomos levar apoio e solidariedade. Comida, lona, mas principalmente nossa irrestrita solidariedade na luta pela terra, vida e dignidade de uma comunidade, que continua. O futuro será das crianças, da terra a semente regada com lágrimas, fará florescer a mesma terra donde acabaram de ser expulsos.

A Bandeira do Divino


Os devotos do Divino vão abrir sua morada
p´ra bandeira do menino ser bem-vinda, ser louvada.

Deus nos salve esse devoto pela esmola em vosso nome
dando água a quem tem sede, dando pão a quem tem fome.

A bandeira acredita que a semente seja tanta,
que essa mesa seja farta, que essa casa seja santa.

Que o perdão seja sagrado que a fé seja infinita,
que o homem seja livre, que a justiça sobreviva.

Assim como os três reis magos que seguiram a estrela guia,
a Bandeira segue em frente atrás de melhores dias.

No estandarte vai escrito que ele voltará de novo,
que o rei será bendito - ele nascerá do povo.
(V. Martins/I. Lins)

Sejamos testemunhas vivas de esperança pascal neste mundo de egoísmo

No domingo, 16 de maio, em passagem por Goiânia, dom Pedro Casaldáliga brindou velhos amigos com um encontro de vida e esperança. Uma celebração eucarística foi realizada, simples e verdadeira. Dom Pedro começou a homilia com palavras de esperança ressaltando: "A esperança está nos detalhes, nos pequenos detalhes... porque a vida é feita de detalhes e a morte é o último deles". Cada pessoa presente relatou, de modo simples, o que é a esperança e de que modo ela surge na sociedade. Em meio às lutas dos povos indígenas, nas caminhadas dos movimentos, no trabalho de cada um. Para Pedro, a esperança deve ser feita de fé e prática, e não deve ser apenas o ato de esperar. "Sejamos testemunhas vivas de esperança pascal neste mundo de egoísmo", pediu aos amigos. Para cada um que visitou figura tão importante das lutas sociais - um verdadeiro exemplo de coerência de vida - escutar as palavras de dom Pedro foi um verdadeiro sopro do Espírito Santo.

A questão da terra e a Igreja Católica no Brasil

Para as centenas de povos indígenas que ocupavam a Pindorama, a terra das Palmeiras, seja a terra, sejam as águas vindas da terra por fontes, mares e rios ou caídas do céu por chuvas e orvalho, sejam as matas ou sementes, plantas e tubérculos, sejam os animais e pássaros estavam carregados de um sentido sagrado: escondiam e revelavam o mistério da divindade. A terra era sagrada, fonte de vida e alimentação, lugar de comunhão com as forças da natureza e por último com o próprio criador, pai e mãe de todas as coisas e também dos humanos. Abrigava também os espíritos maus que traziam doenças e a morte. Se não tinham senso de propriedade privada, pela forma familiar e comunitária de vida e trabalho, demarcavam e defendiam e seu território de caça, pesca, coleta ou plantio, como garantia de sobrevivência da tribo.
Hospede convidado ao blog: José Oscar Beozzo

A memória não prescreve: na PUC-SP, lideranças Guarani Kaiowá denunciam violência (assista: "Terra negada violencia ampliada")

No dia 7 de maio 2010, representantes Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul estiveram na PUC-SP para denunciar a violência contra seu povo e pedir apoio. Com os incentivos ao agronegócio, a violência no Mato Grosso do Sul aumenta a cada dia. Em 2006 foram mortos 28 indígenas naquele Estado, em 2007, 53 indígenas, e em 2008 42 pessoas. A Reserva Indígena de Dourados, MS, por exemplo, melhor seria chamada de “Confinamento Indígena”: em 3 mil hectares de terra foram confinados 18 mil indígenas. Os espaços ínfimos de terras habitadas pelos índios contrastam com as terras disponibilizadas para o plantio da cana-de-açúcar. Uma usina de açúcar ocupa, no mínimo, uma área de 30 mil hectares. Na safra 2008/9, a ETH Bioenergia, braço energético do Grupo Odebrecht, produziu 200 milhões de litros de etanol e 130 mil toneladas de açúcar. Em 2009, a ETH inaugurou três usinas, nos estados de São Paulo, Goiás e Mato Grosso do Sul. A meta da ETH é produzir 470 milhões de litros de etanol e 160 mil toneladas de açúcar na safra 2009/10. “Nossa aposta é que o Centro-Oeste (GO, MT, MS) será a região de vocação natural para a expansão da cana-de-açúcar”, declarou José Carlos Grubisich, presidente da ETH Bioenergia. A expansão do agronegócio configura a violência contra os povos indígenas da região.
Na semana em que as lideranças indígenas estiveram em São Paulo, iniciou-se o julgamento dos acusados do assassinato do cacique Marcos Verón (72), que ocorreu em janeiro de 2003, em Juti, MS. Por não haver isenção nos julgamentos envolvendo indígenas naquele estado, o Ministério Público Federal pediu que o processo fosse julgado na capital paulista. No segundo dia, o julgamento foi transferido para o dia 21 de fevereiro 2011, confirmando o dito de uma das advogadas dos Guarani Kaiowá: “Se os índios são réus, os processos andam com certa rapidez, se os índios são vítimas, os processos são engavetados ou prescrevem pela morosidade da justiça”.
Valdelice Veron, filha do cacique assassinado, perguntou a plateia num depoimento comovente naquela noite no pátio do Museu da Cultura da PUC-SP: “Que história vou contar para meus filhos? Meu bisavô e meu avô foram assassinados pela “Matte Laranjeira”, meu pai foi assassinado pelos jagunços do latifúndio. Rolindo e Genivaldo, meus colegas professores, foram assassinados este ano. Tudo permanece impune até a prescrição do processo. Isso não é normal. Meu coração sangra muito. Pra quem a gente vai clamar? De nós esperam que deixemos de ser índios. Mas nós não vamos deixar de ser índios. Onde um cai, outro se levanta!”
Autor: Paulo Suess, presente no dia 07.10.2010 na PUC-SP