Luiz Fernando Lisboa: Enviado para evangelizar os pobres e para ser evangelizado pelos pobres

 
Luiz Fernando Lisboa, entre 1999 e 2000, foi nosso aluno no pós da Missiologia de São Paulo.
Ontem, dia 24 de agosto, no sétimo aniversário da morte e ressurreição de Dom Luciano Mendes de Almeida, na catedal Santo Antônio de Osasco/SP, foi ordenado bispo da diocese de Pemba, Moçambique.
 
Dom Luiz Fernando, um dos primeiros bispos da "geração Francisco", escolheu como lema: "Fui enviado para evangelizar os pobres". Vai Luiz, você é nosso melhor presente para África! Deus te abençoe e Nossa Senhora da África te proteja. Somos gratos por sua missão e comovidos por sua escolha. Deus seja louvado.
 
 

Bispos Eméritos, históricos defensores dos povos indígenas, afro-brasileiros e lavradores, escrevem aos Bispos do Brasil

Dom José Maria Pires, arcebispo emérito da Paraíba, Dom Tomás Balduino, bispo emérito de Goiás e Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia, escrevem uma Carta aos Bispos do Brasil.

Eis a carta.

CARTA AOS BISPOS DO BRASIL

15 de agosto de 2013, Festa da Assunção de Nossa Senhora.

Queridos irmãos no episcopado,

Somos três bispos eméritos que, de acordo com o ensinamento do Concílio Vaticano II, apesar de não sermos mais pastores de uma Igreja local, somos sempre participantes do Colégio episcopal, e junto com o Papa, nos sentimos responsáveis pela comunhão universal da Igreja Católica.

Alegrou-nos muito a eleição do Papa Francisco no pastoreio da Igreja, pelas suas mensagens de renovação e conversão, com seus seguidos apelos a uma maior simplicidade evangélica e maior zelo de amor pastoral por toda a Igreja. Tocou-nos também a sua recente visita ao Brasil, particularmente suas palavras aos jovens e aos bispos. Isso até nos trouxe a memória do histórico Pacto das Catacumbas.

Será que nós bispos nos damos conta do que, teologicamente, significa esse novo horizonte eclesial? No Brasil, em uma entrevista, o Papa recordou a famosa máxima medieval: “Ecclesia semper renovanda”.

Por pensar nessa nossa responsabilidade como bispos da Igreja Católica, nos permitimos esse gesto de confiança de lhes escrever essas reflexões, com um pedido fraterno para que desenvolvamos um maior diálogo a respeito.

1. A Teologia do Vaticano II sobre o ministério episcopal


O Decreto Christus Dominus dedica o 2º capítulo à relação entre bispo e Igreja Particular. Cada Diocese é apresentada como “porção do Povo de Deus” (não é mais apenas um território) e afirma que, “em cada Igreja local está e opera verdadeiramente a Igreja de Cristo, una, santa, católica e apostólica” (CD 11), pois toda Igreja local não é apenas um pedaço de Igreja ou filial do Vaticano, mas é verdadeiramente Igreja de Cristo e, assim a designa o Novo Testamento (LG 22). “Cada Igreja local é congregada pelo Espírito Santo, por meio do Evangelho, tem sua consistência própria no serviço da caridade, isto é, na missão de transformar o mundo e testemunhar o Reino de Deus. Essa missão é expressa na Eucaristia e nos sacramentos. Isso é vivido na comunhão com seu pastor, o bispo”.

Essa teologia situa o bispo não acima ou fora de sua Igreja, mas como cristão inserido no rebanho e com um ministério de serviço a seus irmãos. É a partir dessa inserção que cada bispo, local ou emérito, assim como os auxiliares e os que trabalham em funções pastorais sem dioceses,todos, enquanto portadores do dom recebido de Deus na ordenação são membros do Colégio Episcopal e responsáveis pela catolicidade da Igreja.

2. A sinodalidade necessária no século XXI

A organização do papado como estrutura monárquica centralizada foi instituída a partir do pontificado de Gregório VII, em 1078. Durante o 1º milênio do Cristianismo, o primado do bispo de Roma estava organizado de forma mais colegial e a Igreja toda era mais sinodal.

O Concílio Vaticano II orientou a Igreja para a compreensão do episcopado como um ministério colegial. Essa inovação encontrou, durante o Concílio, a oposição de uma minoria inconformada. O assunto, na verdade, não foi suficientemente amarrado. Além disso, o Código de Direito Canônico, de 1983 e os documentos emanados pelo Vaticano, a partir de então, não priorizaram a colegialidade, mas restringiram a sua compreensão e criaram barreiras ao seu exercício. Isso foi em prol da centralização e crescente poder da Cúria romana, em detrimento das Conferências nacionais e continentais e do próprio Sínodo dos bispos, este de caráter apenas consultivo e não deliberativo, sendo que tais organismos detêm, junto com o Bispo de Roma, o supremo e pleno poder em relação à Igreja inteira.

Agora, o Papa Francisco parece desejar restituir às estruturas da Igreja Católica e a cada uma de nossas dioceses uma organização mais sinodal e de comunhão colegiada. Nessa orientação, ele constituiu uma comissão de cardeais de todos os continentes para estudar uma possível reforma da Cúria Romana. Entretanto, para dar passos concretos e eficientes nesse caminho – e que já está acontecendo – ele precisa da nossa participação ativa e consciente. Devemos fazer isso como forma de compreender a própria função de bispos, não como meros conselheiros e auxiliares do papa, que o ajudam à medida que ele pede ou deseja e sim como pastores, encarregados com o papa de zelar pela comunhão universal e o cuidado de todas as Igrejas.

3. O cinquentenário do Concílio

Nesse momento histórico, que coincide também com o cinqüentenário do Concílio Vaticano II, a primeira contribuição que podemos dar à Igreja é assumir nossa missão de pastores que exercem o sacerdócio do Novo Testamento, não como sacerdotes da antiga lei e sim, como profetas. Isso nos obriga colaborar efetivamente com o bispo de Roma, expressando com mais liberdade e autonomia nossa opinião sobre os assuntos que pedem uma revisão pastoral e teológica. Se os bispos de todo o mundo exercessem com mais liberdade e responsabilidade fraternas o dever do diálogo e dessem sua opinião mais livre sobre vários assuntos, certamente, se quebrariam certos tabus e a Igreja conseguiria retomar o diálogo com a humanidade, que o Papa João XXIII iniciou e o Papa Francisco está acenando.

A ocasião, pois, é de assumir o Concílio Vaticano II atualizado, superar de uma vez por todas a tentação de Cristandade, viver dentro de uma Igreja plural e pobre, de opção pelos pobres, uma eclesiologia de participação, de libertação, de diaconia, de profecia, de martírio... Uma Igreja explicitamente ecumênica, de fé e política, de integração da Nossa América, reivindicando os plenos direitos da mulher, superando a respeito os fechamentos advindos de uma eclesiologia equivocada.

Concluído o Concílio, alguns bispos – sendo muitos do Brasil – celebraram o Pacto das Catacumbas de Santa Domitila. Eles foram seguidos por aproximadamente 500 bispos nesse compromisso de radical e profunda conversão pessoal. Foi assim que se inaugurou a recepção corajosa e profética do Concílio.

Hoje, várias pessoas, em diversas partes do mundo, estão pensando num novo Pacto das Catacumbas. Por isso, desejando contribuir com a reflexão eclesial de vocês, enviamos anexo o texto original do Primeiro Pacto.
O clericalismo denunciado pelo Papa Francisco está sequestrando a centralidade do Povo de Deus na compreensão de uma Igreja, cujos membros, pelo batismo, são alçados à dignidade de “sacerdotes, profetas e reis”. O mesmo clericalismo vem excluindo o protagonismo eclesial dos leigos e leigas, fazendo o sacramento da ordem se sobrepor ao sacramento do batismo e à radical igualdade em Cristo de todos os batizados e batizadas.

Além disso, em um contexto de mundo no qual a maioria dos católicos está nos países do sul (América Latina e África), se torna importante dar à Igreja outros rostos além do costumeiro expresso na cultura ocidental. Nos nossos países, é preciso ter a liberdade de desocidentalizar a linguagem da fé e da liturgia latina, não para criarmos uma Igreja diferente, mas para enriquecermos a catolicidade eclesial.

Finalmente, está em jogo o nosso diálogo com o mundo. Está em questão qual a imagem de Deus que damos ao mundo e o testemunhamos pelo nosso modo de ser, pela linguagem de nossas celebrações e pela forma que toma nossa pastoral. Esse ponto é o que deve mais nos preocupar e exigir nossa atenção. Na Bíblia, para o Povo de Israel, “voltar ao primeiro amor”, significava retomar a mística e a espiritualidade do Êxodo.

Para as nossas Igrejas da América Latina, “voltar ao primeiro amor” é retomar a mística do Reino de Deus na caminhada junto com os pobres e a serviço de sua libertação. Em nossas dioceses, as pastorais sociais não podem ser meros apêndices da organização eclesial ou expressões menores do nosso cuidado pastoral. Ao contrário, é o que nos constitui como Igreja, assembleia reunida pelo Espírito para testemunhar que o Reino está vindo e que de fato oramos e desejamos: venha o teu Reino!


Esta hora é, sem dúvida, sobretudo para nós bispos, com urgência, a hora da ação. O Papa Francisco ao dirigir-se aos jovens na Jornada Mundial e ao dar-lhes apoio nas suas mobilizações, assim se expressou: “Quero que a Igreja saia às ruas”. Isso faz eco à entusiástica palavra do apóstolo Paulo aos Romanos: “É hora de despertar, é hora e de vestir as armas da luz” (13,11). Seja essa a nossa mística e nosso mais profundo amor.

Abraços, com fraterna amizade.


Dom José Maria Pires, arcebispo emérito da Paraíba.

Dom Tomás Balduino, bispo emérito de Goiás.

Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito de São Félix do Araguaia.


Quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Lucinda e Adelayde: missão, simplicidade e testemunho


 
*Carlos Alberto dos Santos Dutra
 
“Que tristeza uma noticia dessas no dia dos religiosos” nos lembra o amigo Padre Lauri Vital Bósio. A tragédia ocorrida na tarde de sexta-feira, dia 16 de agosto último, senti a mesma dor e aperto no coração ao saber do fato. Duas religiosas, Lucinda Moretti e Adelayde Furlanetto, que pertenciam a Congregação Irmãs de São José de Chambéry, foram vítima de acidente de trânsito na BR-163, a três quilômetros do perímetro urbano do município de Juti, no sentido Naviraí, em Mato Grosso do Sul.
As irmãs Lucinda, de 71 anos, e Adelayde, de 77 anos, “deixaram marcas na região Sul do Estado no trabalho em favor dos indígenas e na defesa dos pequenos proprietários rurais. Desde a década de 70 em Mato Grosso do Sul, Lucinda foi uma das pioneiras da CPT (Comissão Pastoral da Terra) e idealizadora da Feira da Semente Crioula, em Juti”, nos lembra Lidiane Cober.
 
A perda dessas duas batalhadoras missionárias do Reino de Deus, que deixaram sua terra natal lá no Rio Grande do Sul — Feliz e Garibaldi –, para dedicarem-se, pelo CIMI, na luta em favor dos povos indígena e campesinos, está sendo sentida por toda a comunidade de Glória de Dourados, Fátima do Sul, Caarapó, Juti e Dourados, onde suas ações são por demais conhecidas.
 
Sob a poeira da estrada e lá a vemos, Irmã Adelayde, sempre ativa e zombando da idade – o que dava inveja a muito jovem –, atuando no distrito da Nova Casa Verde, em Nova Andradina, entre os deserdados da sorte. O amigo Vanilton relata que, na ocasião do acidente, elas retornavam de uma aldeia indígena: iam ao sitio de um amigo para pegar fertilizante natural.
 
Quem conhece as estradas que margeiam sitios e chácaras na região de Dourados e sul do Estado, pontilhada de pequenas propriedades de agricultores familiares, acampamentos rurais e aldeias indígenas, sabe que o progresso é veloz e pouco se apercebe dos que estão à sua volta. Os passos lentos e sadios da esperança, que andava de Gol, e lançava à miúde sementes do Reino para um justo amanhã, entretanto não é páreo para velozes caminhonetes Rangers XLS e o frescor da juventude. Conforme apurado pela reportagem do Caarapó News, o veículo foi jogado a mais de 30 metros do local da colisão.
As irmãs eram muito queridas pelas famílias assentadas da reforma agrária, noticia a Imprensa. Elas moravam nesses assentamentos auxiliando as mulheres e as crianças. Viviam de modo humilde, levando o carisma da ordem, espiritualidade e lutando por melhores condições de vida. Na Pastoral da Terra, cita Lilian Donadelli, elas desenvolviam projetos voltados à educação ambiental, de forma participativa, incentivando a conservação de espécies existentes na área do assentamento, além de ensinar a multimistura rica em vitaminas para fortalecer a imunidade das crianças e adultos.
Perdem, assim, os povos indígenas e os sem-terra de Mato Grosso do Sul, as irmãs Lucinda Moretti e Adelayde Furlanetto que foram sepultadas no domingo (18.8.), em Garibaldi-RS, dia em que se comemora o dia das vocações religiosas. Os municípios de Juti e Carapó, hoje, estão de luto, em especial a aldeia indígena Te’ yikue onde a Irmã Lucinda prestava seu abnegado trabalho pastoral.
O Mosteiro de São José de Garibaldi haverá de dobrar os sinos de lamento e glória, pela partida dessas duas missionárias que deixaram sua terra, e hoje, temos certeza, se encontram na terra definitiva de Ñhanderú, ao lado da Assunta Virgem Maria.

“No entanto, ela se move” (Galileu Galilei)


“Fora da Igreja não há salvação” - Será?

Sobre continuidade e descontinuidade
na interpretação da fé
 
 
 
 
Paulo Suess

        Desde os primeiros séculos do cristianismo até hoje, a afirmação “Fora da Igreja não há salvação” passou por várias interpretações autorizadas pela própria Igreja. Quero mostrar a evolução hermenêutica dessa afirmação com três exemplos: Francisco Xavier, o concílio Vaticano II e a Declaração Dominus Iesus sobre a unicidade e universalidade salvífica de Jesus Cristo e da Igreja, da Congregação para a Doutrina da Fé, de 2000, que segue o Catecismo da Igreja Católica, de 1992.
 
        1. Francisco Xavier (1506-1552)
 
        Em 1927, Francisco Xavier, junto com Teresinha de Jesus, foi declarado padroeiro das missões católicas. Sua interpretação do “fora da Igreja não há salvação” valeu, praticamente, até o concílio Vaticano II. Entre a chegada de Francisco em Goa (Índia), 6 de maio de 1542, e a sua morte, em Sancião, na porta da China, no dia 3 de dezembro de 1552, passaram-se apenas 10 anos. Ele veio do contexto da expansão ibérica, porém sem possibilidade de impor seu Evangelho, como era costume nos territórios do Padroado. O único caminho aberto para a missão era o convencimento do outro. Os neófitos do Japão perguntavam repetidas vezes ao missionário: “Onde estão nossos pais e parentes falecidos?” A resposta o próprio Francisco nos transmite numa Carta que mandou de Cochin, no dia 29 de janeiro de 1552, a seus companheiros na Europa: “Uma desconsolação têm os cristãos do Japão; é que sentem em grande maneira dizermos que os que vão ao inferno não têm nenhum remédio. Sentem isso por amor a seus pais e mães, mulheres, filhos e aos outros mortos passados, tendo deles piedade. Muitos choram os mortos e me perguntam se podem ter algum remédio por via de esmolas e orações. Eu lhes digo que nenhum remédio têm”.
 
 
        Para compreender esta afirmação, vale lembrar a Bula Cantate Domino, do Concilium Florentinum, de 1442, que norteou a doutrina missionária da época. Esse Concílio “acredita, confessa e anuncia firmemente, que ninguém que existe fora da Igreja Católica, nem pagãos, judeus, heréticos ou schismáticos participará da vida eterna, mas que irão para o fogo eterno `que é preparado para o diabo e seus anjos´ (Mt 25,41)”. Uma boa nova que não incluía os antepassados, para a grande maioria dos japoneses, era inaceitável, na verdade era uma má notícia.
 
        2. O Vaticano II (1962-1965)
 
        Até a primeira metade o século XX, Francisco Xavier e praticamente todos os missionários e missionárias eram obrigados, em nome da Igreja, a negar a possibilidade de salvação para os não cristãos. Nessa matéria, o Vaticano II trouxe mudanças substanciais, que a seguir procuro sintetizar:
        a) “O Salvador quer que todos os homens se salvem” (LG 16; cf. 1Tim 2,4). Segundo o plano de salvação, a vida eterna é para todos.
        b) “Os que ainda não receberam o Evangelho se ordenam por diversos modos ao Povo de Deus” (LG 16).
        c) “O plano da salvação abrange também aqueles que reconhecem o Criador” (LG 16), muitas vezes, em religiões não-cristãs que “refletem lampejos daquela Verdade que ilumina todos os homens” (NA 2b). De ninguém, que procura “o Deus desconhecido em sombras e imagens, Deus está longe” (LG 16a).
        d) Os cristãos, diz a Gaudium et spes, não são exclusivamente associados ao mistério pascal e à esperança da ressurreição: “Isto vale não somente para os cristãos, mas também para todos os homens de boa vontade em cujos corações a graça opera de modo invisível. [...] Devemos admitir que o Espírito Santo oferece a todos a possibilidade de se associarem, de modo conhecido por Deus, a este mistério pascal” (GS 22).
        e) Todos “que sem culpa ignoram o Evangelho de Cristo e Sua Igreja, mas buscam a Deus com coração sincero e tentam, sob o influxo da graça, cumprir por obras a Sua vontade conhecida através do ditame da consciência, podem conseguir a salvação eterna” (LG 16). “Deus pode por caminhos d´Ele conhecidos levar à fé os homens que sem culpa própria ignoram o Evangelho” (AG 7a).
 
        f) A liberdade religiosa é um direito da pessoa humana e um pressuposto da missão. “Em assuntos religiosos ninguém seja obrigado a agir contra a própria consciência, nem se impeça de agir de acordo com ela” (DH 2a).
        Ao afirmar o monopólio salvífico como barreira excludente da salvação, como historicamente aconteceu, a Igreja errou no campo próprio, não no campo científico, como no caso de Galileu. Confundiu o princípio da salvação universal em Jesus Cristo com a mediação universal dessa salvação pela ação missionária da Igreja Católica.
 
        3. Declaração Dominus Iesus (2000)
 
        A Declaração DI procura construir uma continuidade entre a doutrina pré-conciliar e pós-conciliar. O que para o Concílio parecia óbvio, depois provocou questionamentos como este: O que antes do Concílio era considerado “verdade”, depois não pode ser declarado como “erro”. Já o “Catecismo da Igreja Católica”, de 1992, procurou superar esse impasse: Formulada positivamente, fora da Igreja não há salvação “significa que toda salvação vem de Cristo-Cabeça através da Igreja que é o seu Corpo” (CIC n. 846). Nesta perspectiva, a Declaração Dominus Iesus pode ser compreendida como síntese dessa questão: “A graça salvífica de Deus, dada sempre por Cristo, no Espírito, e em relação misteriosa com a Igreja, atinge os não cristãos” (DI n. 21). Como acontece isso? Por caminhos só por Deus conhecidos (cf. AG 7).
 

        Resumindo podemos dizer: Ninguém é excluído da salvação por não nascer como católico; a Igreja é misteriosamente mediadora da graça salvífica. Essa mediação é um mistério e não passa, necessariamente, pelos missionários ou pela conversão ao catolicismo. A real possibilidade da salvação em Cristo sem conhecimento do Evangelho e a necessidade da Igreja (dos sacramentos, da evangelização explícita) para essa salvação não se excluem (cf. Redemptoris missio 9, Dominus Iesus 20b). Por isso era possível que o papa João Paulo II (e mais tarde também o papa Bento XVI) se reuniu com representantes das Igrejas Cristãs, Comunidades Eclesiais e Religiões mundiais, no dia 27 de outubro de 1986, em Assis, não rezando pela conversão dos líderes religiosos das outras denominações, mas todos juntos rezaram pela paz mundial.

“No entanto, ela se move” (Galileu Galilei).
 

Fim do Ramadã - em Gaza, no Egito, no Líbano a luta continua

 Saud Abu Ramadán
[Agência Efe]
 
Faixa de Gaza - Terceiro dia do Ramadã
Gaza, 8 ago (EFE).- Os palestinos da Faixa de Gaza celebram nesta quinta-feira o primeiro dos três dias do Eid ul-Fitr, festa que marca o fim do jejum do Ramadã, em um crescente isolamento motivado pela mudança de regime no Egito e pela destruição de 80% dos túneis que abasteciam a região a partir do Sinai.
 
A dura rotina da Faixa de Gaza, onde vivem 1,5 milhão de palestinos, a maioria em condições de pobreza, fica mais animada durante festas como a Publicidade que começou nesta quinta-feira em quase todo o mundo muçulmano, e que encerra o mês de jejum do Ramadã.
Fim do Ramadã em Gaza
"Nós, vendedores de Gaza, experimentamos uma severa queda nos negócios ao longo do ano. Esperamos a grande temporada do Eid, ou o início do ano letivo, para compensar nossas perdas", disse Ahmed Helmi, comerciante de uma loja de acessórios femininos do centro da capital Gaza.
 
De acordo com estatísticas internacionais e palestinas, a pobreza supera 60% e o desemprego chegou a 35%.
 
 Apesar da situação econômica difícil que a grande maioria dos palestinos enfrenta, o coração de Gaza ficou cheio de gente nos últimos dias e a rotina foi interrompida pelos engarrafamentos e pela presença massiva de homens, mulheres e crianças com sacolas de presentes.
Os economistas atribuem a grave situação econômica, por um lado, aos efeitos do bloqueio israelense, que impede a entrada de trabalhadores no território por motivos de segurança e por outro, da divisão interna entre os próprios palestinos, com um governo em Gaza e outro na Cisjordânia, o que dificulta um desenvolvimento sustentável.
A queda do presidente islamita do Egito, Mohammed Mursi, e a campanha militar no Sinai contra extremistas islâmicos também isolaram ainda mais a região.
 
Um relatório do exército egípcio apontava ontem que, durante o mês de julho, suas forças destruíram 102 túneis e 40 depósitos com 2,7 milhões de litros de combustível de contrabando para a faixa palestina.
Os túneis eram uma das vias de abastecimento da faixa frente ao bloqueio israelense, que impede a livre entrada de materiais de uso civil e militar.
"A maior parte dos túneis foi destruída nas duas ofensivas israelenses em Gaza, em 2009 e 2012 e, mais recentemente, pelo exército egípcio, em particular após a queda de Mursi", afirmou Omer Shaban, economista de um centro de análise estratégica com sede na faixa.
O movimento islamita informa em comunicado que o fim da passagem de Rafah, na fronteira com o Egito, e a destruição dos túneis na região, ajudam "a ocupação israelense a reforçar o bloqueio e a destruir a economia", e diz que "a faixa em breve enfrentará uma verdadeira crise humanitária".

O esgotamento do modelo energético mundial


 

de José Goldenberg

 
Há uma forte analogia entre a inquietação da sociedade que se manifesta hoje nas ruas das cidades brasileiras, na Turquia e em outros países com o que está acontecendo na área de energia.
 
Característica geral dessas manifestações é o inconformismo com a estagnação do progresso, a indignação com a transformação da política em balcão de negócios e vantagens pessoais e a ausência do otimismo que galvaniza as pessoas em tomo dos seus governos. Problemas análogos ocorrem há anos no setor de energia baseado no uso de combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás), que permitiram um desenvolvimento técnico e econômico sem precedentes na História da humanidade, mas, após mais de um século de grandes avanços, dá claramente sinais de exaustão.
 
As razões para tal são basicamente as seguintes:
 • O esgotamento progressivo dos combustíveis fósseis. Exemplo desse fato é o que está acontecendo com os poços petrolíferos da Bacia de Campos depois de 25 anos de produção. Essa é uma característica geral da exploração do petróleo e do gás natural em todos os países produtores, com a exceção dos do Oriente Médio.
• As reservas excepcionais de petróleo e gás dessa região aumentaram a dependência mundial das exportações da Arábia Saudita, do Iraque, do Irã e outros, criando graves problemas geopolíticos que têm dado origem a instabilidades políticas e até guerras.
• A poluição ambiental que tem origem no uso dos combustíveis fósseis e sufoca as grandes cidades da China, do México e outras. Não se trata apenas de poluição local, mas também da emissão de gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento global. Esse é um problema que afeta a todos, mesmo fora dos locais e das cidades onde se origina.
Diversos governos tem procurado, ativamente, soluções novas que lhes permitam enfrentar essas questões.
 Os Estados Unidos estão atacando os problemas de duas maneiras. A primeira delas é a busca frenética por gás de xisto para produzir mais energia, apesar das inquietações a respeito de que o sucesso dessa tecnologia não seja uma solução duradoura. Tanto é assim que outros países – como a França, por exemplo – não estão apostando nessa opção. Por outro lado, o presidente Barack Obama decidiu enfrentar a oposição republicana no Congresso e poderosos grupos econômicos e está tomando medidas administrativas para reduzir as emissões resultantes da queima de combustíveis fósseis, principalmente do carvão mineral.
Na Europa é a adoção de metas – e um calendário para cumpri-las – de redução das emissões de gases-estufa, quer por meio de maior eficiência no uso de energia ou no uso de energias renováveis, que tem sido amplamente beneficiado por instrumentos fiscais.
Na China é um amplo programa de redução da poluição, que deve ser incorporado no próximo plano quinquenal. O problema nesse pais é que a maior parte da eletricidade é gerada em usinas termoelétricas que queimam carvão de baixa qualidade. Ao melhorar a eficiência dessas usinas ou optar por gerar eletricidade com energias renováveis, pode resolver dois problemas: o da poluição local, que é muito sério na China, e o da poluição global.
 E o que está fazendo o governo brasileiro para enfrentar esses problemas?
Ação mais visível do governo federal ocorre no setor de petróleo, com a exploração do pré-sal, no qual o governo está jogando todas as suas fichas, apesar dos enormes desafios técnicos e econômicos envolvidos. Pior ainda, desperdiçou cinco anos sem a realização de leilões que poderiam atrair sócios estrangeiros que dividiriam os investimentos e os riscos com os quais a Petrobras não consegue arcar sozinha.
No setor de eletricidade, o sistema adotado de leilões – baseado numa duvidosa teoria de “modicidade tarifária” – pode ser atraente como diretriz política para conseguir popularidade e votos, mas não é racional. Diferentes formas de energia têm custos e características diferentes e devem ser tratadas de maneira distinta. Se isso fosse feito corretamente, milhões de quilowatts de energia elétrica estariam sendo produzidos usando bagaço das usinas de açúcar e álcool. Como isso não foi feito, a eletricidade passou a ser gerada usando gás e carvão, com custos elevados que, na prática, tomam inviável a tentativa de baratear o custo da energia elétrica. Este verdadeiro “tiro no pé” acabou por, praticamente, inviabilizar também a Eletrobrás, cujas ações despencaram em queda livre. Além disso, o gerenciamento dos parques de geração eólica demonstraram falhas, bem como a construção de usinas hidrelétricas sem reservatórios.
O governo cogita agora de estimular o uso do carvão em usinas termoelétricas – na contramão do que estão fazendo a China e os Estados Unidos – e até energia nuclear!
O fato de os Estados Unidos e a China – que juntos emitem mais de 50% dos gases poluentes – decidirem unilateralmente adotar medidas para reduzir tais emissões prenuncia um acordo entre eles, que vai deixar o Brasil isolado na sua política climática, a qual tem sido sempre a de se recusar a tomar medidas sérias nessa área, usando o argumento de que elas impediriam o crescimento econômico do País.
Exceto pela redução do desmatamento na Amazônia, a política climática brasileira está paralisada. Até mesmo a liderança que o Estado de São Paulo assumiu nessa área está encontrando resistências da indústria, que assim adia mais ainda a sua modernização e o aumento da produtividade, essenciais para competir no mercado internacional.
Antes que seja tarde seria bom que se ouvisse, nessas questões, a voz de técnicos independentes, que neste caso representa a “voz das ruas”, para evitar repetir o que está acontecendo em outras áreas.
 [fonte: O Estado de S.Paulo, 15.07.2013]

Indígenas de Tocantins entregam carta ao papa Francisco


Á  Vossa Santidade o Papa Francisco


Adriano Karajá entrega carta ao Papa Francisco
Nós lideranças indígenas do estado do Tocantins, estamos muito felizes que o senhor esteja aqui no Brasil na JMJ.  Confiamos que sua visita será para o Brasil luz e esperança nesta atual conjuntura.

Em nome de todos os 305 povos indígenas do Brasil reconhecidos oficialmente, mas também, dos povos livres que ainda se encontram nas florestas, nós jovens indígenas do Tocantins que viemos a JMJ o cumprimentamos com respeito, admiração e carinho.

Sabemos que o senhor é a liderança maior da Igreja  Católica, soubemos de todo o processo de sua eleição e acreditamos que Deus o chamou para uma importante tarefa, de forma especial com os pobres e excluídos. Não é a toa que o senhor escolheu para chamar-se “Francisco”, o irmão dos pobres e da natureza.

Motivados e animados por esta simplicidade e seu compromisso com os pobres e excluídos, viemos até o senhor, para pedir-lhe que interceda pelos povos indígenas ante o governo brasileiro. Sua Santidade deve já conhecer a situação que se vive no Brasil, principalmente pelos últimos acontecimentos destes dois últimos meses, todo como consequência das políticas governamentais que só servem ao grande capital e as grandes empresas e esquece o essencial: a vida, a justiça e a dignidade da população.

Nós pedimos  a sua Santidade, como liderança maior que peça ao governo brasileiro que pare todos os ataques e violências que vem fazendo contra nosso povo indígena. Nós povos indígenas só existimos com a Terra que é nossa Mãe, com o rio que é nosso Pai, sempre vivemos em harmonia com a natureza, sem terra somos como uma árvore sem raiz. Por isto, viemos pedir que  peça urgentemente ao governo da presidente Dilma Rousseff, que pare com o massacre contra nossos parentes, principalmente com o povo indígena Guarani Kaiowá do Mato Grosso do Sul, que sofre por ter sido expulsado de sua terra que atualmente está em mãos dos fazendeiros. Eles matam, criminalizam e acusam de bandidos e invasores aos povos indígenas. Tal é o caso do povo Terena no estado do Mato Groso do Sul e do povo Munduruku no estado do Pará, assim como, em outros povos, que por defender sua terra lideranças tem sido assassinadas covardemente.

Todos os conflitos se dão pelo direito  á terra. E esse conflito o tem provocado e fomentado o governo brasileiro com sua política indigenista que prioriza a exploração e roubo de nossos territórios, transformando-o em mercadoria. Por isto, nossas terras são cobiçadas por grandes empresas que querem explorar sem piedade as riquezas de nossas matas. Nossa Terra é sagrada, é dom de Deus que deu aos nossos antepassados e nós não vamos deixar que nenhum governo, nem empresa tire de nós o que é nosso: a Terra.

Os nossos territórios estão constantemente ameaçados pelos grandes projetos, como estradas, hidrelétricas, hidrovias, ferrovias e o agronegócio. Estes projetos são projetos de morte para nossa Mãe Terra e para nós povos indígenas. Por isto viemos pedir ao senhor, o amigo e defensor dos pobres, que  peça ao governo brasileiro que pare com todos os esses projetos genocidas, como são a Portaria 303 da AGU, as Propostas de Emenda á Constituição (PEC) 038, 215 e 237, assim como também o Projeto de Lei (PL) 1610 sobre a mineração.

Todos eles são propostas  para reduzir, manipular e acabar com  os direitos indígenas garantidos na Constituição Federal de 1988. Estas propostas colocam as terras indígenas á mercê da exploração desenfreada, que só quer destruir e matar, sem respeitar a nossa cultura, tradição e espiritualidade.

Peça ao governo brasileiro também que cuide com carinho e atenção dos povos indígenas, principalmente no tocante a saúde, pois muitas de nossas criancinhas, jovens e anciões tem morrido por falta de atendimento básico. Pedimos que interceda por nós para que o governo escute o clamor dos povos indígenas, dialogue com respeito e respeite as nossas decisões, no tocante a nossos territórios. Que respeite a Convenção 169 da OIT, e aceite a consulta, livre, previa e informada.

Nós só queremos nossa terra, viver em paz e criar nossos filhos e netos na terra que Deus nos deu. Queremos fazer nossas roças, pescar, cantar e dançar, fazer   nossos rituais e viver tranquilos, é só isso que queremos, o seja, queremos nosso Bem Viver, que significa viver bem com a natureza e com as pessoas. Não queremos que nossos jovens continuem suicidando-se por falta de seu território e por não ter que oferecer aos seus filhos.

Queremos dizer ao senhor que agradecemos a solidariedade da Igreja Católica do Brasil á nossa luta e defesa de nossos direitos  e o compromisso á causa indígena.

Papa Francisco, agradecemos que você não desistiu de vir ao Brasil neste momento difícil,  que não tem medo de ficar com os pobres, que significa para nós ficar ao lado dos povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas, camponeses e excluídos da sociedade e defende-los dos grandes e poderosos.

Já por último, queremos convidá-lo para que visite um dia nossa aldeia e veja a riqueza de nossa cultura e a força de nossa espiritualidade e contemple a beleza de nossa Mãe  Terra.

Que Deus o ajude a defender a vida dos, mas pequenos e que nos ajude a todos a construir a Terra sem Males.

Atenciosamente, Jovens indígenas do Tocantins- Brasil.
[27.7.2013]