Apelo ao bom senso: Padres austríacos propõem e praticam reformas

Salvação sem privilégios - suprema lei

Párocos, vigários, diáconos, a maior parte com idade avançada, alguns aposentados, mas não menos determinados "a mover as águas" dentro da Igreja Católica. No total, 337 membros do clero austríaco defendem um "convite à desobediência". O apelo é promovido por uma associação de padres diocesanos, para os quais "a recusa de Roma de realizar reformas tão esperadas e a inércia dos bispos não apenas permite, mas também exige que se siga a própria consciência e se aja em consequência".

[Publicamos aqui o Apelo à Desobediência da Iniciativa dos Párocos Austríacos. O texto foi publicado na página da iniciativa, www.pfarrer-initiative.at, 19-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.]

 Eis o texto do “Manifesto de Párocos Austríacos”:

 A recusa de Roma a uma reforma da Igreja há muito esperada e a inatividade dos nossos bispos não só nos permitem, mas também nos obrigam a seguir a nossa consciência e a agir de forma independente.
Nós, padres, queremos estabelecer, no futuro, os seguintes sinais:

 1. Rezaremos, no futuro, em todas as Missas, uma oração pela reforma da Igreja. Levaremos a sério a palavra da Bíblia: pedi e receberei. Diante de Deus, existe a liberdade de expressão.

2. Não recusaremos, em princípio, a Eucaristia aos fiéis de boa vontade. Isso é especialmente verdadeiro aos divorciados de segunda união, aos membros de outras Igrejas cristãs e, em alguns casos, também aos católicos que abandonaram a Igreja.

3. Evitaremos celebrar, se possível, nos domingos e dias de festa, mais de uma Missa ou de encarregar padres em viagem ou não residentes. É melhor uma liturgia da Palavra organizada localmente do que turnês litúrgicas.

4. No futuro, vamos considerar uma liturgia da Palavra com distribuição da comunhão como uma "Eucaristia sem padre", e assim nós a chamaremos. Dessa forma, cumpriremos a nossa obrigação dominical em tempos de escassez de padres.

5. Rejeitaremos também a proibição da pregar estabelecida para leigos competentes e qualificados e para professoras de religião. Especialmente em tempos difíceis, é necessário anunciar a Palavra de Deus.

6. Comprometer-nos-emos a que cada paróquia tenha o seu próprio superior: homem ou mulher, casado ou solteiro, de tempo integral ou parcial. Isso, no entanto, não por meio das fusões de paróquias, mas sim mediante um novo modelo de padre.

7. Por isso, vamos aproveitar todas as oportunidades para nos manifestar publicamente em favor da ordenação de mulheres e e de pessoas casadas. Vemo-los como colegas, e colegas bem-vindos, ao serviço pastoral.

Além disso, sentimo-nos solidários com aqueles colegas que, por causa do seu casamento, não podem mais exercer as suas funções, mas também com aqueles que, apesar de um relacionamento, continuam prestando seu serviço como padres.

Ambos os grupos, com sua decisão, seguem a sua consciência – como nós fazemos com o nosso protesto. Nós os vemos, assim como o papa e os bispos, como "nossos irmãos". Não sabemos o que mais deve ser um "coirmão". Um é o nosso Mestre – mas somos todos irmãos. "E irmãs" – se deveria dizer, no entanto, entre os cristãs e cristãos.

É por isso que queremos nos levantar, é isso que queremos que aconteça, é por isso que queremos rezar. Amém.

Domingo da Trindade, 19 de junho de 2011

As comunidades têm um direito à Eucaristia
Publicado no dia 19 de junho, por ocasião da Festa da Santíssima Trindade, o "protesto" proveniente da base da Igreja austríaca, teve depois um vasto eco midiático em todo o país. De acordo com uma pesquisa realizada pelo instituto Ökonsult, mais do que 71% dos austríacos consideram "justa e adequada" a iniciativa promovida pelo Pe. Helmut Schüller, ex-vigário-geral de Viena e diretor da Cáritas Austríaca.

O convite a desobedecer informa em preto e branco que os padres signatários irão dar a comunhão aos divorciados em segunda união e aos membros de outras Igrejas cristãs. Que deixarão leigos competentes pregarem, "incluindo professoras de religião". E que irão aproveitar todas as oportunidades para falar publicamente em favor da ordenação de mulheres e de pessoas casadas.

Há o suficiente para constranger o episcopado austríaco e, em primeiro lugar, o cardeal Christoph Schönborn, do qual o Pe. Schüller foi estreito colaborador. O arcebispo de Viena publicou no dia 7 de julho uma longa resposta ao manifesto na revista da diocese. Dizendo-se "chocado" com o convite dos padres dissidentes, o cardeal austríaco, próximo de Bento XVI, se mostra aberto ao diálogo no "sinal de estima recíproca", mas também avisa: "Aquele que, com uma consciência examinada, tem a convicção de que 'Roma' está em um caminho errado, que contradiz gravemente a vontade de Deus, deveria, ao contrário, tirar a conclusão de que não caminha mais junto à Igreja Católica Romana".

O cardeal Schönborn se recusa a tirar a conclusão da desobediência aberta, latente, nos fatos que ocorrem desde 2006, data da criação da associação desses padres reformadores. Depois de ter recebido no dia 10 de agosto passado, em um café da manhã, os quatro protagonistas da atual rebelião, entre os quais o Pe. Schüller, o arcebispo de Viena irá continuar a discussão no outono [europeu].

Para o cardeal dominicano, o apelo dos padres convida sobretudo a uma maior pedagogia com relação aos 5,5 milhões os católicos que a Igreja Católica conta oficialmente nesse país, em uma população de 8 milhões de habitantes. Ainda ferida pelo caso de Dom Groër – controversa nomeação em Viena desse arcebispo que teve que renunciar no final – e mais recentemente pelo escândalo dos abusos sexuais, a Igreja austríaca registrou no ano passado 80 mil abandonos.

"O cardeal (Schönborn) não pode resolver esse problema sozinho. Todos, bispos, abades, padres, representantes da iniciativa dos padres, devem discutir juntos o problema", afirmou Dom Martin Felhofer, influente abade na Áustria, que não hesitou em evocar o "risco de um cisma" no país. O movimento liderado pelo Pe. Schüller se opõe a "reunificar as paróquias" e promete, no seu manifesto, a solução alternativa das assembleias eucarísticas sem padres e de confiar a direção de cada paróquia a “um homem ou mulher, casado ou não, de tempo integral ou parcial".
[A reportagem é de Sébastien Maillard, publicada no jornal francês
 La Croix,07-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto da Unisinos.]

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