Profecia ontem e hoje:
na luz e na sombra de Montesino
na luz e na sombra de Montesino
Há três maneiras de contar a história: a do marinheiro, do camponês e do pescador. O marinheiro conta viagens que ele realmente fez e as mistura com outras que ele queria ter feito. O marinheiro é o macro-historiador. O pescador transforma a piranha, que ele pescou, em peixe boi que lhe foi roubado por uma onça no caminho para casa. O pescador inventa a história. O camponês conta pequenas histórias da vida cotidiana de casa e trabalho. O camponês é o historiador da micro-história. Na história da América Latina, quando alguém fala da presença profética da Igreja durante a época colonial, geralmente, se trata da história de pescador.
Neste quarto Domingo de Advento comemoramos 500 anos da denúncia profética de Antonio Montesinos. Havia, portanto, na conquista espiritual das Américas também vozes proféticas, como a de Bartolomé de Las Casas, bispo de Chiapas (México) e de Diego de Medellín, terceiro bispo de Santiago de Chile. Vozes proféticas, porém, não devem ser confundidas com uma Igreja profética (cf, Documento de Santo Domingo, n. 4 e 20).
Montesinos fazia parte da comunidade dominicana de Santo Domingo. Sua voz e a de sua comunidade foram logo condenadas pelo poder político e religioso a um “silêncio obsequioso”. Para essa comunidade, a prática missionária de um só ano foi suficiente para perceber que o maior obstáculo para conversão e catequese dos índios não era sua idolatria, mas a injustiça praticada contra eles.
Naquele memorável quarto Domingo de Advento, de 1511, os dominicanos convidaram o governador Diego Colombo, os oficiais do Rei e os juristas letrados para a sua Igrejinha de palha. Frei Antônio Montesinos era seu porta-voz, quando bradava: “Todos estais em pecado mortal e nele viveis e morreis por causa da crueldade e tirania que usais com estas gentes inocentes. Dizei, com que direito e com que justiça tendes em tão cruel e horrível servidão estes índios?” (cf. http://www.missiologia.org.br)
Cenário 2 - 1992
No dia 16.03.1512, o dominicano Montesino foi castigado com um silencia obsequioso, da parte de seu provincial de Madrid, do qual nunca mais se recuperou. Ele e sua comunidade foram definitivamente proibidos de se pronunciar sobre a “horrível servidão dos índios”. E quando se tratou de celebrar uma missa penitencial no Monumento de Antonio Montesino, durante a Conferência de Santo Domingo (1992), a coordenação do evento declarou tal proposta como manobra da esquerda. Os únicos que tiveram a coragem de participar dessa missa penitencial aos pés do monumento de Montesinos foram os bispos Dom Erwin Kräutler e José Maria Pires (parabéns, D. José, pelos seus 70 anos de sacerdócio, no dia 20.12.!) Em condições conspirativas romperam o bloqueio oficial da Conferência de Santo Domingo.
Cenário 3 - 2011
Sinais e ações proféticos marcam resistências contra o sofrimento. Na revolta da “Primavera Árabe”, no “Movimento dos Indignados”, da Espanha, no levante estudantil, do Chile, nos protestos “Ocupe Wall Street”, nos Estados Unidos, na resistência indígena na Bolívia e no Brasil e na indignação militante contra Belo Monte e a transposição do Rio S. Francisco, o cálice do sofrimento transborda. Ramificações desses movimentos de protesto apontam no mundo inteiro para a construção de “outra sociedade”. Cada gesto simbólico ou real de gratuidade profética rompe com a normalidade do sistema. Cada transformação de relações de competição em relações de reciprocidade e solidariedade pode estar na raiz de uma nova sociedade.
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