Não
há fim da história, o mercado não é um deus e os homens e mulheres seguem
lutando para sobreviver e levar a humanidade a um patamar melhor do que o que
está aí.
"Se a crise ambiental global não for
controlada, e o crescimento populacional estabilizado, as perspectivas são
sombrias. Os problemas já são sentidos, como a crescente co"Se a crise ambiental global não for controlada, e o mpetição por
recursos hídricos, a desertificação nas zonas tropicais e subtropicais, e a
necessidade de projetos caros de controle de inundações em regiões costeiras.
Também mudarão o equilíbrio internacional em favor do hemisfério Norte, que tem
largas extensões de terras árticas e subárticas passíveis de serem cultivadas e
industrializadas. [...] A atual crise econômica global vai terminar, mas tenho
dúvidas se terminará em termos sustentáveis para além de algumas décadas.
Politicamente, o mundo vive uma transição desde o fim da Guerra Fria. Se tornou
mais instável e perigoso, especialmente na região entre Marrocos e Índia. Um novo
equilíbrio internacional entre as potências — os EUA, China, a União Européia,
Índia e Brasil — presumivelmente ocorrerá, o que poderá garantir um período de
relativa estabilidade econômica e política, mas isto não é para já. O que não
pode ser previsto é a natureza social e política dos regimes que emergirão
depois da crise. Aqui as experiências do passado não podem ser aplicadas. O
historiador pode falar apenas das circunstâncias herdadas do passado. Como diz
Karl Marx: a humanidade faz a sua própria história. Como a fará e com que
resultados, muitas vezes inesperados, são questões que ultrapassam o poder de
previsão do historiador."
Eric
Hobsbawm (1917-2012)
"A
grande crise econômica que começou em 2008, como uma espécie de equivalente de
direita à queda do Muro de Berlim, trouxe uma compreensão imediata de que o
Estado era essencial para uma economia em dificuldades, do mesmo modo como fora
essencial para o triunfo do neoliberalismo quando os governos lançaram suas
bases por meio de privatizações e desregulações sistemáticas." Com essa
análise, Eric Hobsbawm chega ao final de seu novo livro, "Como Mudar o
Mundo - Marx e o Marxismo, 1840-2011". Não é um guia nem tem as respostas
para a crise. Mas ajuda a pensar. Para o historiador marxista, quem quiser
soluções para o século XXI "deverá fazer as perguntas de Marx, mesmo que
não queira aceitar as respostas dadas por seus vários discípulos".
Marx
foi um autor que acompanhou a vida e a obra do historiador inglês Eric Hobsbawm,
que morreu na manhã desta segunda-feira (1º de outubro 2012), aos 95 anos. O
livro citado acima é uma coletânea de textos que Hobsbawm escreveu sobre o
assunto entre 1956 e 2009, “um estudo sobre a evolução e o impacto póstumo do
pensamento de Karl Marx (e de seu amigo inseparável Friedrich Engels)”, como
ele próprio define. Nesta obra, o historiador defende uma tese central: “Marx é
hoje, mais uma vez, e com toda justiça, um pensador para o século XXI”. Como
uma das melhores formas de homenagear alguém que partiu é manter acesa a
memória das obras de uma vida, cabe falar um pouco sobre essa tese que
sintetiza uma parte importante das preocupações e compromissos desse
historiador extraordinário.
Paradoxalmente,
observou Hobsbawm, quem “redescobriu” Marx foram os capitalistas e não os
socialistas. O ano de 1998 foi emblemático neste processo. Neste ano,
comemorou-se o sesquicentenário do Manifesto Comunista. A data coincidiu,
ironicamente, com o início de uma forte turbulência na economia internacional.
Hobsbawm relata que ficou espantado quando, num almoço mais ou menos na virada
do século, George Soros perguntou o que ele achava de Marx: “Por saber o quanto
nossas ideias eram divergentes, preferi evitar uma discussão e dei uma resposta
ambígua. Esse homem, disse Soros, descobriu uma coisa com relação ao
capitalismo, há 150 anos, em que devemos prestar atenção”.
Alguns
depois, em 2008, o jornal londrino Financial Times estampou em sua manchete: “Capitalismo
em convulsão”. “Não podia mais haver dúvida de que Marx estava de volta aos
refletores. Enquanto o capitalismo mundial estiver passando por sua mais grave
crise desde o começo da década de 1930, será improvável que Marx saia de cena.
Por outro lado, o Marx do século XXI será, com certeza, bem diferente do Marx
do século XX”, advertiu Hobsbwam. Quais seriam essas diferenças?
O
Marx do século XXI
A
resposta a essa pergunta está intimamente ligada ao diagnóstico sobre quais
aspectos da análise de Marx continuam válidos e relevantes. O historiador
inglês destaca dois deles: (i) a análise da dinâmica global do desenvolvimento
econômico capitalista e de sua capacidade de destruir tudo o que se antepuser a
ele; (ii) a análise do mecanismo de crescimento capitalista, por meio da
geração de contradições internas, levando a crises sucessivas e a uma crescente
concentração econômica numa economia cada vez mais globalizada.
E
a força dessas análises reside, em larga medida, no método empregado por Marx,
um método que rejeita a ideia de modelo e procura pensar o mundo como um todo.
Não se trata de um pensamento interdisciplinar no sentido convencional,
assinala Hobsbwam, mas de um pensamento que integra todas as disciplinas,
abordando os fenômenos sociais a partir de distintos pontos de vista:
econômicos, políticos, científicos e filosóficos. “Não podemos prever as
soluções dos problemas com que se defronta o mundo no século XXI, mas, quem
quiser solucioná-los, deverá fazer as perguntas de Marx, mesmo que não queira
aceitar as respostas dadas por seus vários discípulos”, defende o historiador.
Marx
tem, pois, uma lição metodológica que é, de diferentes modos, destacada por
Hobsbawm. No método de Marx, não há lugar para determinismos, dogmas ou modelos
pré-concebidos que possam ser aplicados mecanicamente a qualquer momento
histórico. E esses pressupostos foram assumidos também por Hobsbawm em seu
trabalho como historiador. No final do artigo “Marx e o trabalhismo: o longo
século” (op.cit. pp. 358-375), ele reflete sobre os fracassos do século XX, os
problemas do século XXI, reafirmando sua confiança no método de análise de
Marx:
“Paradoxalmente,
ambos os lados têm interesse em voltar a um importante pensador cuja essência é
a crítica do capitalismo e dos economistas que não perceberam aonde levaria a
globalização capitalista, como ele previra em 1848. Mais uma vez é óbvio que as
operações do sistema econômico devem ser analisadas tanto historicamente, como
uma fase da história, e não como seu fim, quanto de forma realista, isto é, em
termos não de um equilíbrio de mercado ideal, e sim de um mecanismo integrado
que gera crises periódicas capazes de transformar o sistema.” (op.cit. p.375)
Para
Hobsbawm, a crise atual mostra que o “mercado” não tem nenhuma resposta para o
“principal problema com que se defronta o século XXI”: “o fato de que o
crescimento econômico ilimitado e cada vez mais tecnológico, em busca de lucros
insustentáveis, produz riqueza global, mas às custas de um fator de produção
cada vez mais dispensável, o trabalho humano, e, talvez convenha acrescentar,
dos recursos naturais do planeta”. O historiador conclui: “O liberalismo
econômico e o liberalismo político, sozinhos ou combinados, não conseguem
oferecer uma solução para os problemas do século XX. Mais uma vez chegou a hora
de levar Marx a sério”.
por Marco Aurélio
Weissheimer
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