Andrés Torres Queiruga: A Teologia e a Igreja depois do Vaticano II |
Gabriela e Fernando, professores de Teologia na Argentina e no Chile, ex-alunos do curso de pós-graduação em S. Paulo, assistindo a palestra de Queiruga |
9 de novembro: Victor Codina sobre desafios do Vaticano II |
Auditório lotado, com pessoas vindas de diversas partes do continente para debater, em Congresso Continental, os caminhos, perspectivas e desafios da teologia na atualidade, nesse novo contexto da sociedade complexa em que vivemos. Trata-se do Congresso Continental de Teologia que iniciou neste domingo, 07, no Anfiteatro Pe. Werner, da Unisinos. O Congresso traz como tema central os 40 anos da Teologia da Libertação e os 50 anos do Concílio Vaticano II. Um de seus principais desafios é o de construir uma teologia viva.
Desafios da Teologia da
Libertação
Para Geraldina Céspedes, a
Teologia da Libertação tem o desafio de que nós não sejamos apenas consumidores
de teologia, “mas precisamos ser produtores, multiplicadores e multiplicadoras
desta mesma teologia. Nós estamos vivendo uma metamorfose do religioso”, disse.
Para ela, tudo se tornou bem de
consumo, mercadoria. “Nesse sentido, a espiritualidade pode nos adormecer ou
ser contra a cultura. Penso que devemos repensar a espiritualidade libertadora,
e esse é um dos desafios que temos pela frente.” Outro desafio, para ela, é a
diversidade. “O mesmo que ocorre na sociedade acontece nas igrejas e também na
teologia: não saber gerir a diversidade tanto macro quanto micro na vida
cotidiana”, continuou.
Segundo Geraldina, o mundo em
que vivemos não é apenas uma aldeia global, mas uma aldeia plural. “A teologia
precisa saber como situar-se diante da diversidade, como uma possibilidade e
não como ameaça e problema.” E frisou: “A teologia tem que fazer esforços para
que as instituições religiosas tenham práticas críticas, para que saibam fazer
o diálogo religioso”.
Ela acredita que existem quatro
aspectos que nos ajudam a refletir sobre essa mudança radical:
1- Passar da compreensão da
religião e da cultura como práticas paradas, imutáveis, mas como práticas em
constantes mudanças;
2- Revisar a imagem de Deus e
como entendemos a divindade. “Acredito que essa é uma revisão fundamental”;
3- Potencializar a consciência
de alteridade, para conhecer o outro e a outra que são vítimas, vulneráveis. “O
reconhecimento da alteridade como principio teológico nos leva a crescer, em
vez de querer impor a eles a nossa visão e a nossa teologia. Não é apenas
assumir a nossa alteridade, mas o choque desta, porque também podemos nos
sentir escandalizados e sacudidos se vermos outra teologia que não seja a
nossa”, pondera, ao afirmar que não devemos nos prender com o que é nosso,
acreditando que o que temos ou sabemos é o verdadeiro;
4- Recuperação das entranhas
místicas e proféticas, capazes de sustentar nossas lutas e a transformação da
sociedade.
Repensar a teologia
Neste sentido, a professora
pergunta: “Como repensar a teologia e qual sua função na compreensão de outro
mundo possível e de outra teologia possível? Ainda a teologia serve para alguma
coisa? Temos que fazê-la servir para alguma coisa, pois estamos aqui para
isso”.
Às vezes, continua, a vida
cotidiana vai por outro caminho e se não conseguimos fazer com que a teologia
toque em nós, em nossa vida cotidiana, não adianta de nada. “Estamos vivendo
épocas muito complexas e precisamos de muita orientação para não perdermos o
fio. Se nós quisermos continuar avançando, a teologia precisa renovar a sua
identidade, a sua missão, para o que ela serve, sem perder o fio de sua
identidade, de seus compromissos”, pontua.
Para Geraldina, a mudança bate à
nossa porta. E questiona: “Seríamos capazes de abri-la?” Ela avalia que não
podemos passar retos diante dessas transformações. “Devemos acompanhar as
mudanças ou pelo menos não criar obstáculos para elas no fluxo da vida que está
acontecendo.” Para a docente, a teologia precisa provocar e promover a mudança.
“Ela não deve esquecer, além disso, que no tecido há fios vermelhos, fios de
sangue, dos mártires que não podemos esquecer nesses tempos tão complexos. Para
mim, eles são sinais para que não percamos a orientação. Eles nos estimulam e
ajudam que devemos dizer não diante de qualquer sistema de poder que não
permita o florescimento dos seres humanos”, finalizou.
Experiências de Jon Sobrino
“A fé é algo que nos convoca, a
vocês e a mim.” Com esta frase Jon Sobrino continua a Conferência “Um novo
Congresso e um Congresso novo“, na noite de ontem, 07. E continuou: “Teologia
quer dizer que pensamos, acreditamos, estamos convictos de que a direção
estabelecida por Jesus de Nazaré é aquela que humaniza as pessoas”.
Sobrino abordou, durante a
Conferência, sua experiência pessoal, a questão teórica da Teologia da
Libertação e apontou o seguinte questionamento: “O que fazer com o passado, uma
vez que estamos em uma mudança constante?”
De onde ele vem e o que ele
celebra?
No começo de sua fala, Jon
Sobrino aborda sua trajetória de vida pessoal, de onde vem e o que ele de fato
celebra. “Venho de El Salvador. Neste pequeno país, embora tenhamos centro de
teologia, biblioteca etc., há problemáticas que não chegam lá”, disse.
“El salvador tem seis milhões de
habitantes que se relacionam com Deus de maneira bem diversa”, comentou, ao
afirmar que fala tudo isto, aqui, com liberdade. Depois, Sobrino questiona: “O
que celebramos e o que queremos fazer? E, mais importante do que o que
celebramos é o que fazemos quando celebramos? Então, vou contar-lhes a triste
história da minha vida:
De 1966 a 1974, estive em
Frankfurt, na Alemanha, estudando teologia. Tive notícias do Concílio, que
começou em 1962, mas parciais. Ou seja, era ignorante com o que estava
ocorrendo. A partir do livro de Gustavo Gutiérrez e por Medellín, comecei a me
interessar, mas isso apenas em 1974, quando cheguei a El Salvador. Com isso,
quero dizer que, diferentemente de muitos da minha geração, fui um ignorante do
que estava acontecendo e obviamente não fui nenhum apaixonado. Depois, tudo
mudou.”
Impactos
Impactou-me, pensando em
Medellín, Gustavo Gutiérrez e depois em Dom Romero, que a Igreja decidiu se
voltar ao pobre e a Jesus. “Fico, além de medo, meio constrangido com a parte
de minha palestra quando tenho que falar de minha vida pessoal”, admitiu.
“Dos acontecimentos de Medellín,
o que celebro e me deixa contente é que houve profundas mudanças, rupturas.
Pensávamos que era impossível, antes disso não podíamos sequer imaginá-las",
afirma.
“Quando me disseram que existiam
novos paradigmas, falei: acho que vocês têm razão! Ou seja, não tenho nada
contra isso. No entanto, o que não me convence totalmente é que os novos
paradigmas fizeram desaparecer os antigos e as antigas realidades”, continuou.
No passado, segundo Sobrino, ocorreram coisas que são difíceis de entender.
“Mas a generosidade, o amor, a entrega, isso permanece.”
Igreja dos pobres e as
necessidades
Segundo Jon Sobrino, antes de
começar o Concílio, o Papa anunciou a Igreja dos pobres. “
“Todos sentimos que depois do
Concílio faltou alguma coisa. E o que foi? Foi a Igreja dos pobres”, enfatiza.
“A Igreja dos pobres não fez raiz. Ouvi que no Concílio se falou dos pobres.
Mas não foi mencionado quem eram os pobres e nem se a Igreja deveria
compartilhar e defender estes mesmos pobres, coisa que Deus fez no antigo
testamento e que foi dito também em Puebla.”
Mudanças estruturais e novos
paradigmas
Para Sobrino, há mudanças
estruturais e novos paradigmas. "Como disse Romero, ‘a Igreja dos pobres é
uma igreja crucificada’.”
Jon Sobrino se diz alegre em
saber que “nossa Igreja seja perseguida justamente por proteger os pobres”. E
completa: “Para terminar, compreendam uma das coisas que tive o prazer de
ouvir: o monsenhor Romero disse que Deus passou por El salvador, ou seja, a
ideia de que algo bom aconteceu”. Além
disso, segundo Sobrino, Romero frisou: “A glória de Deus é que o pobre viva!
Isso é muito citado, com razão”.
Ainda de acordo com Sobrino, D.
Pedro Casaldáliga, ao se referir ao absoluto, disse: “tudo é relativo, menos
Deus e a fome”. Bento XVI afirmou, no início de seu pontificado, e até hoje,
“cuidado com os relativismos”. E Jon Sobrino termina a Conferência com a
seguinte frase: “O absoluto é Deus, e se há algo que é coabsoluto, esses são os
pobres”.
A
reportagem é de Thamiris Magalhães Foto: Natália Scholz
Cf. a participação de Jon Sobrino:
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