No dia 11 de setembro de 1973, se fechou um ciclo de
longas décadas de luta e auge do movimento popular no Chile. A classe operária,
os camponeses, os intelectuais e as pessoas humildes do Chile foram derrotados.
Os erros próprios e a resistência dos dominadores, nacionais e estrangeiros,
impediram que se materializassem os desejos de Allende: que o poder econômico e
político se distribuísse mais equitativamente em nossa sociedade.
A experiência dos três anos da Unidade Popular e a
figura de Salvador Allende se instalaram de forma indelével na memória coletiva
dos chilenos. Nossos filhos e netos sabem hoje em dia que houve um homem que
encheu de dignidade a nossa pátria, que nos engrandeceu com sua lucidez
política e que nos estremeceu com sua valentia. Os assassinatos, o exílio, a
repressão e o neoliberalismo não poderão apagar de nossa história a vida plena
que alcançaram os desamparados durante os mil dias da Unidade Popular.
Os trabalhadores falaram de igual para igual com os
patrões. Os camponeses puderam semear suas próprias terras. Os estudantes
obtiveram o direito de participar nas universidades. Os músicos cantaram à vida
nova. Esse período de felicidade não será esquecido. Devemos tudo isso a
Salvador Allende.
Também os democratas do mundo inteiro reconhecem em Allende o líder que se propôs a transformar a sociedade chilena por meios pacíficos e com respeito às liberdades públicas. O pequeno país que no extremo do mundo quis construir uma sociedade mais igualitária se conheceu nos lugares mais recônditos da terra, graças à originalidade, consequência e valentia de um verdadeiro democrata e revolucionário. Isso explica em grande parte o isolamento internacional de Pinochet durante a ditadura e depois sua debacle definitiva com a detenção que sofreu em Londres. Só o salva-vidas que lhe deu o governo de Frei Ruiz Tagle lhe permitiu respirar em liberdade alguns anos mais.
Também os democratas do mundo inteiro reconhecem em Allende o líder que se propôs a transformar a sociedade chilena por meios pacíficos e com respeito às liberdades públicas. O pequeno país que no extremo do mundo quis construir uma sociedade mais igualitária se conheceu nos lugares mais recônditos da terra, graças à originalidade, consequência e valentia de um verdadeiro democrata e revolucionário. Isso explica em grande parte o isolamento internacional de Pinochet durante a ditadura e depois sua debacle definitiva com a detenção que sofreu em Londres. Só o salva-vidas que lhe deu o governo de Frei Ruiz Tagle lhe permitiu respirar em liberdade alguns anos mais.
Allende transcendia o pensamento de sua época.
Enquanto a Guerra Fria dividia o mundo e as empresas norte-americanas haviam
espoliado nossas riquezas básicas, o Presidente pode comprometer a toda a
classe política na nacionalização das minas de cobre, mediante uma lei no
Parlamento. Por outro lado, enquanto a revolução cubana levava as juventudes
latino-americanas a adotar a luta armada para transformar as estruturas
oligárquicas, Allende insistia em substituir o capitalismo pelo socialismo sem
violência, mediante o exercício pleno das liberdades democráticas e o respeito
aos direitos humanos. Transformar radicalmente, mas no marco das instituições
vigentes: essa era sua consigna e convicção.
No Pleno Nacional do PS, em 18 de março de 1972,
quando os socialistas endurecem suas posturas, o Presidente Allende chama à
razão. Rejeita os conceitos leninistas ortodoxos sobre o Estado, desdobrando argumentos
teóricos e práticos sobre a via chilena ao socialismo: "Não está na
destruição, na quebra violenta do aparato estatal o caminho que a revolução
chilena tem pela frente. O caminho que o povo chileno abriu, ao longo de várias
gerações de luta, leva nestes momentos a aproveitar as condições criadas por
nossa história para substituir o vigente regime institucional, de fundamento
capitalista, por outro diferente, que se adeque à nova realidade social do
Chile”.
Allende foi perseverante em sua luta pela
transformação e em defesa da democracia. Construir uma nova sociedade em que se
redistribuísse o poder, se multiplicava o pluralismo, as liberdades
individuais, as eleições, mas com os mesmos direitos para todos e na qual os
trabalhadores participassem nas decisões do país. Por isso é que durante o
governo de Salvador Allende a democracia e as liberdades públicas se
potencializaram como nunca antes havia acontecido na história republicana.
Lamentavelmente, as transformações em favor da
igualdade, participação e liberdade que caracterizaram o governo de Allende
terminaram abruptamente. O golpe de 11 de setembro foi realizado com a força
das armas dos militares; mas promovido, organizado e financiado pela direita
política e econômica, assim como por grande parte do Partido Democrata Cristão
e a inevitável Central de Inteligência Americana. O golpe não foi só militar,
mas civil-militar, com um papel destacado dos economistas, sob a tutela
intelectual de Milton Friedman e Arnold Harberger, que elaboraram o programa
econômico de governo de Pinochet, caracterizado pelo mais extremo
neoliberalismo.
Assim as coisas, a partir do golpe, se instauram no
país um sistema político excludente (com a Constituição de 1980) e um modelo
econômico de desigualdades que fizeram retroceder nosso país em muitas décadas.
O aumento do crescimento não pode esconder que durante os últimos quarenta
anos, unos poucos grupos monopolizaram a riqueza que produzem todos os
chilenos. As desigualdades na saúde, na educação e na previdência social se
manifestam diariamente nas filas dos hospitais, na deterioração das escolas, em
universidades que educam na ignorância e em uma imprensa que informa só o que
interessa à classe dominante para sua reprodução. O poder econômico e político
concentrado em uma minoria converteu nosso país em um sistema oligárquico.
Resulta uma comédia que a mesma geração, comprometida
com o processo de transformações que impulsionou Salvador Allende, tenha
aceitado administrar disciplinadamente o modelo econômico e o regime político
instalado pelo governo de Pinochet. Isso revela que a responsabilidade para
assumir as transformações, que demanda a cidadania, se encontra na juventude
atual, a que já abriu o caminho com os protestos de 2011. Allende, o democrata
e o revolucionário, o anunciou em seu discurso de despedida.
[de Roberto Pizarro, Economista e ex-ministro do presidente Eduardo Frei.
Foi reitor da Universidad Academia de Humanismo Cristiano. Tradução: Liborio
Júnior; Carta Maior]
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