A Rua ajudou a Selva
Ruy Sposati
Pressionado por dois meses de
enfrentamento e resistência dos indígenas Munduruku, o governo federal
suspendeu as pesquisas da região do rio Tapajós para a construção de
hidrelétricas. O anúncio foi feito durante reunião em praça pública no final da
tarde deste domingo, 23, em Jacareacanga, extremo oeste do Pará. Os
pesquisadores que estavam em área indígena deixaram a cidade.
“A Funai e o governo federal
como um todo está suspendendo qualquer pesquisa que estiver sendo feita aqui na
região de vocês”, afirmou a assessora da presidência da Fundação Nacional do
Índio Lucia Alberg, apesar do ministro Gilberto Carvalho ter anunciado
publicamente que não suspenderia nem obras, nem estudos.
Pesquisa vinculante, que precede
a construção da hidrelétrica, suspensa
“Estamos nos sentindo muito
felizes”, aponta o chefe dos guerreiros Paygomuyatpu Munduruku. “Ela ainda não
nos deu nenhuma prova disso, estamos esperando uma prova, mas estamos muito
satisfeitos com o que ela disse”. Em maio e junho, os indígenas Munduruku
realizaram um sem número de ações exigindo a suspensão das obras e estudos de
barragens nos rios Tapajós e Teles Pires, onde vivem 13 mil pessoas do povo
Munduruku.
Em maio, depois de uma
assembleia que reuniu mais de 200 mulheres, caciques, lideranças e guerreiros,
os Munduruku marcharam pelas ruas de Jacareacanga e juntaram-se a outros
indígenas da bacia do Tapajós e do médio Xingu. Realizaram duas ocupações que
paralisaram as obras da usina hidrelétrica Belo Monte por 17 dias, viajaram à
capital federal, onde realizaram uma marcha, ocuparam a sede da Funai e fizeram
protestos no Ministério de Minas e Energia e no Palácio do Planalto. Na última
sexta-feira, um grupo de 40 guerreiros expulsou cerca de 25 pesquisadores da
empresa Concremat, prestadora de serviços do Grupo de Estudos Tapajós,
consórcio composto por Camargo Correia, GDF Suez e Eletrobras, entre outros.
Neste contexto, os Munduruku
sofreram um processo de criminalização, difamação e repressão por parte do
governo federal. Notas públicas, declarações à imprensa e processos judiciais
acusavam os indígenas de criminosos e mentirosos, questionando a legitimidade
das lideranças Munduruku, que entraram com interpelação criminal contra
declarações do ministro Gilberto Carvalho.
“Nós liberamos os pesquisadores.
A gente não quer mais vê-los aqui”, explica a liderança Maria Leusa Kabá. “Se
eles voltarem, nós vamos tirar a cabeça dos pesquisadores. Nós somos
guerreiros. Nossos guerreiros antigos são conhecidos por serem cortadores de
cabeças. Nós não esquecemos nosso passado”, remonta Leusa.
“Vamos continuar na nossa luta.
A gente não quer que eles [estudos] sejam suspensos. Nós queremos que os
estudos e as obras sejam cancelados. A suspensão é uma vitória parcial”,
conclui Paygomuyatpu.
Câmara Municipal de Jacareacanga
Cerca de 100 indígenas Munduruku
lotaram a Câmara Municipal de Vereadores de Jacareacanga, extremo oeste do Pará,
nesta segunda-feira, 24, para protestar contra os vereadores que são favoráveis
ao projeto do governo de construir hidrelétricas no rio Tapajós.
A fachada da Câmara foi
grafitada com frases de protesto como "Não queremos barragens",
"viva o Tapajós", "respeitem nosso direito" e "nossa
palavra é que vale".
Repressão no Tapajós |
Dentro do plenário, lideranças
indígenas discursaram acusando vereadores de estarem tentando dividir o povo
Munduruku, espalhando mentiras sobre os acontecimentos."Este é um
movimento popular indígena autônomo. Nossa decisão é a decisão do coletivo, dos
caciques, das lideranças. E a decisão é de que somos contra as barragens que
afetam nosso território”, explicou Valdenir Munduruku aos parlamentares.
“Nossa posição precisa ser
respeitada. Ontem, nesta casa, alguns vereadores criticaram nosso movimento. A
gente veio aqui [na Câmara] pra deixar um recado bem claro: se vocês não podem
nos ajudar, também não atrapalhem", disse.
Para o povo Munduruku, os
parlamentares tem sido usados pelo governo federal e pelos empreendedores para
forçar a viabilização de projetos hidrelétricos em território indígena e
tradicional, mesmo sem ter havido consulta - e mesmo com o posicionamento
público das comunidades contrário ao empreendimento. "Vocês não precisam
vir falar de compensações, vir falar que as hidrelétricas vão trazer saúde e
educação, porque saúde e educação são direitos nossos que não vamos negociar a
troco de hidrelétricas", argumentou a liderança.
[Fonte: sitio do Cimi (23.6.2013)]
A dança dos vencedores
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