Mais de 30% das terras indígenas na Amazônia vão sofrer algum tipo de
impacto com a construção das hidrelétricas previstas para a região. Na avaliação
do procurador Felício Pontes, do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, o
projeto do governo brasileiro, que prevê a instalação de 153 empreendimentos
nos próximos 20 anos, também vai afetar a vida de quase todas as populações
tradicionais amazonenses.
“Aprendemos isso da pior maneira possível”, avaliou Pontes, destacando
o caso de Tucuruí, no Pará. A construção da usina hidrelétrica no município
paraense, em 1984, causou mudanças econômicas e sociais em várias comunidades
próximas à barragem. No município de Cametá, por exemplo, pescadores calculam
que a produção local passou de 4,7 mil toneladas por ano para 200 toneladas de
peixes desde que a usina foi construída.
A reportagem é de Carolina Gonçalves e publicada pela Agência Brasil
–
EBC, 07-12-2012.
Pontes lembrou que tanto a legislação brasileira quanto a Convenção
169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) determinam que as
autoridades consultem as comunidades locais, sempre que existir possibilidade
de impactos provocados por decisões do setor privado ou dos governos. Mas,
segundo ele, esse processo não tem sido cumprido da forma adequada.
Para Pontes, o governo brasileiro precisa se posicionar sobre as
comunidades e os investimentos previstos para infraestrutura. Na avaliação do
procurador, o posicionamento virá quando o Supremo Tribunal Federal (STF)
julgar, no próximo ano, ação que trata da falta de consulta prévia às
comunidades tradicionais antes da construção do Complexo de Belo Monte.
“O STF vai definir a posição brasileira”, disse, defendendo a
exigência do consentimento das comunidades indígenas e povos tradicionais antes
do início das obras.
Os projetos de infraestrutura previstos pelo governo na região da
Amazônia dominam os debates do Fórum Amazônia Sustentável, que ocorre em Belém,
no Pará. Representantes de organizações ambientais e alguns poucos empresários
discutem, desde ontem (5), soluções para impasses entre a infraestrutura
necessária identificada pelo setor privado e a o retorno dos investimentos para
as comunidades locais.
“Já vivemos vários ciclos diferentes na Amazônia e estamos
reproduzindo o antigo olhar da Amazônia como provedora de recursos para o
desenvolvimento do país e do mundo e, nem sempre, as necessidades de
desenvolvimento da região”, disse Adriana Ramos, coordenadora do evento.
Segundo ela, a proposta do fórum é chegar a um “debate do como fazer”,
já que os movimentos reconhecem que o governo não vai recuar dos projetos. “É
possível ter na Amazônia a compatibilização de diferentes modelos de
desenvolvimento, mas, mesmo a grande estrutura para atendimento de demandas
externas pode ser mais ou menos impactante. Infelizmente, ainda estamos fazendo
da forma mais impactante”, lamentou.
Adriana Ramos criticou a falta de investimentos prévios em projetos
como o de Belo Monte. Para ela, o governo teria que prever o aumento da
população e, consequentemente, a pressão por mais serviços públicos, como
saneamento e saúde em municípios como Altamira, no Pará.
“Além de serem feitas sem essa preocupação existe um esforço dos
setores para a desregulação dessas atividades, com mudanças como a do Código
Florestal e da regra de licenciamento”, acrescentou, explicando que, agora,
órgãos como a Fundação Nacional do Índio e a Fundação Palmares têm 90 dias para
responder se determinada obra impacta uma terra indígena. “Se não responder, o
processo de licenciamento anda como se não houvesse impacto sobre terra
indígena. Esse tipo de mudanças legais sinalizam que não há vontade de encontrar
o caminho certo, há vontade de se fazer de qualquer jeito. É desanimador”,
lamentou.
O fórum terminou sexta-feira (7) com um documento que vai orientar
todos os debates e ações das organizações ambientais a partir do ano que vem,
em relação a temas como a regularização fundiária na região, o debate sobre
transporte e cidades sustentáveis e repartição e uso sustentável de recursos
das florestas.
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