Sete espantos causados por Francisco:
um papa convertido ao povo
A mão de Deus |
Parecia que
foi a mão de Deus – não como no caso de Maradona! - que escolheu com o novo papa
um nome não esperado pela opinião pública. “Os cardeais me buscaram dos confins
do mundo” declarou o recém-eleito. Alegria espontânea no meio do povo, não
necessariamente por ser um ítalo-americano, mas por dar sinais para a renovação
da Igreja, não baseada na tecnologia, mas em atitudes humanas e na opção pelos
pobres.
Primeiro
espanto, aparição de um septuagenário que elegeu o nome “Francisco”. O
verdadeiro espanto é que nessa longa história da Igreja nenhum papa teve a
ideia ou a coragem de escolher esse nome que é um programa.
Segundo
espanto, o papa Francisco aparece na sacada do palácio “apenas” com a batina
branca e não diz “laudetur Iesus Christus”,
mas boa noite.
Terceiro
espanto, o novo papa se inclina diante da multidão na Praça de São Pedro e pede
orações e a benção do povo, antes de ele dar a benção apostólica “urbi et orbi”, prevista na cerimônia.
Quarto espanto, notícias da biografia de Jorge Mario Bergoglio que contam que o arcebispo e
cardeal de Buenos Aires não atravessava sua metrópole com motorista e Mercedes,
mas com transporte público, com ônibus e Metrô.
Quinto
espanto, outra notícia dessa mesma biografia de Bergoglio que se refera ao
bispo cozinheiro. Desde a morte prematura de sua mãe aprendeu preparar seu
almoço e outras comidas gostosas.
Sexto
espanto, este jesuíta e bispo de Buenos Aires, que pertence a uma família de
classe média e adquiriu uma simplicidade franciscana e certa reserva contra a
pompa curial. Por sua prática de pastoral e vida, Jorge Bergoglio pode hoje ser
qualificado como “teólogo anônimo de libertação”, embora que nunca rezou pela
cartilha da Teologia da Libertação. Seu colega de Companhia, Karl Rahner,
saberia bem explicar o significado desse anonimato.
Sétimo
espanto, por conta de grupos que defendem os direitos humanos. A mídia nos
informou que Bergoglio e sua Igreja argentina não mostraram atitudes proféticas
durante a ditadura militar (1976-1983) como aconteceu em outras igrejas latino-americans.
Nessa época, Mário Bergoglio ainda não era bispo, mas provincial dos jesuítas da
Argentina (1973-1979). Como provincial expulsou dois jovens jesuítas – Orlando
Virgílio Yorio e Francisco Jálics – da Companhia de Jesus e dificultou a sua
recepção na diocese de Morón do Salesiano Dom Miguel Raspanti. Entre expulsão e
trâmites de recepção, dia 23 de maio de 1976, Yori e Jálics foram sequestrados
pelas forças militares, torturados e, meio ano mais tarde (22.10.1976), expatriados.
A
sincronização entre expulsão e sequestro dos dois ex-jesuítas indicaria certo
“entendimento” entre autoridade eclesiástica e militar. O entendimento foi o
seguinte: os militares avisaram o superior dos jesuítas de um sequestro
iminente, se eles não fossem retirados de Bajo Flores. Segundo o padre
salesiano Roberto Musante, argentino e hoje missionário em Angola, teve uma intervenção
do padre Arrupe, geral dos jesuítas, junto ao provincial Bergoglio, pela
retirada de Yorio e Jálics para garantir sua integridade física. Ao permanecer
na vila por fidelidade aos pobres, ficaram desprotegidos. Pérez Esquivel, prêmio Nobel da Paz de 1980, garantiu à BBC Mundo: "Não há nenhum vínculo que relacione Bergoglio com a ditadura".
Papa Francisco pede a benção do povo e o perdão a Deus |
Segundo o Ritual
Romano, o novo papa deu uma indulgência plenária aos fieis, urbi et orbi.
Viagem feliz: papa Francisco com D. Damasceno, presidente da CNBB |
Certamente, o papa
Francisco pediu também para si mesmo essa indulgência de Deus e o perdão de
Orlando Yorio e Francisco Jálics, com quem agora partilha o nome. Quem poderia
assumir a tarefa do papado, sem a misericórdia divina? Essa
misericórdia, Jorge Bergoglio já expressou, programaticamente, em seu escudo
episcopal: [Deus] “elege com misericórdia” (“miserando atque eligiendo”).
Brasil e suas
pastorais desejam ao papa Francisco que ele, como seu padroeiro de Assis, no
abraço dos leprosos, que hoje se encontram não só na cúria romana, mas por toda
parte do mundo, encontre sua missão profunda e conversão permanente. Desejamos
que ele, como São Francisco, na oração diante do ícone da cruz na Igreja de São
Damião, escute a voz de Jesus, que o convida para a reconstrução da Igreja em
ruína da qual todos fazemos parte.
Paulo
Suess
T
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