''Mahony em Roma? Ele que veja com a sua consciência'', diz bispo


 

Dom Charles Scicluna, nos últimos dez anos e até poucas semanas atrás, foi o promotor do tribunal da Doutrina da Fé. Ninguém melhor do que para dizer se têm razão aqueles que pedem que o cardeal arcebispo emérito de Los Angeles, Roger Mahony, não participe do conclave por causa das acusações de não ter denunciado no passado diversos casos de pedofilia no clero, ou não.

A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 20-02-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto [Unisinos, 21.2.2013].

No seu escritório dentro do palácio do ex-Santo Ofício, durante anos, Scicluna examinou arquivos em níveis muito explosivos, não só os casos de pedofilia nas dioceses norte-americanas, mas também a vida dupla de Maciel Degollado, fundador dos Legionários de Cristo, até as personalidades limítrofes do padre Lawrence Murphy, abusador em um instituto de crianças surdas em Milwaukee, e muitos outros.

Eis a entrevista.

Dom Scicluna, quem é Mahony?

Um cardeal muito humilde, que não conseguiu frear os casos de pedofilia na sua diocese como seria justo.

O senhor já se encontrou com ele?

Diversas vezes, reservadamente, no meu escritório, tanto nos anos do prefeito Joseph Ratzinger, quanto nos de William Joseph Levada. Ele vinha pedir ajuda, conselhos sobre como agir.

Sobre o que vocês falavam?

Era depois de 2002, o ano em que os bispos norte-americanos reunidos em Dallas decidiram pela primeira vez inaugurar a linha de "tolerância zero" contra a pedofilia. Mahony, como todos os bispos, tentava entender como se comportar depois de anos em que a Igreja não agira corretamente.

O senhor está dizendo que, antes de 2002, os bispos norte-americanos encobriam os pedófilos?

Não havia linhas claras, principalmente em nível diocesano. Cada um agia como podia, e, infelizmente, em alguns casos, Mahony errou. O seu erro não foi só o de não ter sabido extirpar a raiz do problema da pedofilia. Mas também que, quando se conta de que o fenômeno havia se deflagrado na diocese, ele publicou os nomes de todos os padres acusados.

Ele não fez bem?

Não, porque uma coisa é comunicar os nomes dos culpados, outra é comunicar os nomes daqueles que são suspeitos de sê-lo. Entre os acusados ele também colocou a si mesmo, porque dois monsenhores do Vaticano haviam suspeitado dele. Francamente, pareceu-me demais.

Ele entrará no conclave?

Acredito que sim, mas em todo caso ele decidirá em consciência o que fazer. Não é uma situação fácil para ele. Nas últimas semanas, ele teve uma discussão com o seu antecessor, José Gomez, que pressionou para destituí-lo de todo cargo, a quem Mahony lembrou que sempre aceitou no passado o seu modo de agir. Não foi um bom exemplo, e acredito que essas polêmicas contribuíra para agitá-lo.

Ratzinger sempre foi informado sobre Mahony e os casos de pedofilia?

Sempre, certamente. E lutou para limpar, para agir pelo bem das vítimas. Mas não se trata apenas de crimes contra o sexto mandamento, mas também da arrogância e da falta de humildade e pobreza que às vezes caracteriza o modo de ser dos ministros de Deus.

Ratzinger também sabia do padre Maciel?

Em 2004, Maciel festejou na Basílica de São Paulo Fora dos Muros os 60 anos de sacerdócio. Toda a Cúria Romana foi, incluindo bispos e cardeais. O único que ficou em casa foi Ratzinger, então prefeito da Doutrina da Fé. Ele sabia bem, de fato, quem ele tinha na frente, tanto é que, um mês depois, ele deu oficialmente o pontapé inicial na investigação vaticano contra ele. Foi um sofrimento enorme para ele, porque ele estava bem ciente de quanta consideração Maciel gozava na Cúria Romana. Mas ele agiu indo contra a corrente por amor à verdade. Mas gostaria de dizer outra coisa.

Sim?

A política de Ratzinger foi a de limpar a Igreja da sujeira, mas também de usar misericórdia. Ele sempre teve a consciência, como São Paulo, que os homens de Deus guardam um tesouro em vasos de barro. A imagem mais forte à qual ele tentou se referir foi a visão tida por Santa Hildegard de Bingen, a místico e naturalista alemã que viveu no século XII. Ela viu uma mulher belíssima, cujo vestido, porém, estava rasgado, dilacerado por causa dos sacerdotes, dos seus pecados. Essa mulher é a Igreja Católica, manchada pelos pecados dos padres, mas, apesar de tudo, bela, desejável, um lugar onde qualquer pessoa que erra sempre pode recomeçar, um lugar de misericórdia. [...]

 

Um comentário:

  1. Às consciências atentas é óbvio que a pedofilia e a omissão em relação a ela são deploráveis. Mas há tempos há um discurso que quer a todo custo fazer da Igreja um mero repositório de atos como a pedofilia, como se a instituição se tratasse apenas disso, e só. Sou a favor da punição dos pedófilos, mas não da execração da Igreja. Quem sabe o novo Papa não seja mais sábio em relação a tais assuntos?

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