de Camilla Costa
Da BBC Brasil em São Paulo
Na ocupação Copa do Povo, que fica a cerca de 3,5 km da
Arena Corinthians, na zona leste de São Paulo, teve Copa do Mundo, mas não com
a seleção brasileira.
Na manhã desta quinta-feira, horas antes da abertura oficial
do Mundial, os moradores dos barracos fizeram seu próprio torneio de futebol,
no qual os times representavam categorias de trabalhadores que reivindicaram melhorias
salariais nos últimos meses: garis, professores, metroviários e outros.
Muitos vestiam a camisa da seleção brasileira, mas a
possibilidade de assistir à partida contra Croácia no fim da tarde dividia
opiniões.
"Eu queria que não tivesse Copa, mas ver a seleção
brasileira jogar eu acho que não tem nada a ver com isso", disse Loamir
Augusto de Souza, de 29 anos, à BBC Brasil. Ele é técnico de telefones
celulares e diz que se divide entre a ocupação e uma casa de um cômodo, cujo
aluguel nem sempre consegue pagar.
Loamir estava completamente vestido com as cores da seleção
brasileira porque estava vendendo os produtos para os possíveis torcedores. Mas
não teve muita sorte na ocupação. "Só vendi alguma coisa fora daqui e só
hoje, porque é o dia da Copa. Antes não vendi nada."
Sorrisos amargos |
A história de Loamir ilustra o clima na ocupação do
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), que começou há um mês.
Antes do início dos jogos, os moradores fizeram uma
cerimônia de abertura com críticas à Fifa e ao que chamaram de Copa
"elitizada". Álbuns da Copa foram queimados durante à cerimônia, mas
as crianças da ocupação rapidamente se juntaram para recolher as figurinhas
restantes. Muitos vestiam camisas da seleção ou até uniformes completos.
Depois do torneio - cujos jogos acontecerão no mesmo dia dos
jogos da seleção - diversas pessoas deixaram a ocupação para assistir o jogo
nas casas de amigos e familiares. Os que ficavam se mostravam divididos entre
torcer e "dar ibope" para a Fifa.
Discussão
"Tem pessoas que vão assistir os jogos e torcer. As
nossas críticas não são aos jogos e à seleção, são ao modo como a Copa foi
feita aqui no Brasil. Os gastos públicos bilionários, o aumento da especulação
imobiliária que a Copa trouxe especialmente para a região de Itaquera e a
postura da Fifa", disse à BBC Brasil Josué Rocha, de 25 anos, coordenador
estadual do MTST.
Rocha foi o principal organizador do torneio de futebol da
Copa do Povo, mas depois que deixou a ocupação, os coordenadores presentes
discutiram sobre se deixariam que os moradores assistissem à partida na única
TV disponível no local, que fica dentro do "barracão dos militantes".
A decisão final, com a qual nem todos os líderes ficaram
satisfeitos, foi a de não permitir a torcida. A televisão permaneceu ligada,
mas em um canal que não exibia o jogo. Donos de casas vizinhas à ocupação,
viraram seus televisores para a rua, mas a adesão foi baixa: a maioria dos que
ficou na ocupação fez questão de não assistir à vitória da seleção sobre a
Croácia por 3 a 1.
A alternativa de um pequeno grupo de torcedores foi o
celular com TV de Daniel Paz, de 19 anos. O rapaz, que é ajudante de
eletricista, foi encontrar com a esposa, que mora na Copa do Povo. Era sua
primeira visita ao local. "Eu não estou nem torcendo muito, estou só
acompanhando mesmo", disse.
Moradores se dividem entre críticas à Fifa e ao governo e
torcida pela seleção.
Em um bar próximo ao local, Valter de Oliveira Ponte, de 35
anos, e outros moradores acompanhavam a primeira partida do Mundial, também
divididos entre a animação e as críticas ao governo.
"Como a Dilma nos ajudou a conseguir o terreno, vim
prestigiar a seleção. Agora ela vai ter que honrar a palavra dela",
afirmou à BBC Brasil. "Mas não estou alegre, nem triste, o certo é quando
eu tiver meu teto. Eu não ganho nada com esse jogo."
A ocupação Copa do Povo reúne cerca de 4 mil pessoas,
segundo a organização, num terreno privado de 150 mil metros quadrados e é de
propriedade da Viver Incorporadora. Em nota à imprensa, a construtora, que
busca reintegração de posse, afirmou que a área não tem débitos com a justiça.
Nos últimos dias, o movimento fez vários atos pedindo
moradia, colocando milhares de manifestantes nas ruas. O governo abriu um canal
de negociações e o MTST anunciou que a área deve ser usada para a construção de
moradias populares.
Segundo o MTST, que coordena a construção dos barracos, o
local – cujo valor de mercado é estimado em mais de R$ 20 milhões – está
abandonado há mais de 20 anos.
Protestos, vaias e violência
Também no dia da abertura da Copa do Mundo em São Paulo teve
protestos que terminaram em confrontos entre a Tropa de Choque e manifestantes.
Os tumultos terminaram com jornalistas feridos e suspeitos detidos.
Como não estou a par das negociações entre o MTST e as instâncias governamentais, sobre o justificável pleito das famílias que reivindicam moradia digna e as providências a serem implementadas, conforme publicações na imprensa - considero não dispor de elementos suficientes para comentar o artigo acima, sem incorrer no risco de emitir opiniões infundadas.
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