Sepé Tiraju, líder
guarani, que deu a vida para defender as terras do Povo Nativo Gaúcho, virou mito,
foi canonizado pela vontade popular, é reconhecido oficialmente como Herói da Pátria
Brasileira pela lei Federal 12.032/09.
Sepé morreu em 7 de
fevereiro de 1756, no município gaúcho de São Gabriel. Três dias depois ocorre
a Batalha de Caiboaté e a morte de 1.500 dos principais guerreiros e Caciques
Guaranis. Encerrava-se assim, uma das mais bem sucedidas experiências de vida
comunitária cristã de todos os tempos citadas por Voltaire, principal
Iluminista Francês, como “Triunfo da Humanidade”.
Por seu feito, Sepé
Tiaraju, é considerado santo popular, virou personagem lendário do Rio Grande
do Sul e dos Povos Nativos da América Latina, sua memória ficou registrada na
literatura por Basílio da Gama no poema épico O Uruguai (1769) e por Érico
Veríssimo no romance ‘O Tempo e o Vento’.
SEPÉ era índio da nação guarani. Seu povo habitava neste sul do
continente, muitos séculos antes da chegada dos europeus, “desde o dilúvio” aprenderam
a dizer os índios, logo depois de convertidos à fé bíblico-cristã.
Como guarani, Sepé, desde jovem, nas rodas de chimarrão, junto a um fogo
de chão, foi escutando e aprendendo as histórias, os “causos”, as lendas e os
costumes que seus antepassados, desde inúmeras gerações, transmitiam de pai
para filho. Os cantos, as danças, os rituais, tudo expressava as vivências mais
caras a todos. Sabemos que antes dos padres jesuítas chegarem, a língua guarani
não era escrita, era somente falada. Daí o cuidado com que, em família, se
cultivavam as tradições que haviam construído o povo, desde milênios. Não se
podia perder a memória das mais caras tradições que vinham desde a sabedoria
dos mais antigos.
Entre as histórias da Comunidade, havia uma preferida, que retornava
sempre, com novos detalhes. É o mito fundante do povo Guarani. Trata-se, na
realidade, do fato mais importante e mais determinante do modo de ser guarani.
Os adultos e os velhos, nessa história, tinham um referencial permanente de
projeto político, social e religioso, a ser concretizado. É aquilo que hoje
costumamos chamar de UTOPIA.
Lutando contra duas Bandeiras |
Essa história, a UTOPIA GUARANI, marco originário de todo o povo e que
alimenta a caminhada para frente, rumo
ao futuro, leva o nome de “Yvy marã ei”. A melhor tradução em português é:
“TERRA SEM MALES”
Imaginemos o menino, mais tarde o jovem Sepé Tiaraju, ladeado dos pais,
do pajé da tribo, junto a amigos e vizinhos, atento à fala dos mais velhos
sobre a YVI MARÃ EI:
“Quando nosso Grande Pai Nhanderuvuçu viu a maldade dos homens, decidiu
destruir a Terra. Mas antes, teve o cuidado de avisar o Grande Pajé Guiraypoty,
ordenando-lhe que dançasse.
Mulher guarani olhando para o futuro |
Guiraypoty varou a noite inteira em danças de religião. Quando a dança
do Grande Pajé terminou, Nhanderuvuçu, o Grande Pai, retirou um dos esteios que
sustentam a Terra. Então sobreveio um incêndio devastador.
Guiraypoty fugiu do perigo, partindo com sua família para o leste, em
direção ao mar. A fuga foi tão rápida que não houve tempo para plantar
mandioca. Todos teriam morrido, não fosse o poder do Grande Pajé, que fez com
que o alimento surgisse durante a viagem.
A família chegou ao litoral. O primeiro cuidado que tiveram, foi
construir uma casa de madeira. Quando viessem as águas estariam bem protegidos,
dentro de casa. Terminada a construção, retomaram a dança e o canto.
O perigo aumentava sempre mais. O mar, na ânsia de apagar o fogo, ia
engolindo a terra toda. Quanto mais as águas subiam, mais Guiraypoty e sua
família dançavam.
Para não serem tragados pelas águas, subiram todos no telhado da casa.
Diante da situação Guiraypoty chorou porque teve medo. A mulher então lhe
disse: “Se estás com medo, meu Pai, abre bem os braços para que as aves do céu,
ao passar, possam pousar. Se sentarem em teu corpo, pede que nos levem para o
alto.”
Mesmo em cima da casa, a mulher não cessava de bater ritmadamente a
taquara contra o esteio da casa. As águas subiam, subiam.
Guiraypoty entoou então o nheengaraí que é o canto solene guarani.
Quando estavam prestes a ser tragados pelas águas, a casa se moveu,
girou sobre si mesma, flutuou, subiu, subiu. Tão alto que chegou até a porta do
céu. Ali estabeleceram sua morada definitiva.
Neste lugar em que chegaram, as plantas nascem por si próprias, sem
precisar de quem as plante. A mandioca já vem transformada em farinha. A caça
já chega abatida aos pés dos caçadores. As pessoas não envelhecem nem morrem.
Não há, nesse lugar, sofrimento de espécie alguma.”
Terminada a narrativa seguia-se um longo silêncio em que todos se
deliciavam na contemplação da feliz chegada à TERRA SEM MALES. Aos poucos, dos
atentos ouvintes começavam a ser
expressos curtos comentários sobre o que mais lhes havia calado na alma.
Sentiam-se invadidos por uma mística, um fogo interior que os impelia para
frente, na história, em busca da Terra Sem Males. Nesse mito fundante, se
reconheciam lá atrás, como povo guarani semi-nômade, antes do ano de 1607,
quando os primeiros europeus, na pessoa dos Padres Jesuítas, haviam feito o
primeiro contato com a nação guarani.
O autor: Ir. A. Cechin |
Naquele tempo eram constituídos de pequenas comunidades que
alcançavam em torno de umas 100 pessoas,
coordenadas por um cacique.
Não foi por mero acaso que o povo guarani-missioneiro abraçou, aos
poucos, com imensa alegria, a Boa Nova
do Evangelho, trazida pelos Jesuítas, alicerçada na tradição bíblica vetero-testamentária
da CONQUISTA DA TERRA PROMETIDA fornecedora de luminosidade total para a YVI
MARÃ EI.
Irmão Antonio Cechin
Que bonito o mito fundante do povo Guarani, os donos originais de grande parte dessas terras - das quais são expulsos pelo agronegócio e pelos interesses escusos dos poderosos latifundiários.
ResponderExcluirPor desconhecimento da nossa história, desde os primórdios, muitos brasileiros , infelizmente, são incapazes de olhar com sensibilidade e grandeza de sentimentos, para as numerosas famílias indígenas - conhecer suas crenças, suas raízes, cultura, aprededo a respeitar seu modo de vida, valorizando seus costumes ancestrais e tudo que podem ensinar às nossas gerações.
A visão míope e egoista dos poderosos de plantão, impede a convivência pacífica e solidária, em harmonia com os legítimos donos das terras .