Índia, Paraíso dos vegetarianos, vê aumento do consumo de carne e fast food





 Em nenhum outro país há tantos vegetarianos como na Índia. Mas o surgimento de uma nova classe média, que valoriza hábitos ocidentais em detrimento da tradição religiosa, faz o consumo de carne crescer rapidamente. [A reportagem é de Priya Esselborn e publicada pelo sítio Deutsche Welle, 03-01-2013.]

A princípio, parece contraditório: a Índia, o país dos vegetarianos, registra um rápido aumento do consumo de carne. Estatísticas afirmam que 40% dos indianos não comem carne. Em nenhum outro país a parcela de vegetarianos é tão alta quanto na Índia.
No entanto, nos últimos dez anos, o consumo de carne no país duplicou. Em 2009, a média era de 5,5 quilos por pessoa, segundo a Organização Mundial da Saúde: um índice ainda baixo se comparado com o da Alemanha, de 61 quilos de carne bovina, porco e aves ingeridos por cada cidadão por ano, segundo dados do Departamento Federal de Estatísticas.

Símbolo de status

As cadeias de fast food se espalham rapidamente por todas as cidades da Índia. Elas atraem principalmente a clientela mais jovem e ficam cheias sobretudo nos fins de semana. Nas grandes cidades, como Déli, Mumbai, Chennai ou Kolkata (a antiga Calcutá), famílias passam o tempo livre em encontros regados a coca-cola, batatas fritas e hambúrgueres em lanchonetes do McDonalds ou consomem frangos empanados fritos na rede Kentucky Fried Chicken.
O médico Sanjay Sanadhya, especialista em diabetes, vê com desconfiança essa mudança nos hábitos alimentares da população. "As pessoas na Índia estão simplesmente imitando o estilo de vida ocidental. Percebe-se como elas estão, de maneira geral, distanciando-se de suas tradições culturais. Além disso, há fatores como a globalização e a mobilidade crescente das pessoas, que viajam cada vez mais para o Ocidente."
Para a nova classe média indiana, sobretudo para as gerações mais jovens, comer carne é sinal de cosmopolitismo e de um certo nível de educação. Além disso, o hábito é também visto como indicador de status econômico, pois os pratos com carne no país são geralmente mais caros que os vegetarianos.
O jovem estudante Jaspreet Singh come há muito tempo carne e peixe. "Procuro ingerir um número suficiente de proteínas. Como frango, carne de carneiro e peixe. O meu corpo e a minha aparência são muito importantes para mim", conclui. Sua geração quer experimentar tudo, diz Singh. "Quem limita seus interesses, cerceia a própria vida. Mesmo que eu não goste de tudo, quero experimentar, principalmente no que diz respeito a alimentos e bebidas", explica.
"É preciso adaptar-se", afirma a também estudante Neha Chauhan. Embora ela seja vegetariana, sua irmã e seu pai comem carne. "Minha irmã viaja muito, ela precisa se adaptar. Eu até hoje não precisei e posso tomar as minhas próprias decisões, mas se tivesse que viver em outro ambiente talvez também tenha que me adaptar e comer carne", conclui.

Tabus religiosos

 Durante muito tempo, tabus religiosos impediram muitos indianos de comer carne. Textos hindus de séculos atrás já pregavam a aversão à ingestão de carne. Para os cidadãos mais religiosos, a vaca é um animal sagrado. O abate bovino é proibido no país, cuja população é composta de 80% de hindus. Antigamente, quem comia carne era considerado incivilizado e bárbaro.
Mahatma Gandhi, o pai político e espiritual da independência da Índia, era estritamente vegetariano. O "não" pregado por ele a qualquer forma de violência – um dos pilares de seus ensinamentos – começava na mesa.
Kirti Sharma, uma jovem de 20 e poucos anos de Nova Déli, concorda com os ensinamentos de Gandhi, embora acentue que cada vez menos pessoas de sua geração pensem dessa forma. "Acho muito melhor ser vegetariano, pois abater animais, ou seja, matar outros seres vivos, não pode ser boa coisa", observa.
Sharma lembra que ela pertence à casta dos brâmanes, entre os quais o consumo de carne é, na verdade, proibido. Segundo a estudante, seus pais cuidam para que ela não coma produtos derivados de animais. "Só é difícil quando sou convidada para festas, pois em muitas tortas há ovos, e acabo por ter de comê-las", conclui a jovem.
Outros grupos religiosos na Índia, como por exemplo os jainas, não só não comem carne de forma alguma, como também não ingerem vegetais que crescem debaixo da terra, como batatas, cebolas ou raízes. Seres vivos podem ser mortos durante a sua colheita, argumentam. Alguns jainas ortodoxos usam máscaras no dia a dia, a fim de evitar que engulam sem querer algum inseto.
Por fim, os muçulmanos, que perfazem 13% da população da Índia, não comem carne de porco.
Grandes cadeias, como o McDonalds, adaptaram-se ao mercado indiano. Presente na Índia desde 1996, o grupo norte-americano não vende hambúrgueres de carne bovina no país, mas o que chama de chicken maharaja burger. Segundo a publicidade veiculada pela cadeia, quem come esse hambúrguer deve se sentir como um marajá, ou seja, como um rei.
A estratégia de marketing bem-sucedida, que inclui a participação de artistas de Bollywood e de estrelas do críquete, é vista pelos especialistas como uma das razões para o aumento do consumo de carne e sobretudo de fast food em toda a Índia.

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