IV Simpósio “Teologia Índia”
(28.3. a 2.4. 2011, Lima, Perú)
Ontem, dia 2 de abril, terminou o IV Simpósio “Teologia Índia”, organizado pelo Conselho Episcopal Latino-Americano – Celam, em Lima. Lima é a cidade que enterrou seu conquistador e fundador sanguinário, Francisco Pizarro, em sua catedral. Mas, Lima é também o lugar de santos extraordinários que se dedicaram aos pobre: Martín de Porres, Rosa de Lima, Francisco Solano, Juan Macías e Toribio de Mogrovejo. Lima, com seu Museu da Inquisição e suas Igrejas coloniais, simboliza até hoje, como a própria Teologia Índia, trigo e joio da nossa realidade pastoral.
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Foto: Eden Magalhães |
Tema e lema do Simpósio foram: “Teologia da criação na fé católica e nos mitos, ritos e símbolos dos povos indígenas cristãos na América Latina” - “O sonho de Deus na criação humana e no cosmo”. Na época de Medellín, o Celam, com sede em Bogotá, já teve seus dias de glória e seu papel profético na Igreja latino-americana. Hoje participa do profetismo-bonsai, institucionalmente acuado pelo centralismo romano com seus dois braços, os movimentos carismáticos e as nunciaturas apostólicas, cujo papel central é bem resumido pelo livro de Michel Foucault: “Vigiar e punir”. O que ultimamente aconteceu, através da chamada reestruturação da pastoral indígena, na Bolívia, e na patoral mapuche da diocese de Villarica (Chile), nos processos sucessórios dos bispos de Sucumbios e Riobamba, Equador, aponta para à inumanidade desse “vigiar e punir”, ampliado por um terceiro elemento, o “demitir” da noite para o dia, sem um obrigado minimamente civilizado.
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Foto: Eden Magalhães |
Aelapi
Os quatro simpósios do Celam, que se realizaram em Bogotá (1997), Riobamba (2002), Guatemala (2006) e, agora, em Lima, são continuações de Encontros anteriores, organizados pela Articulação Ecumênica Latino-Americana de Pastoral Indígena (Aelapi), que desde os anos 70 realizou Congressos, Cursos e Oficinas de Pastoral e Teologia Indígena. A Aelapi é um serviço eclesial ao diálogo inter-religioso que, a partir das aspirações dos povos indígenas, anima e articula a pastoral indígena na América Latina apontando para uma pastoral integral, específica, inculturada e libertadora. A Aelapi, que realizou, depois do IV Simpósio do Celam, seu encontro executivo, é uma instância que favorece a escuta fraterna e respeituosa da sabedoria dos povos indígenas, e, ao mesmo tempo, um espaço de solidariedade, compromisso e apoio às suas lutas e demandas. A Aelapi reune diversos organismos eclesiais de América Latina. A partir dos anos 90, realizou encontros específicos de Teologia Índia em México (1990), Panamá (1993), Cochabamba, Bolívia (1997) e Assunção, Paraguai, (2001). Em Lima foi definido também o próximo Encontro Continental de Teologia Índia, que vai ser realizado em Quito, Equador, com a parte infraestrutural organizado pelo Clai, de 10 a 14 de outubro de 2013. Como tema foi escolhido: "Palavra de Deus, palavra indígena". O lema, a Aelapi "emprestou" da Campanha da Fraternidade 2011, do Brasil: "A criação geme em dores de parto".
Teologia profética
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Foto: Ponciano Acosta |
A Teologia Índia é uma teologia profética e, por causa disso, é vigiada, punida e reprimida. Trata-se do conflito entre uma teologia descontextualizada com ajustes insignificantes no decorrer da história, e uma teologia contextual, que emerge, concretamente, dos projetos de vida e das lutas dos povos. A primeira se reproduz sem conhecimento da realidade; seus escritos representam textos fora de contextos. A segunda, a Teologia Índia, por exemplo, passa pela peneira da inculturação. Inculturação é “um imperativo do seguimento de Jesus” (Santo Domingo, 13). Jesus de Nazaré falou do Reino de Deus em parábolas contextualizadas, não em equações matemáticas universais.
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Mons. Luis Francisco Ladaria |
A partir de 2004, sobretudo no México, a Teologia Índia serviu de pretexto para perseguir um setor que voltou do Vaticano II (1962-1965) e de Medellín (1968) acreditando na descolonização como sinal de Deus no tempo; acreditou na Igreja autóctone e na inculturação, não como verniz, mas como raiz pastoral; acreditou na autodeterminação dos povos indígenas na sociedade e na Igreja. “Teologia Índia”, dizia o setor hegemônico, é a metamorfose da “Teologia da Libertação”, condenada e descontente com a sua derrota histórica.Hoje, o setor da Teologia Índia conhece melhor seus limites. Defende silenciosamente avanços pós-conciliares, alegra-se com um afago da autoridade eclesiástica e, tendo vara curta, procura não cutucar a onça. As resistências continuam grandes. No Documento de Aparecida (2007), por exemplo, que defendeu a inculturação com frases de efeito (cf. 479, 491), o nome próprio de Teologia Índia foi explicitamente banido. Mas, o que aconteceu em Aparecida, repetiu-se também em Lima. Os adversários ideológicos tratam-se com cordialidade diplomática, cada um exaltando o próprio trigo e fazendo ponderações sobre o joio no campo do outro. A posteriori, quer dizer, no decorrer do tempo, esse joio deve ser erradicado.
O Simpósio foi convocado pelo Departamento de Cultura e Educação, Secção Povos Indígenas, e dirigido por Mons. Rodolfo Valenzuela, bispo de Vera Paz, Guatemala. De Roma esteve presente, nesse IV Simpósio do Celam, um sorridente Secretário da Congregação para a Doutrina da Fé, Mons. Luis Francisco Ladaria, que modestamente admitiu que nunca esteve perto de uma aldéia indígena. Mons. Ladaria apresentou uma palestra clássica “A doutrina cristã sobre a criação”. Pelo resto, manteve-se numa atitude agradável de escuta.
Mensagem
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Na escada da catedral de Lima |
Segundo a Mensagem Final, os participantes do Simpósio escutaram mitos de todas as regiões latino-americanas. Na diversidade dos relatos indígenas de criação se revela o Criador da vida a quem os povos chamam Mãe-Pai, que estabeleceu a harmonia primordial. Os mitos de criação permitem “aproximar-nos a Cristo presente nas culturas dos povos”. A Mensagem cita São Gregório Nazianceno: “o que não se assume, não se redime” (PG 37), que inspira alguns critérios teológico-pastorais:
- Cristo está presente en todas las culturas.
- Os agentes de pastoral devem conhecer o coração de sua cultura.
- Os autênticos protagonistas da inculturação são os povos indígenas.
- Deve-se valorizar as contribuições da Teologia Índia.
- Nas casas de formação e nos seminários deve-se fornecer informações sobre os mitos e as cosmovisções dos povos e oferecer teologias adequadas para sua compreensão.
- Urge descolonizar os modos de pensar, saber e sentir dos agentes de pastoral.
- É importante dialogar e articular processos eclesiais com movimentos indígenas.
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Santa Rosa de Lima |
- A diversidade é um dom de Deus e não uma invenção humana.
- Beleza e sabedoria de Deus se manifesta na diversidade cutural da vida dos povos e na biodiversidade.
Por fim, a Mensagem de Lima lembra a contribuição dos povos indígenas para a humanidade. Compreendem a humanidade como parte integrante da natureza e sabem que Deus, que está presente e próximo, zela pela vida da irmã-mãe Terra (cf. Aparecida, 125).
Em seu conjunto, o Simpósio deu uma importante contribuição sobre o lugar, onde estamos, e sobre o caminho, que está a nossa frente. Santa Rosa de Lima, rogai por nós e por nossos povos indígenas!