O Espírito Santo: Protagonista da Missão e Pai dos Pobres
O Espírito Santo é força divina e dom.
Ele está no início de todas as caminhadas que geram vida. Crer no Espírito
Santo significa crer no Senhor que dá a vida (Credo de Constantinopla I, 381).
Ele é aquele “Espírito de Deus” que no princípio do tempo e do mundo “pairava
sobre as águas” (Gn 1,2). No PRINCÍPIO eram o Verbo e o Espírito. Ambos são
inseparáveis. Um é caminho e o outro é guia, juntos ao Deus Pai, criador do
mundo.

a)
Pentecostes
Na festa de
Pentecostes, festa do dom da Lei para os judeus e para os cristãos, festa do
dom do novo mandamento, o testemunho da futura Igreja rompe as barreiras
lingüísticas e étnicas, e a “Lei de Cristo” (Gl 6,2) começa a ser anunciada a
todos os povos. E esse anúncio das maravilhas de Deus na língua dos outros povos
acontece pela força do Espírito. Nele, judeus e gentios são chamados a se
tornarem povo de Deus, povo da Nova Aliança (cf. At 15,14). Nesse evento
pentecostal, a unidade plural no Espírito Santo supera a confusão e dispersão
de Babel (Gn 11,1-9) e os discípulos e as discípulas são convocados e enviados
como testemunhas da ressurreição de Jesus e servos e servas do Reino de Deus.
Pentecostes é a festa pascal que está no início da missão.
A fundação
da Igreja, por princípio, quer dizer, desde o início, missionária, na festa de
Pentecostes, festa da convocação e do envio, estrutura a trajetória universal
do anúncio do Evangelho da Graça. Universalidade dos horizontes e concretude
dos conflitos, contextualidade, pluralidade das formas nas Igrejas locais e
gratuidade dos modos de salvação ligam ação e anúncio missionários de maneira
especial ao Espírito Santo. Em Pentecostes, a Igreja é concebida pelo Espírito
Santo. Ele “acompanha e dirige” (AG 4) os atos dos apóstolos, dos discípulos e
das discípulas sem cessar.
Os Atos
dos Apóstolos são o livro da missão realizada sob o protagonismo do Espírito
Santo. Pentecostes continua na missão dos apóstolos. “Lucas coloca vários
Pentecostes sucessivos: em Jerusalém (At 2; 4,25-31), na Samaria (At 8,14-17),
aquele que inicia a aventura missionária com Cornélio e o evento de Cesaréia
(At 10,44-48; 11,15-17) e até o episódio de Éfeso (At 19,1-6)” (CONGAR, p. 69).
O Espírito do alto converte Pedro e a Igreja de Jerusalém da estreiteza
étnico-religiosa para o horizonte amplo da humanidade e dos confins do mundo.
Sob iniciativa do Espírito acontece o batismo dos primeiros gentios e a
primeira missão na diáspora judaica, em Antioquia. A manifestação do Espírito
produziu uma profunda conversão na liderança de Pedro e nas atitudes das
comunidades judaicas (cf. At 10; 13,2; 15). Foi o Espírito Santo que fez a
jovem Igreja se lembrar de que são “os doentes que precisam do médico e não os
sãos” (Lc 5,31) e que o “Filho do homem veio procurar e salvar o que estava
perdido” (Lc 19,10) e não para manter os salvos.
b) Espírito da Verdade
O Espírito Santo é o “Espírito da Verdade” (Jo
14,17) que fala em muitas línguas, mas “não fala de si mesmo” (Jo 16,13). Este
Espírito faz a comunidade de Jerusalém compreender que sua missão não é cuidar
de si mesma. A comunidade aprende do Espírito que a sua missão está no
despojamento e no descentramento voltado para a unidade com outras comunidades
e povos. O Espírito da Verdade sabe articular o plural e as diferenças numa
unidade maior, sem hegemonias isoladas, e sabe despojar-se dos e nos sinais de
mediação. A diferença étnica e o plural cultural não afetam a verdade. O
Espírito da Verdade pode ser experimentado na água do batismo e no fogo da
sarça ardente, no óleo da unção messiânica e na luz de uma consciência nova, no
imaginário da pomba palpável e da nuvem distante. “Despojamento”,
“descentramento” e “apagamento” (cf. CatIC n. 694, 687) permitem transformar uma comunidade de manutenção
numa comunidade missionária que procura comunicar-se com os outros, os pobres,
os sofredores e os perdidos.
O Espírito Santo é Espírito da Verdade, não por
causa de uma doutrina certa, uma lei perfeita ou uma moral superior, mas porque
nele acontece a verdade na geração da vida: na prática do novo mandamento (Jo
13,34) e da justiça maior em favor dos pobres. Na raiz da pobreza está o “pai
da mentira”, o diabo, que perturba a ordem social – “aquele que acusava nossos
irmãos dia e noite” (Ap 12,10). O Espírito Santo é o Paráclito, o “consolador”,
o “intercessor” e o “advogado” dos pobres (cf. DEV 3b).
A missão exige mais que abrir mão de bens materiais; exige,
sobretudo, abrir mão de tradições, até de tradições salvíficas, mas disfuncionais
e, portanto, fardos dispensáveis, diante de um novo contexto histórico e
cultural. A ação salvífica de Deus – antigamente denominada “salvação das
almas” – ultrapassa todo exclusivismo e esoterismo dos sinais salvíficos de
judeus e de cristãos. Isso não desvaloriza esses sinais, mas os redimensiona
diante da possibilidade cultural das pessoas concretas e os relativiza diante
do poder de Deus. Nessa flexibilidade – não nos conteúdos, mas diante das
práticas corporativistas e da padronização de uma roupagem cultural única –, o
Espírito Santo permanece Espírito da Verdade e se revela na missão como
protagonista do Evangelho da Graça (cf. RM 21b). Ele dinamiza esse Evangelho e
se faz presente em todas as formas de doação da vida: no diálogo paciente, na
presença silenciosa, no testemunho, na contemplação e na ação, na caridade, na
misericórdia e na justiça. Tudo que sustenta a esperança num mundo em desespero
é desdobramento da Boa-Nova sustentada pelo Espírito.
c) Gratuidade
O Espírito Santo, pai dos pobres e protagonista da
missão, é dom divino e doador dos dons. O dom realmente importante é o amor (1Co 13), que gera unidade e gratuidade. As
três formas do agir de Deus são, segundo Santo Agostinho, criar (a humanidade e o cosmo), gerar
(o Filho de Deus) e doar (Espírito
Santo). O Espírito Santo é Deus no gesto do Dom (AGOSTINHO, liv. XV, 29).

A
gratuidade garante a continuidade da história de salvação. Ela está presente nas diferentes etapas de início da vida
como dom e graça. Por isso, de modo particular, está ligado aos sacramentos de
iniciação que são sacramentos da caminhada, ao batismo, à confirmação e à
Eucaristia. Ao religar e refazer esses inícios, ao
completar a criação pela recapitulação, o Espírito Santo mostra a face de Deus
através de gestos significativos de continuidade e ruptura, de despojamento e
inovação, como princípio dinâmico na história de salvação. A gratuidade, que, simbolicamente,
celebramos na “ação de graça”, na Eucaristia, é a condição da não-violência
e da paz no mundo. A gratuidade aponta para a possibilidade de um mundo para
todos. O Espírito que é dom, graça e gratuidade, o Espírito que dá vida, vive
no Verbo encarnado, na Palavra cumprida. Ele, que é a vida do Verbo, vive
também conosco na Palavra de Deus cumprida na fidelidade à missão.
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